Antigo presidente da EPUL também teve casa da câmara na Quinta do Lambert

Foto
Kruz Abecasis decidiu entregar os 14 apartamentos daquele edifício de sete pisos a funcionários superiores do município Carlos Lopes (arquivo)

A história do prédio em que José Manuel de Sousa residiu na Quinta do Lambert, ao Lumiar, é uma das mais significativas da discricionariedade que vigora há décadas na atribuição do chamado património disperso do município e foi contada no jornal Tal & Qual em Dezembro de 1989.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

A história do prédio em que José Manuel de Sousa residiu na Quinta do Lambert, ao Lumiar, é uma das mais significativas da discricionariedade que vigora há décadas na atribuição do chamado património disperso do município e foi contada no jornal Tal & Qual em Dezembro de 1989.

O caso, que o JN ressuscitou ontem, depois de o DN ter aludido a ele na véspera, remonta a 1986, ano em que o então presidente da câmara Kruz Abecasis decidiu entregar os 14 apartamentos daquele edifício de sete pisos a funcionários superiores do município e a outras pessoas sem particulares carências económicas.

O prédio tinha acabado de ser construído e chegara à posse da autarquia no âmbito das contrapartidas (actualmente proibidas) que eram devidas ao município pelos promotores de uma urbanização vizinha. Entre os contemplados com uma casa nova e com rendas entre os 20 e os 140 euros contavam-se não só José Manuel de Sousa, como o então jornalista da RTP José Cândido de Sousa, o antigo seleccionador nacional de futebol Ruy Seabra e o assessor de imprensa de Abecasis, Veríssimo Pires.

A gestão de grande parte dos mais de três mil fogos municipais que não estão integrados em bairros sociais fazia-se à época, e continuou a fazer-se até agora, com base nos critérios pessoais dos autarcas responsáveis e sem que houvesse quaisquer regras para o efeito. Situação idêntica acontecia, aliás, com a atribuição de espaços e de terrenos a toda a espécie de associações e entidades mais ou menos meritórias, para que aí instalassem as suas sedes e serviços.

Apesar disso, a câmara ainda tem um grande número de fogos e espaços dispersos ao abandono, parte deles degradados, enquanto os pedidos provenientes de particulares e de associações continuam a acumular-se. Um exemplo entre muitos é o de um prédio, na Rua da Madalena, onde João Soares entregou uma loja e um andar ao pintor Inácio Matsinhe, os quais se encontram hoje em dia desocupados e sem préstimo.

Sobre os procedimentos usados para a atribuição dos apartamentos da Quinta do Lambert, José Manuel de Sousa recorda-se apenas que “uma senhora vereadora” [provavelmente Ana Sara Brito, que tinha à época, como agora, o pelouro da acção social] teve “a amabilidade e a generosidade” de lhe atribuir uma casa, atendendo a situações da sua vida pessoal e ao facto de ser “um funcionário esforçado e mal pago”.

Os critérios, faz questão de salientar o actual administrador da Espart (Espírito Santo Participações Financeiras, SGPS), “não eram os que se aplicam à habitação social”, porque não se tratava de fogos sociais. “Eram casas que eram atribuídas por razões que considero discricionárias”, afirma, acrescentando que “acontecia com alguma frequência a câmara arrendar casas fora dos bairros sociais a funcionários seus”.

José Manuel de Sousa diz que deixou o apartamento “três ou quatro anos depois”, à volta de 1990, numa altura em que já não era funcionário da Câmara de Lisboa. “Deixei a casa porque não me sentia com direito a ela”, explica, garantindo que quando Jorge Sampaio o convidou para presidente da Empresa Pública de Urbanização de Lisboa (EPUL) já não vivia nesse local.