Saramago gostou de "Blindness", a adaptação para cinema do "Ensaio sobre a Cegueira"
"Gostei muito, muito, muito. Emocionei-me algumas vezes", disse Saramago, que destacou, também, uma "cena breve" em que nove mulheres passam atrás de uma janela em fila indiana. "Talvez possam ser como a representação do destino ou da história da mulher ao longo dos tempos", acrescentou o autor que viu o filme numa sessão privada, ontem à noite.
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"Gostei muito, muito, muito. Emocionei-me algumas vezes", disse Saramago, que destacou, também, uma "cena breve" em que nove mulheres passam atrás de uma janela em fila indiana. "Talvez possam ser como a representação do destino ou da história da mulher ao longo dos tempos", acrescentou o autor que viu o filme numa sessão privada, ontem à noite.
José Saramago falava aos jornalistas durante uma conferência de imprensa conjunta com o realizador de "Blindness", o brasileiro Fernando Meirelles, que ocorreu no Palácio Nacional da Ajuda, onde está patente a exposição "José Saramago. A Consistência dos Sonhos", que ambos visitaram. Sublinhando que a adaptação e o guião do filme estão muito bem feitos, o escritor afirmou que "Blindness" agradou-o "em todos os aspectos".
O Nobel confessou o fascínio que tem pelo personagem do cão que lambe as lágrimas de uma mulher, mas admitiu que teria gostado que o animal escolhido para o filme fosse maior. "Podiam esquecer tudo, mas gostava de entrar na história como o criador do cão das lágrimas. Confesso que aquele não é exactamente o que imaginei. E numa situação daquelas, de uma cidade reduzida ao caos, o cão não podia ser um cachorrinho", disse. Para o escritor, o animal escolhido "não tem a potência dramática que lhe tentou dar”.
Questionado se conversou com Fernando Meirelles durante as filmagens de "Blindness", o Nobel da Literatura disse que se encontrou apenas com o realizador brasileiro no início do processo. "Tenho o princípio de não interferir no trabalho de quem está a fazer o trabalho. Não gosto de dar sentenças. O realizador tinha de se sentir totalmente livre. Não era eu que lhe ia bater no ombro e dizer o que fazer. Não queria que qualquer palavra minha pudesse ser interpretada como a expressão de qualquer minha vontade", afirmou o escritor.
Escritor desvaloriza opinião negativa dos críticosQuanto à possibilidade de Fernando Meirelles adaptar outro livro seu para cinema, José Saramago disse que "não há nenhuma razão" para o realizador brasileiro ficar "agarrado" à sua obra, mas "se algum lhe interessar, conversaremos". Num comentário às críticas pouco favoráveis que saíram do Festival de Cannes, onde "Blindness" foi o primeiro filme a ser exibido, o Prémio Nobel desvalorizou as opiniões dos críticos de cinema afirmando que o que os distingue de um qualquer apreciador de cinema é o facto de terem a possibilidade de publicar a sua opinião.
Por seu lado, o realizador brasileiro disse que houve "críticas boas e ruins", mas confessou que estava mais ansioso por ouvir a opinião de José Saramago. "Estava mais ansioso do que quando mostrei o filme para três mil pessoas em Cannes", afirmou aos jornalistas, mostrando-se satisfeito por "Blindness" ter agradado ao escritor.
Questionado sobre se iria adaptar outra obra do autor português, Fernando Meirelles disse que dá sempre "um passo depois do outro" e não sabe o que vai fazer a seguir. No entanto, admitiu que tem vontade de "fazer uma coisa mais leve", talvez uma comédia. "As preocupações sociais fazem parte do meu universo de atenção. Mas agora queria trabalhar num assunto leve. Tenho feito filmes com temática muito dramática e queria uma coisa mais leve, como uma comédia", afirmou.
Quanto ao "Blindness", que chegará a Portugal em Novembro, Fernando Meirelles disse que a versão mostrada em Cannes é a 11ª edição montada do filme, que "ainda não está acabado". "Como fomos fazer a abertura tivemos de o apressar, mas vai ter um último acerto e a versão que vai chegar a Portugal em Novembro não vai ser igual", afirmou.
Sobre a exposição que hoje visitou durante cerca de uma hora com o Nobel da Literatura, o realizador brasileiro mostrou-se surpreendido "pelo volume" da vida de Saramago. "É perceber a história de uma vida. É muito emocionante perceber uma vida, ver o seu lado de inteligência, de política, de artista e de pai de família que tem de traduzir para trabalhar", disse.