A novela do Call Girl
Podia ser um bom filme, um "film noir" à portuguesa ou mesmo um bom "ersatz" de Chabrol, e não teria sido mau se fosse isso. Mas de um ponto de partida prometedor "Call Girl" descamba num telefilme escorreito e cumpridor mas inexplicavelmente anónimo, que dura pelo menos meia hora a mais do que devia e se perde em peripécias rocambolescas mais próprias de uma telenovela (o inspector da Judiciária ex-namorado da call girl?).
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Podia ser um bom filme, um "film noir" à portuguesa ou mesmo um bom "ersatz" de Chabrol, e não teria sido mau se fosse isso. Mas de um ponto de partida prometedor "Call Girl" descamba num telefilme escorreito e cumpridor mas inexplicavelmente anónimo, que dura pelo menos meia hora a mais do que devia e se perde em peripécias rocambolescas mais próprias de uma telenovela (o inspector da Judiciária ex-namorado da call girl?).
E esse é mesmo o problema central: um guião episódico que carrega a fundo no lugar-comum e que parece mais interessado em forçar a coincidência inverosímil, que lança pistas que depois acabam por não ser seguidas, que se multiplica em personagens e subnarrativas que nunca são devidamente exploradas ou aproveitadas (mete dó ver Custódia Gallego, Raul Solnado ou Maria João Abreu aparecerem em duas ou três cenas perfeitamente supérfluas à história central e hop, passa ao próximo) enquanto as personagens principais são lentamente esvaziadas de tudo o que não seja o arquétipo mais banal.
Um decepcionante Ivo Canelas confunde intensidade com histerismo (e escatologia verbal com fúria) num polícia de anedota com um poster de "Cães Danados" na parede, Joaquim de Almeida cabotina com mais charme do que é habitual como um "lobbyista" oleoso e Nicolau Breyner comprova mais uma vez a sua classe no inocente de serviço à trama.
Claro que tudo isto não vai absolutamente interessar àqueles que só querem mesmo ver as formas esculturais de Soraia Chaves (para os interessados: sugeridas durante os primeiros 30 minutos e só então vistas na sua esplendorosa íntegra) mas, honra lhe seja feita, Soraia Chaves é aqui uma actriz que defende bem a personagem de uma mulher forte que decide como e quando quer explorar ou ser explorada. Mas essa personagem acaba por não ter o filme que merecia. E é tanto mais pena quanto se percebe que há aqui um potencial de bom filme "mainstream" perdido por entre uma fita espertalhona que quer piscar o olho ao público da TVI, e onde a elegância que se reconhece a António-Pedro Vasconcelos no seu melhor está estranhamente ausente.