Juíza mandou destruir escutas entre Arouca, Sócrates e Morais
Uma juíza do Tribunal de Instrução Criminal (TIC) de Lisboa negou a sua validação e, consequentemente, ordenou a destruição das gravações, alegando que estas não haviam sido sujeitas, dentro do prazo previsto por lei, a um controlo por um juiz de direito.
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Uma juíza do Tribunal de Instrução Criminal (TIC) de Lisboa negou a sua validação e, consequentemente, ordenou a destruição das gravações, alegando que estas não haviam sido sujeitas, dentro do prazo previsto por lei, a um controlo por um juiz de direito.
As escutas em causa iniciaram-se a 15 de Março de 2007, após o PÚBLICO ter questionado pela primeira vez o gabinete do primeiro-ministro sobre o seu dossier de aluno na Independente. E cobrem ainda os dias que se seguiram à publicação dos primeiros artigos sobre o assunto, a 22 de Março.
A directora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), Cândida Almeida, escolhida pelo procurador-geral da República para conduzir a investigação relativa ao diploma de José Sócrates, na resposta ao despacho da juíza do TIC (cuja assinatura, nos autos, é irreconhecível), critica esta decisão, mas opta por não recorrer oficialmente dela.
Cândida Almeida pedira apenas a transcrição e validação de três das 16 sessões telefónicas que ouviu. Todas estas escutas haviam sido transferidas, em suporte digital, a partir de um inquérito em curso no Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa, que envolve a administração da UnI - e no âmbito do qual o ex-director da instituição, Rui Verde, se encontra detido e o ex-reitor, Luís Arouca, fora constituído arguido. Estas escutas haviam já sido fiscalizadas e seleccionadas por um juiz de instrução criminal, mas para esta investigação específica.
Numa carta enviada à juíza do TIC, de acordo com os autos do processo - consultado durante a semana passada pelo PÚBLICO -, Cândida Almeida argumenta que a sua decisão é tanto mais incompreensível quanto as três intercepções telefónicas que pretendia ver transcritas permitiam "reforçar" a opção de arquivamento do processo, demonstrando a "total boa-fé de José Sócrates na tramitação da obtenção da sua licenciatura".
Nos autos do processo consta uma grelha (ver texto nesta página) com todas as sessões telefónicas que a procuradora do DIAP, Fernanda Pêgo, que tem a cargo o processo relativo à gestão da UnI, entendeu que podiam servir ao inquérito sobre o diploma de José Sócrates - depois de Cândida Almeida lhe ter solicitado "toda a documentação" e "todos os elementos com ele relacionados", nomeadamente essas escutas.
Dessa grelha decorre que oito dos 16 telefonemas foram da iniciativa do primeiro-ministro, entre os dias 15 e 26 de Março. Há ainda quatro contactos entre Arouca e António José Morais, no mesmo período, e um outro para um responsável do Ministério da Educação, Carlos Rodrigues, subdirector da Direcção-Geral da Inovação e Desenvolvimento Curricular, do Ministério da Educação e ex-docente na UnI.
O teor da maioria dos contactos, apurou o PÚBLICO, são conversas entre José Sócrates e Luís Arouca sobre as respostas a dar ao PÚBLICO, na sequência da investigação que este jornal estava a fazer; mas também entre Luís Arouca e António José Morais, que deu quatro das cinco cadeiras com que o primeiro-ministro concluiu o curso na Independente.
António José Morais pertencera ao gabinete de Armando Vara, quando este fez parte do Governo de António Guterres, e foi director-geral do Gabinete de Infra-estruturas e Equipamentos do MAI, já durante o actual Governo PS. Apesar de sempre ter negado ter uma relação pessoal com José Sócrates, este militante do PS trata o primeiro-ministro por "Zé".
Cândida Almeida decidiu-se pelo arquivamento do inquérito, em Julho passado, imputando a responsabilidade de todas as falhas decorrentes do processo de licenciatura de José Sócrates à UnI. E concluindo que o primeiro-ministro não teve "qualquer tratamento de favor", "em detrimento dos restantes candidatos à licenciatura, em igualdade de circunstâncias académicas".