Pratica(mente)
Igual, porque na capa lá está ele com a sua "família", agora bem mais alargada; porque há o mesmo apetite por novas pistas sonoras; os mesmos excertos mínimos de música ligeira portuguesa e pedaços extraídos de fontes surpreendentes (os interlúdios são todo um mundo onde descobrimos Saramago, António Pinho Vargas ou José Mariño); está lá também a família nuclear, com destaque para o pai e, mais uma vez, o avô. Está lá parte da sua vida. Diferente porque nos últimos anos aprofundou cumplicidades e alimentou outras (e cá estão Lil' John e Kalaf dos 1-Week Project e Buraka Som Sistema; Pacman dos Da Weasel; Carlos Bica; Gramaço; Manuel Faria dos Trovante; NBC; Melo D, o pai Napoleão Mira, os Cool Hipnoise e outros), aperfeiçoou a forma de debitar palavras – apesar de ainda existir alguma rigidez. Mas é inegável o amadurecimento. Já não desvia o olhar. Agora é olhos nos olhos. Não porque esteja mais seguro – toda a criação é feita de insegurança, diria ele – mas porque percebeu que a força reside na maneira frágil e vital como se recria. "Pratica(mente)" é um disco revelador até onde um objecto artístico pode sê-lo. "Não é propositado, mas este será o meu álbum mais pessoal e concreto. Sou uma pessoa introspectiva e gosto de colocar o meu mundo na minha música", dizia em Janeiro. Talvez não fosse necessário enunciá-lo. Já se esperava. Só que desta vez foi mais longe, até à auto-ironia. Tudo gira à volta do seu cosmos. Claro que há os temas habituais no rap (a relação com a indústria, as rivalidades, a ética hip-hop, a língua...), mas é quando o diário afectivo entra em acção que somos conquistados. Como já acontecia em "Beats vol.1 – Amor", há várias narrativas sónicas repletas de pequenas histórias (é impossível não deixar de pensar em "3 Feet High And Rising" dos De La Soul) que colam com os temas propriamente ditos. Há, acima de tudo, uma maior maturação sónica. Faixas como "Juventude (é mentalidade)", "Poetas do karaoke", "Abstenção", "Retrospectiva de um amor profundo", "Pus-me a pensar", "Slides (referências)" ou "Hereditário" expõem grande elasticidade sonora, mas em todas há uma intencionalidade precisa, uma batida seca, enxuta, com sequências rítmicas de economia narrativa, num estilo de produção com pontos de contacto, por exemplo, com os Neptunes de Pharrell Williams, principalmente quando os temas contêm elementos da soul, do jazz ou do R&B. É um disco rico, labiríntico, com vários níveis de leitura, daqueles a que se regressa para se perceber mais um pouco do seu propósito. Sam já não é "The Kid", mas continua com o espírito aberto como se fosse. E isso é grande.
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Igual, porque na capa lá está ele com a sua "família", agora bem mais alargada; porque há o mesmo apetite por novas pistas sonoras; os mesmos excertos mínimos de música ligeira portuguesa e pedaços extraídos de fontes surpreendentes (os interlúdios são todo um mundo onde descobrimos Saramago, António Pinho Vargas ou José Mariño); está lá também a família nuclear, com destaque para o pai e, mais uma vez, o avô. Está lá parte da sua vida. Diferente porque nos últimos anos aprofundou cumplicidades e alimentou outras (e cá estão Lil' John e Kalaf dos 1-Week Project e Buraka Som Sistema; Pacman dos Da Weasel; Carlos Bica; Gramaço; Manuel Faria dos Trovante; NBC; Melo D, o pai Napoleão Mira, os Cool Hipnoise e outros), aperfeiçoou a forma de debitar palavras – apesar de ainda existir alguma rigidez. Mas é inegável o amadurecimento. Já não desvia o olhar. Agora é olhos nos olhos. Não porque esteja mais seguro – toda a criação é feita de insegurança, diria ele – mas porque percebeu que a força reside na maneira frágil e vital como se recria. "Pratica(mente)" é um disco revelador até onde um objecto artístico pode sê-lo. "Não é propositado, mas este será o meu álbum mais pessoal e concreto. Sou uma pessoa introspectiva e gosto de colocar o meu mundo na minha música", dizia em Janeiro. Talvez não fosse necessário enunciá-lo. Já se esperava. Só que desta vez foi mais longe, até à auto-ironia. Tudo gira à volta do seu cosmos. Claro que há os temas habituais no rap (a relação com a indústria, as rivalidades, a ética hip-hop, a língua...), mas é quando o diário afectivo entra em acção que somos conquistados. Como já acontecia em "Beats vol.1 – Amor", há várias narrativas sónicas repletas de pequenas histórias (é impossível não deixar de pensar em "3 Feet High And Rising" dos De La Soul) que colam com os temas propriamente ditos. Há, acima de tudo, uma maior maturação sónica. Faixas como "Juventude (é mentalidade)", "Poetas do karaoke", "Abstenção", "Retrospectiva de um amor profundo", "Pus-me a pensar", "Slides (referências)" ou "Hereditário" expõem grande elasticidade sonora, mas em todas há uma intencionalidade precisa, uma batida seca, enxuta, com sequências rítmicas de economia narrativa, num estilo de produção com pontos de contacto, por exemplo, com os Neptunes de Pharrell Williams, principalmente quando os temas contêm elementos da soul, do jazz ou do R&B. É um disco rico, labiríntico, com vários níveis de leitura, daqueles a que se regressa para se perceber mais um pouco do seu propósito. Sam já não é "The Kid", mas continua com o espírito aberto como se fosse. E isso é grande.