Tsunami: reconstrução avança lenta seis meses depois da catástrofe

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Mais de um milhão de pessoas perdeu o seu ganha-pão e a maior parte ainda não o recuperou AFP

A catástrofe de 26 de Dezembro começou com um sismo de magnitude 9,15 diante da ilha de Samatra, na Indonésia, e assumiu proporções gigantescas com o tsunami que se seguiu. Em pelo menos 13 países, o abalo e as ondas fizeram vítimas. Numa compilação de dados de diferentes fontes, a agência Reuters apresenta um saldo de 188.149 mortos e 43.861 desaparecidos. A soma dá 232.010 vidas perdidas.

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A catástrofe de 26 de Dezembro começou com um sismo de magnitude 9,15 diante da ilha de Samatra, na Indonésia, e assumiu proporções gigantescas com o tsunami que se seguiu. Em pelo menos 13 países, o abalo e as ondas fizeram vítimas. Numa compilação de dados de diferentes fontes, a agência Reuters apresenta um saldo de 188.149 mortos e 43.861 desaparecidos. A soma dá 232.010 vidas perdidas.

A destruição foi muito além das vítimas mortais. Cidades inteiras foram reduzidas a escombros. Mais de um milhão de pessoas perdeu o seu ganha-pão e a maior parte ainda não o recuperou, segundo um relatório da Organização Internacional do Trabalho divulgado sexta-feira. O Programa Mundial para os Alimentos, das Nações Unidas, distribuiu até agora 123 mil toneladas de géneros a mais de dois milhões de pessoas. Cerca de 700 mil pessoas ainda dependem dessa ajuda.

O maremoto deixou ainda um pesado legado ambiental. No Sri Lanka, a força das águas criou 500 mil toneladas de entulho, segundo um relatório do Programa das Nações Unidas para o Ambiente, concluído há dez dias. A intrusão da água salgada tornou inutilizáveis mais de 15 mil poços e furos. Nas zonas onde estavam mais preservados, mangais e recifes de corais amorteceram as ondas. Mas em muitas áreas foram destruídos. Estuários e lagoas costeiras ficaram contaminados ou assoreados.

A população mais carente está a sofrer mais para voltar a uma vida normal. "Pessoas desesperadamente pobres ficaram ainda mais pobres com o maremoto", afirma Barbara Stocking, directora da organização humanitária internacional Oxfam. Aqueles com mais recursos, segundo a Oxfam, puderam ir viver em casa de parentes, ser recompensados por seguradoras, reconstruir os seus negócios. Os mais pobres, sem casa nem meios de subsistência, foram para campos de desalojados, onde é mais difícil reerguer uma vida.

Passada a emergência inicial, os países afectados pela catástrofe vão traçando um diagnóstico mais preciso do que têm de fazer. Mas a reconstrução está na primeira infância. Ainda há pessoas a viver em tendas, em condições precárias. Infra-estruturas básicas, como sistemas de abastecimento, estradas e escolas permanecem destruídas. Continua a não haver um sistema de alerta para um novo tsunami na região, apesar de ter-se declarado que isto era uma prioridade.

Reunidos sexta-feira no Luxemburgo, representantes das Nações Unidas e da União Europeia declararam que é necessário acelerar o passo. "É preciso fazer tudo, nos próximos meses, para que consigamos introduzir na reconstrução a mesma eficácia que caracterizou a fase humanitária", disse o ministro luxemburguês da Cooperação, Jean-Louis Schiltz. "Eu não quero que, dentro de um, três, quatro anos, vejamos imagens de vítimas em campos [de desalojados]", acrescentou o comissário europeu do Desenvolvimento e da Ajuda Humanitária, Louis Michel.

Cinco a dez anos de trabalho

A ONU calcula que serão precisos cinco a dez anos para emendar os estragos que a natureza fez em cinco a dez segundos. Em parte, isto dependerá dos governos dos países afectados. E, em parte, da ajuda internacional. As promessas de apoio, de governos e particulares, somam mais de 10 mil milhões de dólares. Mas uma boa fatia do dinheiro - metade, no caso da ajuda pública - está por ser aplicada. Os países da União Europeia, que se comprometeram com um auxílio de 2,3 mil milhões de euros, já investiram maciçamente na ajuda humanitária, mas ainda pouco na reconstrução.

Há sinais, porém, de que isto começa a mudar. Mesmo entre as organizações não-governamentais (ONG), há quem esteja a ir agora para o terreno, para cumprir tarefas específicas. A organização portuguesa Inde - Intercooperação e Desenvolvimento iniciou um projecto cuja missão central é reabilitar a Casa da Rádio Comunitária de Meulaboh, na província indonésia de Aceh, a mais afectada pelo maremoto. O dinheiro vem de uma campanha feita "fora do momento da emoção", diz Arnaud Delatour, que lidera a Inde.

Outras ONG estão a adaptar a sua actividade, agora que passou o período crítico. "Passámos de uma missão de emergência para uma missão de desenvolvimento", afirma João Aranha, dos Médicos do Mundo, que mantém dois psicólogos e um enfermeiro em Baticaloa, no Sri Lanka, e apoia a reconstrução de centros de saúde locais.

Muitos têm sugerido que a reconstrução deve melhorar o que havia, e em vários aspectos. O ex-presidente norte-americano Bill Clinton, nomeado enviado especial da ONU para o auxílio às vítimas do maremoto, traçou um plano de quatro pontos, no qual o primeiro envolve respeitar os direitos das mulheres e envolvê-las na reconstrução, evitar a discriminação de castas na Índia e aproveitar a oportunidade para tentar resolver os conflitos separatistas no Sri Lanka e em Aceh, na Indonésia.

Neste último ponto, o tsunami parece ter tido já uma pequena influência. O Governo do Sri Lanka e os Tigres Tamil, que há duas décadas lutam por um território independente no Norte do país, assinaram sexta-feira um acordo para a repartição do auxílio humanitário, que não estava a chegar aos territórios rebeldes. O acordo é bem visto pelo Governo, a julgar pelas palavras do ministro do Comércio, Jeyaraj Fernandopulle, ao anunciar o pacto: "É um primeiro passo para retomarmos as negociações de paz".