Programa do Governo para reduzir o défice levanta dúvidas à Comissão
Este risco é avançado pela Comissão Europeia em dois documentos de análise das finanças públicas portuguesas que serão hoje aprovados pelos vinte e cinco comissários: no primeiro, Bruxelas analisa o PEC português para o período 2005-2009 apresentado pelo Governo com a estratégia que conta seguir para reduzir o défice dos 6,2 por cento do produto interno bruto (PIB) previstos para este ano, para menos de três por cento, o limite máximo autorizado pelo PEC. No segundo, a Comissão analisa as causas da derrapagem no quadro da primeira etapa do "procedimento por défice excessivo" (PED) que desencadeará hoje formalmente contra o país (ver caixa).
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Este risco é avançado pela Comissão Europeia em dois documentos de análise das finanças públicas portuguesas que serão hoje aprovados pelos vinte e cinco comissários: no primeiro, Bruxelas analisa o PEC português para o período 2005-2009 apresentado pelo Governo com a estratégia que conta seguir para reduzir o défice dos 6,2 por cento do produto interno bruto (PIB) previstos para este ano, para menos de três por cento, o limite máximo autorizado pelo PEC. No segundo, a Comissão analisa as causas da derrapagem no quadro da primeira etapa do "procedimento por défice excessivo" (PED) que desencadeará hoje formalmente contra o país (ver caixa).
Bruxelas só se pronunciará a 20 de Julho sobre o prazo que conta dar ao Governo para se conformar com o PEC, mas há boas possibilidades de ser o ano de 2008, como previsto no calendário do Governo. Só que os serviços de Joaquín Almunia, comissário europeu responsável pelos Assuntos Económicos e Financeiros, interrogam-se sobre as possibilidades reais de cumprimento deste calendário.
A opção do Governo de recorrer a aumentos dos impostos no início do período parece ser considerada inevitável para assegurar a transição entre a época em que o défice foi mantido abaixo dos três por cento do PIB essencialmente graças ao recurso maciço a medidas extraordinárias e a fase da verdadeira consolidação, que assentará na redução das despesas do Estado através das reformas da administração pública e da segurança social e contenção dos salários.
Só que, avisa Almunia, a estratégia portuguesa comporta "vários elementos de risco" que poderão impedi-la de se materializar, podendo levar a um arrastamento da situação de défice excessivo para lá de 2008, a menos que o Governo adopte medidas adicionais.
Tendência para empolar as previsõesO primeiro risco tem que ver com as projecções para o crescimento económico depois de 2007, que poderão revelar-se "optimistas", o eufemismo habitual dos serviços da Comissão para dizer "irrealistas", um risco que é reforçado pela tradicional tendência nacional para empolar as previsões. As dúvidas resultam de uma possível subavaliação dos efeitos negativos das medidas de contenção sobre o crescimento económico, enquanto a perca da competitividade externa portuguesa num contexto de concorrência internacional crescente poderá ferir a contribuição das exportações para o crescimento.
A segunda grande interrogação da Comissão tem que ver com o risco de as medidas avançadas pelo Governo para aumentar receitas e reduzir despesas poderem ser "menos eficazes que o previsto, ou demorarem mais tempo a produzir os resultados desejados". Isto porque, refere, o aumento dos impostos - IVA, tabaco, combustíveis - reforça o risco de evasão fiscal, enquanto o essencial das medidas de contenção de despesas ainda precisa de ser juridicamente adoptado.
Um terceiro documento de análise técnica que acompanha o lançamento do PED refere que as despesas do Estado manterão este ano a tendência de alta atingindo 49,1 por cento do PIB contra 48,4 por cento no ano passado. Em paralelo, e apesar do aumento dos impostos, as receitas totais do Estado deverão cair de 45,4 por cento do PIB em 2004 para 42,9 por cento este ano, devido à redução das medidas extraordinárias dos governos PSD-CDS/PP e dos dividendos das empresas públicas. As receitas fiscais deverão, aliás, manter-se sensivelmente ao mesmo nível que no ano passado.
Também a dívida pública poderá evoluir de forma menos favorável do que o previsto, avisa Bruxelas, devido às interrogações que pesam sobre a actividade económica e sobre as metas orçamentais, a par do risco de uma acumulação de encargos financeiros não orçamentados, à luz da experiência recorrente em Portugal de classificar mal as despesas públicas.
Défice acima dos três por cento depois de 2008Todos estes factores contribuem para alimentar a convicção da Comissão de que o défice poderá permanecer acima dos três por cento depois de 2008, a menos que o Governo adopte medidas suplementares, que não são especificadas.
Mas mesmo que o programa de estabilidade seja escrupulosamente cumprido "não fornece a margem de segurança necessária contra uma nova ultrapassagem do limite do défice em caso de flutuações macroeconómicas normais", afirma a Comissão. Mais: uma análise de sensibilidade "mostra que o défice ainda se manterá em três por cento, ou muito próximo, em 2009, em caso de desenvolvimentos macroeconómicos desfavoráveis".
Bruxelas critica por outro lado implicitamente o facto de o programa de estabilidade não apresentar projecções para assegurar a sustentabilidade de longo prazo das finanças públicas, um problema particularmente agudo em Portugal em resultado dos efeitos previsíveis do envelhecimento da população.