O mistério sem sementes nem diabo
No desenvolvimento da história, há ecos de outros contos de duplicidade (como "O Outro" de Robert Mulligan) e um modo de filmar o Central Park e os seus túneis (local da morte do primeiro Sean, no qual o seu "substituto" marca um encontro à inconsolável viúva) a lembrar outros mistérios, nomeadamente "In the Still of the Night" de Robert Benton. Só que este apelo para cinéfilo empedernido, sempre disposto a "fazer filmes", não corresponde a uma narrativa coerente ou à possibilidade de criar um ambiente de terror psicológico: tudo é contado com óbvia neutralidade, quase em tom de comédia de costumes, com sugestões de trangressões sexuais, nunca totalmente assumidas.
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No desenvolvimento da história, há ecos de outros contos de duplicidade (como "O Outro" de Robert Mulligan) e um modo de filmar o Central Park e os seus túneis (local da morte do primeiro Sean, no qual o seu "substituto" marca um encontro à inconsolável viúva) a lembrar outros mistérios, nomeadamente "In the Still of the Night" de Robert Benton. Só que este apelo para cinéfilo empedernido, sempre disposto a "fazer filmes", não corresponde a uma narrativa coerente ou à possibilidade de criar um ambiente de terror psicológico: tudo é contado com óbvia neutralidade, quase em tom de comédia de costumes, com sugestões de trangressões sexuais, nunca totalmente assumidas.
Lauren Bacall, na chiquíssima mãe, passeia os restos do seu esplendor por uma personagem sem qualquer interesse. A Kidman (continuamos sem perceber como chegou a estrela...), claramente a imitar Mia Farrow, abre e fecha os olhos, ao sabor das surpresas que se supõem dever desarmar o espectador. A criança, Cameron Bright de sua graça, tem um lado arrepiante, mas desfaz a sua convincente reincarnação sem que percebamos porquê, ou melhor, ao sabor da sua fixação pela Kidman, no momento em que percebe que lhe foi infiel na "outra vida". Mesmo a personagem de Anne Heche, a amante, funciona como uma chave frouxa de um epílogo incongruente e confuso.
O principal problema de "O Mistério" é que nada tem de misterioso, forçando a nota e inventando motivos de interesse, onde eles, de facto, não existem: quando muito, há material narrativo para uma curta anedota ilustrada. Glazer puxa pelo folclorismo da mente até ao ridículo do insuportável. Parece que ninguém sabe como acabar a história, nem resolver o "puzzle" que se criou, "encharcado" em Wagner e em pretensioso culturalismo. E voltamos à sofisticação sem razão de ser de um objecto vazio, contente de si e da sua capacidade para mistificar, como se quisesse fazer um "A Semente do Diabo" de bolso, com encadernação de luxo, sem sementes do que quer que seja, nem resquício de Diabo ou de outras presenças do Mal.
No final, fica a suprema desilusão, sentimo-nos defraudados com tanta metafísica de pacotilha, embrulhada em papel de lustro. Como exercício no vazio, irrita, como "pastiche" de um género não faz sentido, até porque nunca se percebe qual o objectivo desta ficção errática.