Empresa brasileira prevê investir em fábrica de computadores em Ponte de Lima

O presidente da Cobra Tecnologia renova interesse em criar fábrica de computadores na localidade minhota, projecto visto pelo grupo brasileiro como uma oportunidade de entrar na Europa e nos PALOP

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A empresa brasileira, presidida por Leandro Raimundi, pode constituir uma âncora para o pólo tecnológico de Ponte de Lima Nuno Ferreira Santos/PÚBLICO

O projecto começou por ser contestado pela Associação Portuguesa dos Fabricantes de Equipamentos Informáticos (APFEI) mas, entretanto, o seu andamento ficou em suspenso devido à demissão do anterior administrador executivo, após terem sido apontadas irregularidades contabilísticas e fiscais ao grupo. Leandro Raimundi assumiu o comando do grupo e, por isso, esteve em Portugal há poucos dias para retomar as negociações do projecto.

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O projecto começou por ser contestado pela Associação Portuguesa dos Fabricantes de Equipamentos Informáticos (APFEI) mas, entretanto, o seu andamento ficou em suspenso devido à demissão do anterior administrador executivo, após terem sido apontadas irregularidades contabilísticas e fiscais ao grupo. Leandro Raimundi assumiu o comando do grupo e, por isso, esteve em Portugal há poucos dias para retomar as negociações do projecto.

Está pela primeira vez em Portugal na qualidade de presidente do grupo Cobra Tecnologias. Veio falar com a API e com a Universidade do Minho?

Com a Universidade ainda não falei mas estive reunido com a API, com o dr. Costa Lima. Mas há intenção de chegar a acordo com a Universidade não só para desenvolver o pólo tecnológico de Ponte de Lima, mas também para ir buscar mão-de-obra qualificada, como engenheiros. Encontrei-me igualmente com o presidente de Ponte de Lima e com um empresário da área das telecomunicações. Vim apresentar-me como novo presidente da companhia e reafirmar o interesse no projecto e a intenção institucional de o promover e de o desenvolver.

Têm surgido dúvidas sobre a viabilidade do projecto...

Acreditamos que o projecto é estratégico e realizável. Nesta fase, vamos começar a desenvolver um estudo de viabilidade, um pré-requisito exigido pela API, e o seu resultado vai dar orientações para contextualizar o projecto. O estudo é também uma exigência do Banco do Brasil, como controlador da Cobra, para poder ter um documento que dê consistência ao projecto.

Quando estará concluído o estudo e arranca a construção do "cluster"?

Acredito que dentro de 60, o mais tardar 90 dias. O prazo inicial aponta para o primeiro trimestre de 2005 mas acredito que só será no segundo semestre.

E se o estudo de viabilidade indicar que o projecto não é viável?

O estudo de viabilidade vai dar-nos apenas a indicação sobre a dimensão do projecto. Nós já temos dados que indicam que ele é viável e é mesmo para arrancar. O cluster poder ser viabilizado com uma maior ou menor dimensão, mas ele viabiliza-se movendo toda a cadeia produtiva. O estudo apenas nos irá dar indicações mais precisas.

Qual é o investimento?

Tudo dependerá da composição do "cluster". Estamos a propor um pólo tecnológico envolvendo fabricação de "hardware", de desenvolvimento de soluções na área de "software" para a área da automação bancária e comercial, com mão-de-obra especializada, engenheiros de "software" e técnicos. Dependendo da composição do "cluster" e de quantas empresas o vão integrar é que se conseguirá definir qual o investimento necessário.

Quais as contrapartidas que vão receber da Câmara de Ponte de Lima (CMPL) e da API?

A Câmara doa o terreno, que fica na zona industrial de Ponte de Lima, que está 90 por cento destinada ao "cluster", e os apoios da API dependem do projecto. O que vai determinar é o contexto do projecto que será definido pelo estudo de viabilidade.

Fica-se com a ideia de que a essência do projecto está ainda numa fase muito indefinida. Pois falar em montagem de computadores é uma coisa, com pouco de estruturante; falar em desenvolvimento de "software" é outra coisa...

A nossa intenção é fabricar "hardware", tanto computadores de secretária como de equipamento de automação bancária (as chamadas ATM) e todo o portfólio de soluções de sistema que suportem essa plataforma. Agora, será o estudo e o perfil do "cluster" que vão determinar quantas empresas podem participar nele, sem haver canibalismo e havendo uma integração e sinergias. E só o porte dessas empresas é que indicará qual o investimento que se irá realizar.

Acordo com a Solbi, o principal fabricante português de PCO que está em discussão é o montante de investimento ou a vinda para Portugal?

A vinda para Portugal é certa. É uma intenção institucional, delineada com o Governo do Brasil e o Banco do Brasil que é nosso accionista maioritário. Já estamos a abrir um escritório em Lisboa, da Cobra Tecnologia, para poder firmar base em Ponte de Lima, e já estamos a fazer trabalho de selecção de fornecedores no Brasil.

Qual a importância estratégica do projecto para o grupo Cobra?

É total: é uma oportunidade que temos de nos instalarmos na Europa, de desenvolver uma estratégia para abraçar os países de língua portuguesa e o Leste europeu, mas também de consolidar o fabrico de equipamento com a marca Cobra.

Está a referir-se aos componentes de equipamento mais simples, como caixas, parafusos...? Porque os mais complexos (processadores, discos, placas gráficas, etc.) vêm inevitavelmente do Oriente, onde há preços mais competitivos... Viabiliza-se uma produção de PC com 50 mil unidades/ano, e uma de ATM com três mil/ano.

Não necessariamente e será o resultado do estudo que o vai determinar.

Existem competências em Portugal para fabricar para além de caixas ou parafusos?

Sim, acho, tanto na área de "hardware" quanto na de "software". A competência existe e vocês têm pólos de desenvolvimento tecnológico nas universidades que permitem fazer um projecto fabril. Exceptuando a questão do processador, os restantes componentes são possíveis de fabricar em Portugal. No Brasil fabricam-se... A ideia é convidar empresas brasileiras a instalar-se em Ponte de Lima, contratando mão-de-obra da região e desenvolver os componentes.

Estão a trabalhar com que consultora?

Ainda com nenhuma, mas uma forte candidata é a Deloitte e pensamos fechar negócio no início de Janeiro. Quem a contratará é o Banco do Brasil.

Os fabricantes nacionais de PC têm-se mostrado preocupados com a vossa vinda para Portugal?

Não vejo como. Existe a possibilidade de alguns fabricantes portugueses virem a integrar o pólo. Existe um acordo com a Solbi, o principal fabricante português de PC. Mas a sua integração no "cluster" vai, mais uma vez, depender do resultado do estudo.

O objectivo do "cluster" é exportar para outros mercados a partir de Portugal?

Em Portugal, não existe procura suficiente para justificar que se produza para o mercado interno. O objectivo estratégico é ter Portugal como rampa de lançamento de produtos para o mercado europeu, nomeadamente o dos novos Estados da União Europeia. É importante desenvolver uma plataforma que atenda os países de língua portuguesa: tem a ver com acordos diplomáticos envolvidos mas também com o interesse estratégico da empresa. Mais de 80 por cento da produção do pólo tecnológico destina-se a exportar a partir de Portugal.

Falou-se na possibilidade de instalar em Ponte de Lima os "call centers" da Varig e do Banco do Brasil...

Em princípio, o "call center" do "cluster" estará centrado no serviço às empresas integrantes do "cluster", no sentido de dar um atendimento de primeiro nível e suporte aos consumidores ou às empresas. Mas depois poderá alargar-se a outras áreas: é tudo uma questão de escala.

Outros projectos da área das tecnologias de informação desistiram de investir na região alegando iliteracia da população. Há seis anos, a Samsung desistiu de investir à última hora, já depois de assinado o convénio com as autoridades portuguesas, porque concluiu que precisava do inglês para comunicar com os trabalhadores. No caso da Cobra, o problema da comunicação básica está resolvido...

Claro e muita coisa mudou entretanto. Há seis anos estavam a sair os primeiros formados da Universidade do Minho.

Como vê as actuais condições de suspensão política que se vive em Portugal?

Discutimos esse ponto quer com a API quer com a CMPL e verificámos que existe uma grande tranquilidade, pois tudo o que está a ser feito é independente do posicionamento político. O país continua, isto apesar da crise política, o que é bom. Na reunião com a API, não nos foi suscitada qualquer questão sobre esse ponto.