Marivaux de subúrbio
Até aqui tudo bem. Os jovens estudam Marivaux. Uma professora "progressista" fá-los representar "O Jogo do Amor e do Acaso", para lhes falar das diferenças sociais espelhadas na texto barroco. Os ensaios com traje fornecem aos jovens uma saudável evasão. Os seus jogos amorosos parecem-se com os de quaisquer outros jovens da sua idade.
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Até aqui tudo bem. Os jovens estudam Marivaux. Uma professora "progressista" fá-los representar "O Jogo do Amor e do Acaso", para lhes falar das diferenças sociais espelhadas na texto barroco. Os ensaios com traje fornecem aos jovens uma saudável evasão. Os seus jogos amorosos parecem-se com os de quaisquer outros jovens da sua idade.
Os problemas surgem, quando já entendemos o programa do filme e somos confrontados com a repetição, com excesso de decibéis, diga-se de passagem, das mesmas fórmulas e dos mesmos pressupostos. Claro que se percebe a intenção de figurar o amor intemporal, fazendo com que Krimo se apaixona pela sua colega Lydia, de modo a querer interpretar Arlequim na peça escolar em ensaios, ao lado da sua Lisette. Claro que é curioso assistir ao "massacre" do texto, quer pelos que lhe dão intenção de amadores, quer pelo que apenas se serve da peça para conquistar a sua apaixonada. Mas até onde pode ir esta variação sobre o "film de banlieue", contra os clichés rácicos e contra os preconceitos culturais?
Poderá, contudo, dizer-se que esta benigna visão sobre a juventude da periferia de Paris se refugia demasiado numa bolha de cultura e de "amor", como se os problemas não existissem, como se o uso, ou não, do véu islâmico não tivesse dividido, neste mundo de fingimento e de bons sentimentos. Existe um momento de violência policial, um roubo de telemóvel (embora para servir o encontro amoroso), mas tudo se dilui num inocente e despreocupado "marivaudage", gritado aos quatro ventos.
Não estamos a defender que todos os filmes sobre a "banlieue" tenham que ser brutais, apenas alertamos para o facto de que este filminho divertido, que, aliás, lança um olhar interessante sobre as mutações de uma língua e de uma cultura, em comunidades imigrantes, se fecha no confronto cultural que propõe com os clássicos, como se o tempo não existisse, ou, melhor, como se a cultura não espelhasse o tempo que a criou. Não se trata propriamente de um defeito, mas de uma opção.