O corpo é que paga

E, pormenor relevante, sem que os seus realizadores deixem de reconhecer que fazem parte da patologia do país.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

E, pormenor relevante, sem que os seus realizadores deixem de reconhecer que fazem parte da patologia do país.

A patologia em causa em "Super Size Me" é a bulimia e a obesidade americanas e Morgan Spurlock, o realizador, vai ao ponto de levar a cabo uma dieta exclusiva de McDonald's ao longo de um mês e filmar os efeitos no seu corpo. A proposta resulta em qualquer coisa entre activismo social e "body art", se se pensar como tem tanto de masoquismo como de exibicionismo. Pode-se perguntar se haveria filme caso a experiência de Spurlock tivesse tido outras consequências menos, digamos, aterradoras. Como se pode interrogar se a McDonald's não é o principal alvo de responsabilização pelo estado das coisas por ser a mais icónica e reconhecível cadeia de "fast food" (convenhamos, Burger King ou Taco Bell não seria a mesma coisa...).

Seja como for, Spurlock amplia a questão, estendendo-a às escolas, onde o pronto-a-comer começa a ganhar terreno, e aos interesses económicos que estão por detrás da indústria alimentar, com entrevistas a especialistas e "lobbies" e investigação "in loco".

Reconhece-se a táctica de guerrilha de um Michael Moore, sobretudo na montagem-enquanto-forma-de-comentário (isto é, juntando imagens e/ou sons de natureza e valor diversos), mas Spurlock é, porventura, menos ostensivo (desde logo, não "armadilha" nenhuma das personagens do seu filme) e admite o contraditório (filma um homem do Texas que come diariamente Big Macs e que, aparentemente, é saudável).

Um dos aspectos mais interessantes de "Super Size Me" é mesmo a forma como o filme se torna, em certo sentido, numa experiência da América (para o espectador): Spurlock viaja de Nova Iorque a L.A., comendo sempre em McDonald's, como se este fosse um elemento unificador da grande nação americana. Fica como hipótese: e se "Super Size Me" for a história da América vista através da"fast food"? Para todos os gostos: a América, como a McDonald's, tanto pode ser tida como imperialista (impondo-se ao resto do mundo) como democrática (possibilitando que todos tenham acesso). Bom apetite. E não se engasgue.