Tráfico de pessoas é um negócio de 12 mil milhões de dólares por ano
Sublinhando que este comércio ilícito é um "fenómeno semelhante à escravatura", Mário Gomes Dias informou que envolve anualmente 1,2 milhões de pessoas.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Sublinhando que este comércio ilícito é um "fenómeno semelhante à escravatura", Mário Gomes Dias informou que envolve anualmente 1,2 milhões de pessoas.
Mário Gomes Dias salientou que esta vertente do crime organizado é "uma das piores violações dos direitos do homem". E realçou que um dos seus aspectos mais rentáveis está relacionado com a indústria internacional do sexo: uma mulher pode ser contratada na Albânia por 50 dólares e ser encaminhada para os circuitos internacionais de prostituição, onde dá lucros de dezenas de milhares de dólares.
Segundo Luís Frias, investigador da direcção regional de Coimbra do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), os ganhos gerados pela exploração sexual das mulheres imigrantes são enormes. A conclusão resultou da análise de uma investigação realizada pelo SEF e pela Polícia Judiciária na zona de Coimbra, onde foi apurado que, durante quatro meses, uma mulher ucraniana forçada a prostituir-se tinha gerado lucros de quatro mil contos (20 mil euros) à dona de uma conhecida casa de passe daquela cidade.
Os investigadores apuraram que, no prazo de ano e meio, a dona daquele estabelecimento tinha depositado cerca de 200 mil contos em numerário. O negócio foi interrompido pelas autoridades, que detectaram indícios de ameaças e violência em algumas imigrantes, cujos movimentos eram controlados e se debatiam ainda com dificuldades suplementares, geradas pelo facto de desconhecerem a língua portuguesa e estarem com os documentos ilicitamente retidos.
Sujeitos a julgamento, apenas dois arguidos foram condenados a pena efectiva de prisão, respectivamente, dez e dois anos. Os restantes foram condenados por lenocínio a penas quase simbólicas (entre os 12 e os 30 meses), que foram suspensas ou cumpridas quando estiveram em prisão preventiva. Pouco tempo depois, a dona da casa de passe anunciava em circular, também remetida às autoridades policiais que a investigaram, a abertura de um novo estabelecimento.
Esta atitude só foi possível devido à "brandura" da punição que lhe foi imposta pelo tribunal, pelo facto de, nos casos de tráfico de pessoas e de lenocínio, ser de "muito difícil" provar o crime de associação criminosa. Um ilícito que, na opinião de Mário Gomes Dias, deve ser alvo de uma nova formulação, depois de Portugal ratificar a Convenção das Nações Unidas contra a criminalidade organizada e o protocolo adicional daquele diploma, visando a punição do tráfico de pessoas, em especial de mulheres e de crianças.
Uma análise da resposta judicial ao lenocínio e ao tráfico de pessoas foi, aliás, feita ontem pelo juiz Mouraz Lopes, professor do Centro de Estudos Judiciários. Este magistrado acentuou as mudanças feitas pelo legislador nos últimos 20 anos. E realçou que há aspectos contraditórios. Por um lado, actualmente o Código Penal é menos permissivo do que em 1982, mas também é patente uma maior tolerância perante o exercício profissionalizante da mais velha maneira de ganhar a vida da humanidade.
O juiz citou, a propósito, o agravamento da moldura penal do lenocínio, sem olvidar a proliferação dos anúncios que prometem escaldantes encontros sexuais e enchem as páginas de alguns diários.