Martins da Cruz debaixo de fogo

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O BE quer ouvir em comissão de inquérito o ministro dos Negócios Estrangeiros Carlos Lopes/PÚBLICO

A lei em vigor diz que os filhos dos diplomatas só beneficiam do regime excepcional se terminarem o 12º ano no estrangeiro. Não foi o caso de Diana Martins da Cruz, que terminou o 12º ano no Liceu Francês, em Lisboa, mas no entanto beneficiou desse regime excepcional, por decisão expressa do ex-ministro da Ciência e do Ensino, sob indicação do director-geral do ensino superior, Requicha Ferreira.

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A lei em vigor diz que os filhos dos diplomatas só beneficiam do regime excepcional se terminarem o 12º ano no estrangeiro. Não foi o caso de Diana Martins da Cruz, que terminou o 12º ano no Liceu Francês, em Lisboa, mas no entanto beneficiou desse regime excepcional, por decisão expressa do ex-ministro da Ciência e do Ensino, sob indicação do director-geral do ensino superior, Requicha Ferreira.

A SIC e a TVI divergiram, no entanto, quanto aos pormenores da história. Segundo a SIC, a tentativa de mudar a lei foi levada a cabo pelo chefe de gabinete do ex-ministro Pedro Lynce, comandante Rui Trigoso, que aliás estaria - o que o próprio já desmentiu ao "Expresso" - em vias de se transferir para o MNE, para ocupar o lugar de chefe de gabinete de Martins da Cruz.

Rui Trigoso, oficial da Marinha (e ex-ajudante de campo e consultor do Presidente da República, de onde saiu para o gabinete de Lynce) terá tentado, segundo a SIC, mudar a lei por duas vezes - sendo que ambas permitiriam a Diana Martins da Cruz utilizar o tal regime excepcional sem fazer nenhum requerimento ao ministro da Ciência e Ensino Superior. Por duas vezes, a assessoria jurídica de Pedro Lynce chumbou a ideia. A filha do ministro fez então o tal requerimento, que passou primeiro pelo director-geral do Ensino Superior, Requicha Ferreira, e depois transitou directamente para Lynce, passando à margem do seu gabinete jurídico.

Já de acordo com a TVI, a tentativa de mudar a lei partiu do secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros, Lourenço dos Santos, que, em fins de Maio, levou um anteprojecto de lei ao conselho de secretários de Estado. O diploma seguiu para a auditoria jurídica de Lynce, que o terá chumbado.

Ontem, não houve por parte do Governo nenhum comentário a estas revelações, nomeadamente ao envolvimento do Ministério dos Negócios Estrangeiros neste processo. Durão Barroso quis segurar Martins da Cruz por causa da importância das negociações do tratado europeu, que começaram no passado fim-de-semana. A avaliação terá sido a de que os custos para Portugal seriam maiores se o ministro fosse substituído. De qualquer forma, as suspeitas sobre o papel de Martins da Cruz neste processo - em que deu a sua palavra de honra que nunca falou do caso da filha com o então colega Pedro Lynce - estão a preocupar o Governo, que reconhece o desgaste provocado por esta situação e que admite que a posição de fragilidade do ministro está a condená-lo a um papel a prazo. O porta-voz do MNE, contudo, não esteve ontem contactável.

Oposição exige explicações

Face às revelações da SIC e da TVI, o PS e o Bloco de Esquerda desencadearam uma ofensiva contra o ministro dos Negócios Estrangeiros - mas também visando o próprio primeiro-ministro.

O PS exigiu ao chefe da diplomacia que compareça no Parlamento "com a urgência exigida" para "dar explicações". E ao primeiro-ministro "compete, de imediato, esclarecer tudo o que se passou e tirar as consequências devidas". Numa "nota à imprensa" emitida ontem à noite, o porta-voz do PS, Vieira da Silva, afirma que "se estas notícias se confirmarem há, não só um défice de solidariedade entre membros do Governo como também um gravíssimo défice de verdade".

Em causa está o facto de Martins da Cruz ter dado no Parlamento, sexta-feira passada, a sua "palavra de honra" em como não falara com o ministro da Ciência e do Ensino Superior sobre a situação da sua filha. "As notícias apontam para que a decisão do ex-ministro da Ciência e do Ensino Superior tenha sido tomada na sequência de um conjunto de iniciativas que pretendiam atingir esse objectivo", diz a nota à imprensa do porta-voz do PS.

Já o grupo parlamentar do Bloco de Esquerda (BE) pediu a criação de uma comissão de inquérito, de forma a apurar os novos desenvolvimentos sobre o processo relacionado com o ingresso da filha de Martins da Cruz na Faculdade de Medicina.

Num requerimento enviado a Mota Amaral, presidente da Assembleia da República, os deputados bloquistas exigem ouvir novamente o ex-ministro da Educação, Pedro Lynce, bem como o seu chefe de gabinete, Rui Trigoso. Perante as suspeitas de tentativas de alteração da lei de ingresso ao ensino superior para familiares de diplomatas, o BE quer ainda ouvir nesta comissão de inquérito o ministro dos Negócios Estrangeiros, Martins da Cruz, o secretário-de-Estado, Lourenço dos Santos, e o Director-Geral do Ensino Superior, Requicha Ferreira. Em comunicado enviado à comunicação social, o BE argumenta que "seria intolerável para o Governo e para a maioria que o sustenta não levar as investigações até às últimas consequências".