Fracasso do CEP abre guerra entre patrões

A tão desejada unificação do associativismo português foi "sol de pouca dura". A cúpula patronal, criada há um ano, não funciona. Face ao fracasso do CEP, Ludgero Marques revela ao PÚBLICO ter apresentado uma proposta à Confederação da Indústria Portuguesa (CIP) e à Associação Industrial Portuguesa (AIP) para constituírem, as três, um movimento associativo único e concertado. Algo difícil, dadas as críticas e acusações lançadas pelo presidente da Associação Empresarial de Portugal (AEP) aos líderes associativos Rocha de Matos e Francisco van Zeller. E se o entendimento entre as três instituições tardar, Ludgero Marques deixa claro que avança sozinho, porque, sublinha, "a AEP não alinha com conluios mascarados" e "não vai estar preocupada com o 'show-off'".

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

A tão desejada unificação do associativismo português foi "sol de pouca dura". A cúpula patronal, criada há um ano, não funciona. Face ao fracasso do CEP, Ludgero Marques revela ao PÚBLICO ter apresentado uma proposta à Confederação da Indústria Portuguesa (CIP) e à Associação Industrial Portuguesa (AIP) para constituírem, as três, um movimento associativo único e concertado. Algo difícil, dadas as críticas e acusações lançadas pelo presidente da Associação Empresarial de Portugal (AEP) aos líderes associativos Rocha de Matos e Francisco van Zeller. E se o entendimento entre as três instituições tardar, Ludgero Marques deixa claro que avança sozinho, porque, sublinha, "a AEP não alinha com conluios mascarados" e "não vai estar preocupada com o 'show-off'".

PÚBLICO -

Fez na semana passada (quarta-feira) um ano que o Conselho Empresarial de Portugal (CEP), a suposta cúpula patronal, foi criado. Afinal, o que foi feito do CEP?

LUDGERO MARQUES -

Fui eu que tomei a iniciativa, só que quando um nortenho ou uma associação do Norte toma uma iniciativa deste género muitas vezes não é aceite por instituições que estão em Lisboa. Apesar de termos todos concordado em constituir um conselho empresarial, o certo é que as associações [promotoras] não pretendiam que este CEP tivesse força e autonomia.

Como assim?

A outra associação [a Associação Industrial Portuguesa (AIP)] e as confederações [Confederação da Indústria Portuguesa (CIP), Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), Confederação da Agricultura de Portugal (CAP) e Confederação do Turismo Português (CTP), que aderiu mais tarde] queriam que o [CEP] tivesse uma presidência rotativa [entre elas] e que não tivesse orçamento. Mas não resultou, porque se fosse como eles queriam já estava.


O que estava previsto, e foi publicamente apresentado, é que o presidente seria um conceituado empresário que não tivesses ligações ao movimento associativo. Ou não?

O CEP tinha que ser uma instituição constituída por membros do actual associativismo e por membros tradicionalmente de fora desse movimento no sentido de congregarmos, definitivamente, todos os empresários nas associações, para evitar, assim, aqueles empresários dos movimentos [referindo-se ao denominado "Grupo dos 22"].


Mas, e o presidente do CEP...

Ficou combinado que teria que ter um presidente que vinha de fora do tradicional movimento associativo. Teria que ser uma figura de grande representatividade empresarial. Essa foi a minha proposta e, de princípio, foi aceite. Depois, quando começou a ser discutida acabou por cair.


Porquê?

Por outras razões, que um dia vamos saber, as associações e confederações acabaram por sair. Como esta primeira fase falhou, apresentei novas soluções.


Quais?

A última proposta que apresentei prevê que a AEP e AIP, juntamente com a CIP, formassem o tal conselho.


Sem a CCP? Sem a CTP?

Sem o Comércio nem nada. Só os três. A minha posição é muito clara e muito franca. Defendo uma confederação ou um conselho que tenha receitas próprias e que tenha uma capacidade económica suficiente para sustentar uma cúpula.


Há quanto tempo fez essa proposta?

Fiz essa proposta à AIP e à CIP numa altura difícil, dada a debilidade física do anterior presidente da CIP [Nogueira Simões, já falecido]. Depois, voltei a apresentar a proposta e fiz algumas reuniões com os presidentes da CIP e AIP para fazer essa cúpula a três.


Porquê apenas entre os três?

Se mais tarde quiserem, as outras podem entrar. Agora não podem é prejudicar a elaboração do estatuto inicial.


E não poderão ajudar?

Não. Não podem ajudar porque quando foram convidadas a ajudar não o fizeram. Não têm condições e não querem este estatuto. E, depois, a AEP e a AIP têm a representatividade de todas as empresas e a CIP, no seu próprio estatuto, é também uma confederação que engloba os serviços, o comércio e turismo.


Qual foi a receptividade da CIP e da AIP a essa proposta?

R.- A princípio a receptividade foi muito boa. Julgo que, agora, ter* esmorecido alguma coisa, desconhecendo eu as razões... Mas, o certo é que a AEP mantém esta posição de fazer, rapidamente, um organismo de cúpula baseado nestas três associações, deixando sempre a porta aberta para as outras confederações entrarem se assim o quiserem.


Portanto, está tudo na mesma. O CEP não existe e o movimento associativo continua a falar a várias vozes.

Isto está a demorar muito tempo. Não consigo entender por que é que não é possível resolver isto rapidamente. A AEP está a ser prejudicada com este compasso de espera, o que poderá ser prejudicial para nós no que diz respeito à defesa de uma economia, que é a do Norte. Se não for possível encontrar uma entidade única, a AEP avança sozinha com os seus esquemas e posições para defender a economia.


Como tem feito até agora?

Sim, mas de uma forma muito mais evidente e muito mais forte. O facto de a AEP ser a associação mais importante do país, sediada fora de Lisboa, incomoda de facto algumas outras associações. Se não for possível criar esta cúpula a três iremos tirar daqui as ilações. Mas não iremos perder muito tempo a tirar as ilações.


É ou não verdade que o relacionamento entre a AEP e a CIP está cada vez mais complicado, ao contrário do relacionamento entre a CIP e a AIP?

Está a dizer muito bem. De facto, é absolutamente inadmissível para nós que as associações possam, mais uma vez, fazer alguma traição, como foi feito no passado. Se assim acontecer a AEP tomará posições sem qualquer hesitação.


Tais como?

A afirmação de uma associação que não alinha com conluios mascarados. A AEP assume a responsabilidade de associação forte e não vai deixar de lado o facto de ter sido líder associativa em acções e iniciativas e que agora os outros venham com a cópia de coisas que foram lançadas por nós.


Está a referir-se, concretamente, à AIP?

A AEP tem iniciativa, a qual é demonstrada também pelo sistema organizativo que foi e ainda é uma novidade para o associativismo e que agora foi copiado por outras associações, nomeadamente a Portuguesa [AIP]. Mas estamos a estabelecer protocolos com a AIP.


Protocolos? Acha isso conciliável dado o desentendimento evidente entre a AEP e AIP?

São interesses comuns. Nada disto tem a ver com compromissos assumidos que vamos respeitar e levar até ao fim. É necessário que o movimento fale a uma única voz.


Mas como? Voltamos ao velho argumento de que orgulhos e protagonismos travam a constituição da tal cúpula?

Não sei se é por questões de protagonismo. Eu não quero ser líder de uma confederação ou de um conselho.


Mas o facto de, como explicou, as outras estruturas defenderem uma presidência rotativa entre elas prova precisamente isso, ou não?

A minha proposta era um presidente vindo de fora porque isso é que iria dar independência ao movimento associativo. Porque isso levaria ao desprendimento das pessoas ao cargo. Não consigo perceber.


Não acha que se precipitaram ao pretenderem responder ao "Grupo dos 22"?

Não. Nessa altura estava tudo assente. Aquando da conferência de apresentação [do CEP] estava tudo entendido. Se assim não aconteceu foi porque as pessoas começaram a pensar que afinal aquilo era a sério.


Como?

O que aconteceu é que eles não entenderam que aquilo era a sério e, a partir dessa altura, começaram a sentir um certo desconforto. O projecto está feito e não avança porque eles não querem.


Da maneira como põe as coisas, é correcto dizer, então, que não há qualquer perspectiva de entendimento.

Julgo que não. Podem arranjar outro CEP, mas proponham, desde que não ponham um fantoche.


Com os anos que já leva de associativismo continua a acreditar que a criação de uma cúpula não é um projecto utópico?

Sou um lutador e se ainda cá estou é porque pensei que conseguiria. Agora, fiquei com algumas dúvidas depois das eleições na AIP.


Porquê?

... (Silêncio)


Não querendo falar da AIP, é ou não verdade que a relações entre a AEP e a CIP já tiveram melhores dias? Que esse relacionamento está longe de ser o que era na altura da presidência de Nogueira Simões?

Não, hoje não é.


Porquê?

Porque tenho razões para ter perdido a confiança na CIP, para a qual lutei muito.


Quais?

Tenho razões para ter diminuído a minha confiança na CIP. Tenho razões para notar uma diferença de tratamento.


Em relação à AEP...

...(Silêncio) A AEP vai passar a ser a grande associação empresarial fora de Lisboa. Vai ser o maior poder associativo português.


Vai seguir, então, o seu caminho.

Segue e, com certeza, vai ser um caminho reforçado. Não vai estar preocupada com o "show-off".