Como o Presidente de Angola tentou extinguir a UNITA e exilar Savimbi

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José Eduardo dos Santos pediu apoio a dirigentes africanos amigos do fundador do "Galo Negro" para afastar este da cena política AP

Como indica uma conversa que manteve no Kremlin, em 28 de Outubro de 1988, com Mikhail Gorbatchov, então secretário-geral do Partido Comunista da URSS, José Eduardo dos Santos apostava na extinção da UNITA, muito antes de se colocar a hipótese de eleições em Angola. Nesse encontro, Gorbatchov aconselhou cautela a Eduardo dos Santos, na sua intenção de afastar o líder da UNITA. Mais do que os apoios no continente africano de que beneficiava Savimbi, o Presidente da União Soviética estava preocupado com a influência que, através da UNITA, poderiam ter os Estados Unidos e o regime sul-africano do 'apartheid', não só em Angola mas em toda a sub-região do continente africano.

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Como indica uma conversa que manteve no Kremlin, em 28 de Outubro de 1988, com Mikhail Gorbatchov, então secretário-geral do Partido Comunista da URSS, José Eduardo dos Santos apostava na extinção da UNITA, muito antes de se colocar a hipótese de eleições em Angola. Nesse encontro, Gorbatchov aconselhou cautela a Eduardo dos Santos, na sua intenção de afastar o líder da UNITA. Mais do que os apoios no continente africano de que beneficiava Savimbi, o Presidente da União Soviética estava preocupado com a influência que, através da UNITA, poderiam ter os Estados Unidos e o regime sul-africano do 'apartheid', não só em Angola mas em toda a sub-região do continente africano.

Na altura, o processo em curso para uma solução angolana passava por uma resolução da situação da Namíbia, ocupada pelas forças sul-africanas. No quadro da aliança Washington-Pretória, a partir da chegada ao poder de Ronald Reagan, em 1981, as forças sul-africanas tinham, nesse mesmo ano, invadido o sul de Angola, com o objectivo de impedir a independência da Namíbia e de apoiar a UNITA em Angola. Como ainda se estava no período da guerra fria entre os EUA e a URSS, o dirigente soviético tinha uma palavra decisiva nesse processo.

"Temos a sensação intuitiva de que os EUA irão travar os processos positivos em torno de Angola e da Namíbia com a ajuda da UNITA", declarou Gorbatchov a Eduardo dos Santos no encontro de ambos. E acrescentou: "Os Estados Unidos, por intermédio da UNITA, querem conservar alguma influência em Angola. Serve-lhes a 'variante afegã' de reconciliação. Por isso, deveis actuar de forma muito flexível".

"Por outro lado", continuou o dirigente soviético, "não se podem afastar das posições de princípio, porque Angola pode perder tudo. Você tem possibilidade de levar as coisas até ao fim em conformidade com os vossos interesses. Chegou a hora de agir, o importante é não deixar escapar o momento".

O amigo americano...

O encontro de 1988 entre Gorbatchov e Eduardo dos Santos aconteceu ainda durante a administração Reagan, nos Estados Unidos, marcada pelo apoio declarado norte-americano à UNITA. Em 1986, a visita de Jonas Savimbi a Washington tornava definitivamente oficial a ajuda militar norte-americana à UNITA. A predisposição dos republicanos em ajudar Savimbi tinha ficado já evidenciada, em 1985, com a revogação pelo Congresso norte-mericano da emenda Clark, que até então e desde 1976, proibia o fornecimento de ajuda militar a "forças anti-comunistas em Angola".


Ao mesmo tempo, o Presidente angolano, nas suas visitas oficiais a Moscovo, de 1986, continuava a ver garantido o apoio militar soviético.

Ambas as partes no conflito angolano tentavam ganhar vantagens no terreno, na eventualidade de negociaçõesMas até esse momento, só se tinham iniciado negociações para uma solução regional, deixando de fora a UNITA, num processo que culminou com o acordo de Nova Iorque, em Dezembro de 1988, entre Angola, Cuba, Estados Unidos e a África do Sul. O acordo previa a retirada das tropas sul-africanas da Namíbia, em troca da saída das forças cubanas de Angola e lançava as bases para a independência da Namíbia, em 1990. Mas ao contrário do que se pensava, não viria a ser decisivo para a resolução do conflito angolano. Jonas Savimbi tinha ficado excluído das negociações mas continuava a beneficiar do apoio dos Estados Unidos e da África do Sul.

A administração norte-americana, pela voz de Colin Powell, então conselheiro para a Segurança Nacional, fez na altura questão de esclarecer que o acordo de Nova Iorque "não foi e não será moeda de troca" em relação ao apoio dos Estados Unidos à UNITA, segundo refere o jornalista João Paulo Guerra, no seu livro "Savimbi, Vida e Morte".

... e o amigo marroquino

Foi pois num contexto em que os americanos continuavam a reconhecer o papel de Jonas Savimbi na busca de uma solução para o conflito e numa altura em que o MPLA se preparava para prescindir da presença de mais de 30 mil tropas cubanas em território angolano, que José Eduardo dos Santos deu a conhecer a Gorbatchov a intenção de ver o líder da UNITA fora da cena política.


Para isso, o Presidente angolano contava com a influência que poderiam exercer sobre Savimbi os líderes africanos amigos da UNITA. No seu encontro no Kremlin, em Outubro de 1988, o Presidente angolano comunicou a Gorbatchov que pretendia ir a Marrocos para se encontrar com o rei Hassan II a fim de "ter uma conversa sobre a UNITA".

O dirigente soviético questionou: "Como surgiu a ideia? Os EUA não participam nisso? Que papel quer Marrocos desempenhar?" Ao que José Eduardo dos Santos respondeu: "Em Março do ano corrente, esteve em Marrocos um representante nosso. Tentámos exercer pressão sobre os EUA para que deixassem de prestar ajuda à UNITA. Ao mesmo tempo, colocámos a questão da extradição de Savimbi. O rei Hassan II não recusou o nosso plano. E, agora, propôs que lhe fosse enviado um alto representante oficial angolano, na presença do qual tenciona propor a Savimbi que abandone o palco político".

À pergunta de Mikhail Gorbatchov: "Como é que o rei tem essa influência em Savimbi?", José Eduardo dos Santos respondeu: "Há muito tempo que os marroquinos preparavam quadros militares para a UNITA, forneciam armas até à recente normalização das relações angolano-marroquinas. O próprio Savimbi viveu muito tempo em Marrocos".

"O rei Hassan II comunicou que entrou em contacto com Savimbi e este respondera estar disposto a afastar-se se isso contribuísse para a solução positiva do problema", acrescentou o dirigente angolano.

"Significa que Savimbi deve afastar-se e a sua corte deve integrar-se no processo político e sistema estatal?" tentou precisar Mikhail Gorbatchov.

"Sim, mas não como militantes da UNITA, sim como particulares. Alguns farão parte do governo", esclareceu Eduardo dos Santos, recebendo o apoio do dirigente soviético: "Penso que uma ou duas pessoas que fizerem parte do governo não constituirão uma ameaça. E depois o tempo colocará tudo no seu lugar".