Nigéria luta contra violência religiosa à saída das concorrentes a Miss Mundo
As candidatas pareciam aliviadas ao embarcar, esta manhã, para Londres, cidade que vai acolher o concurso no dia 7, depois de ontem a organização ter concluído que não existiam condições para realizar o espetáculo perante a contestação dos muçulmanos no norte do país.
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As candidatas pareciam aliviadas ao embarcar, esta manhã, para Londres, cidade que vai acolher o concurso no dia 7, depois de ontem a organização ter concluído que não existiam condições para realizar o espetáculo perante a contestação dos muçulmanos no norte do país.
A cidade de Kaduna, já palco de confrontos religiosos anteriores, tornou-se numa zona de guerra em que pelo menos 105 mortes foram confirmadas pela Cruz Vermelha. A AFP cita um balanço provisório que dá conta de mais de 200 mortos e cerca de 600 feridos.
As modelos partiram mas os confrontos em Kaduna continuaram. Foi imposto o recolher obrigatório após três dias de violência ininterrupta, tendo cerca de quatro mil pessoas fugido de suas casas, visto que a violência se estendeu ontem também à capital, Abuja.
"O que aconteceu é um pedaço de vergonha, porque a imprensa internacional sublinhou a pequena incidência de alguns motins de forma totalmente desproporcional”, queixou-se o director do concurso na Nigéria, Guy Murray-Bruce à BBC Radio.
Na quarta-feira, centenas de jovens islâmicos voltaram a manifestar-se contra a eleição da Miss Mundo. Embora todas as actividades relacionadas com o concurso, patrocinado por Stella Obasanjo, a mulher do presidente nigeriano, Olusegun Obasanjo, estivessem previstas apenas para Abuja, a mais de 150 quilómetros de Kaduna, a comunidade muçulmana, maioritária no Norte do país, considerou "ofensivo e imoral" que várias mulheres se exibam em fato de banho.
No mesmo dia, o escritório do jornal "This Day" foi incendiado por centenas de fiéis, irados com a publicação de um artigo considerado "blasfematório". "Porque é que os muçulmanos nigerianos pensam que é imoral trazer ao país 92 mulheres que vão exibir a sua beleza? O que pensaria Maomé sobre o assunto? Provavelmente, teria escolhido uma esposa de entre estas mulheres", escreveu o jornal no sábado passado.
Apesar de os responsáveis do "This Day" terem emitido repetidos pedidos de desculpa, os líderes muçulmanos pediram às autoridades que encerrassem o jornal e que os seus directores fossem presos e julgados por "blasfémia e difamação" contra o profeta Maomé. Ontem, o diário relatava exactamente que o editor do jornal foi detido pela polícia secreta nigeriana. O "This Day" explica que o editor de serviço no sábado, Simon Kolawole, foi detido sexta-feira e não voltou a ser visto.
Há muito que a eleição da Miss Mundo está envolvida em polémica. Vários países, entre os quais Espanha, Costa Rica e Panamá, boicotaram o certame, em protesto pela condenação à morte, por lapidação, de Amina Lawal. À luz da lei islâmica Sharia, que vigora em vários estados do Norte da Nigéria, Amina Lawal cometeu um crime quando engravidou sem estar casada.A miss África do Sul, a luso-descendente Vanessa Carreira, recusou ir à Nigéria para participar no concurso devido à causa de Amina e também não irá a Londres. A portuguesa, de 22 anos, deveria participar no concurso mas considera que o evento nunca deveria ter sido agendado para a Nigéria, onde os combates entre muçulmanos e cristãos são frequentes.
A imprensa escreve que a portuguesa lembra que, se o concurso tivesse sido marcado para outro país, se poderia ter evitado a morte de dezenas de pessoas.