Paredes de Coura, quente e frio
O galego deixou de ser a língua-franca, e as 15 mil pessoas que ficaram para ver prestaram uma atenção intermitente ao alinhamento mais murcho das várias noites do programa. Sem nomes sonantes e sem grandes surpresas, o serão de anteontem passou quase sempre ao lado - os Breed 77 e os cabeças de cartaz Puddle of Mudd ainda tentaram reciclar a implosão "waiting to happen" dos Korn, mas nem sequer valia a pena. Até os "parabéns a você" do décimo aniversário passaram despercebidos.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
O galego deixou de ser a língua-franca, e as 15 mil pessoas que ficaram para ver prestaram uma atenção intermitente ao alinhamento mais murcho das várias noites do programa. Sem nomes sonantes e sem grandes surpresas, o serão de anteontem passou quase sempre ao lado - os Breed 77 e os cabeças de cartaz Puddle of Mudd ainda tentaram reciclar a implosão "waiting to happen" dos Korn, mas nem sequer valia a pena. Até os "parabéns a você" do décimo aniversário passaram despercebidos.
Numa noite para cumprir calendário - espécie de zona de ninguém entre o nu-metal abrasivo de Korn e Incubus e a elegância a meio caminho entre o tango e a electrónica dos Gotan Project -, o público aproveitou sobretudo para recarregar baterias. Até as bandas convidadas - excepção feita a Sam The Kid, o único com direito a "encore", e aos Breed 77, que se desfizeram em suor e elogios à plateia - pareciam pouco interessadas em prolongar por muito tempo a passagem pelo palco.
A assistência esteve sempre composta, mas reagiu com sangue frio ao pop sem consequências dos EZ Special. Em contagem decrescente para a edição do seu álbum de estreia, a banda de Santa Maria da Feira limitou-se a despachar em pouco mais de meia hora uma amostra do EP "Partizan Pop", deixando já algumas pistas em aberto para o longa-duração de estreia. Quem aproveitou para dar uma ajuda foi Saul Davies, o "faz-tudo" dos James que fixou residência em Portugal: qual artista convidado, Davies passarinhou pela zona VIP do recinto, agarrou no violino e juntou-se aos EZ Specials em "Beautiful Lies".
Entretanto, o hip hop portuga de Sam The Kid tomava conta do palco e acrescentava finalmente um pouco de adrenalina a uma noite quase em ponto morto. "Rappar" em português ainda pode soar a falso, mas Sam the Kid tem currículo para isso: nasceu em Chelas, tem uma consciência social menos maniqueísta do que é prática corrente entre a comunidade hip hop e já percebeu que o funk não é tudo na vida, dando-se ao luxo de "samplar" poemas de Almada Negreiros ditos por Mário Viegas. Em Paredes de Coura, Sam The Kid, aliás Samuel Mira, partilhou o microfone com outro MC e percorreu o alinhamento mais longo da noite numa actuação com sal, pimenta e bom "breakdance".
Mais metal do mesmo
Com a entrada em cena dos Breed 77, a noite mudou de figura e o público teve de recuar no tempo uns bons 20 anos: na era do nu-metal, a banda britânica prefere ignorar tudo o que é modernice e bater na tecla gasta do metal clássico. Em entrevista à SIC Radical, o vocalista Paul Isola - um caso patológico de diplomacia - prometeu "uma boa arma nuclear para Bin Laden". O prometido é devido: houve muito tronco nu, muito solo de guitarra, muita distorção, muita pedaleira dupla e até uma escala nos Queen de "We Will Rock You". Em resumo: nada de novo.
Mesmo assim, o público aproveitou a deixa para reciclar o "mosh" e o "stage diving" da véspera, dando algum trabalhinho extra aos seguranças de serviço, obrigados a amparar dezenas de voos picados. Não era para menos: Isola estava farto de engraxar a plateia com tiradas de duvidosa verosimilhança como "este é o melhor dia da minha vida" ou "esta é para a nossa família em Portugal - vocês todos!", e chegara a hora de retribuir. "Agora quero ver pessoas a voar, corpos a flutuar e esse 'mosh pit' ao rubro", insinuou. O público fez-lhe o jeito.
À uma em ponto, e já depois do fracassado "parabéns a você", uns Puddle of Mudd a meio gás operavam novo regresso ao passado. Das duas uma: ou o grunge é como o Elvis Presley e não morreu, ou os Puddle of Mudd passam sempre à frente as páginas da necrologia. O certo é que não há no hard rock do álbum "Come Clean" matéria-prima para um concerto de excepção; ainda por cima, o som não soprava a favor e a voz de Wesley Scantlin ficou soterrada no microfone ao longo dos primeiros minutos. Morno, o alinhamento dos Puddle of Mudd - uma banda que deve muito ao padrinho Fred Durst, líder dos Limp Bizkit e "opinion maker" seguido à letra pela geração Y - serviu apenas para preencher uma alínea do alinhamento e para prestar uma homenagem póstuma a Dave Williams (o vocalista dos Drowning Pool anteontem encontrado sem vida na carrinha da banda). Os Puddle of Mudd dedicaram-lhe "Drift and Die", encerraram o concerto com "Control" e não voltaram sequer para o "encore" da praxe. O público suspirou de alívio e foi abastecer à tenda "after-hours".