Lenny Kravitz, mais do que uma questão de cabelo

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O rock de Lenny Kravitz passa sábado por Portugal DR

Ponto número um: o concerto que reunirá amanhã, em pleno Estádio do Restelo, Lenny Kravitz, Macy Gray e uma horda de admiradores de um e do outro, é um oásis no deserto de ideias que a partir de determinado momento passou a orientar a organização dos grandes espectáculos de música em Portugal. É sabido que os artistas de topo que ainda não nos visitaram contam-se pelos dedos das mãos, mas num país educado a comprazer-se na lógica do "mais do mesmo" não é todos os dias que se comete a proeza de juntar de uma assentada "dois em um", isto é, dois estreantes de vulto numa "soirée" que só por isso reúne todas as condições para ser um triunfo.

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Ponto número um: o concerto que reunirá amanhã, em pleno Estádio do Restelo, Lenny Kravitz, Macy Gray e uma horda de admiradores de um e do outro, é um oásis no deserto de ideias que a partir de determinado momento passou a orientar a organização dos grandes espectáculos de música em Portugal. É sabido que os artistas de topo que ainda não nos visitaram contam-se pelos dedos das mãos, mas num país educado a comprazer-se na lógica do "mais do mesmo" não é todos os dias que se comete a proeza de juntar de uma assentada "dois em um", isto é, dois estreantes de vulto numa "soirée" que só por isso reúne todas as condições para ser um triunfo.

Por outro lado, e mesmo que o alinhamento do concerto seja fruto de um golpe de sorte ditado pelos trâmites das grandes digressões internacionais, este é ao mesmo tempo um dos cartazes mais homogéneos que aterraram nos últimos anos entre nós. Porquê? Porque contas feitas, e orientações musicais à parte, entre Lenny Kravitz e Macy Gray são mais as semelhanças do que as diferenças. Ambos são negros, mostram uma devoção à prova de bala pela grande música dos anos 70, têm álbuns novos para apresentar e são donos de excêntricas cabeleiras capazes de desafiar as mais elementares leis da gravidade.

O que os distingue não é tanto aquilo que fazem – é, acima de tudo, como o fazem, isto é, o posicionamento que um e o outro adoptaram face à música em geral e aos respectivos modelos inspiradores do passado em particular: ele, Lenny, é o "rocker" por excelência, mestre na arte de recriar os sons e os sinais do passado, mas incapaz – veja-se Ben Harper, por exemplo – de desbravar um caminho próprio no interior desse movimento totalitário de revivalismo e contemplação; ela, Macy, macia como a sua voz de filigrana que desfia como poucas as subtilezas da música soul, procura a cada momento as marcas da sua própria autenticidade, nem que seja à custa de uma atitude muitas vezes tão "clownesca" e extravagante como o são os delirantes penteados da cantora.

Os últimos álbuns de um e do outro, que deverão constituir a fatia de leão do concerto de amanhã, são exemplos acabados disso mesmo. "Lenny" é como o último sopro de um arqueólogo que escavou tão fundo nas profundezas do passado que já não consegue sair do buraco, um álbum onde abundam as citações a Lennon, a Hendrix, a Sly Stone e a Curtis Mayfield e em que a marca singular da originalidade é esmagada pelo prazer hedonista da fruição pela fruição. Já "The Id", segunda viagem discográfica de Gray rumo ao coração da novíssima geração pós-hip-hop, administra-nos uma dieta tão rigorosa como inventiva de soul clássica, r&b, funk e rock, colocando em definitivo Macy no mesmo espectro onde habitam Erykah Badu, Kelis, Lauryn Hill ou Jill Scott. Por tudo isto, escolha você mesmo – a oportunidade é de ouro.