Pílula contraceptiva nasceu há 50 anos
O objectivo daqueles cientistas era produzir mais medicamentos de uma nova classe terapêutica, os chamados esteróides. Talvez um produto para tratar dores menstruais ou problemas de infertilidade. Não um comprimido que impedisse a ovulação feminina e, desta forma, actuasse como um contraceptivo. Mas foi assim que a molécula isolada pela equipa de Carl Djerassi e Russel Marker foi comercializada, nove anos mais tarde.
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O objectivo daqueles cientistas era produzir mais medicamentos de uma nova classe terapêutica, os chamados esteróides. Talvez um produto para tratar dores menstruais ou problemas de infertilidade. Não um comprimido que impedisse a ovulação feminina e, desta forma, actuasse como um contraceptivo. Mas foi assim que a molécula isolada pela equipa de Carl Djerassi e Russel Marker foi comercializada, nove anos mais tarde.
Ou seja, a pílula nasceu por mero acaso - e a sua paternidade é um bocado confusa: foi uma outra equipa, liderada pelo endocrinologista Gregory Pincus, que demonstrou as possibilidades da molécula noretindrona10. Pincus era apoiado financeiramente por duas norte-americanas que se destacaram na defesa do planeamento familiar, Margaret Sanger e Katharine McCormick, e estava à procura do "preservativo perfeito". Independentemente, um outro cientista - Frank Colton -chegou aos mesmos resultados naquela altura.
Meio século passado sobre a invenção do comprimido que permite às mulheres controlar a sua fertilidade, o mercado de contraceptivos vale, a nível mundial, quase 3000 milhões de dólares anuais (3300 milhões de euros). Embora as doses das hormonas sintéticas sejam cada vez menores, este medicamento, que hoje é tomado por mais de 80 milhões de mulheres, continua praticamente inalterado. Não há grandes alternativas em termos de contraceptivos.
Alguns cientistas tentam criar um contraceptivo masculino. As mais recentes abordagens passam pela interferência na mobilidade dos espermatozóides, em vez de tratamentos hormonais, que têm maiores efeitos secundários. Ainda esta semana, um artigo publicado na revista "Nature" dava conta da descoberta de uma proteína essencial para que a cauda do espermatozóide o faça correr.
Há também quem pense desenvolver vacinas contraceptivas, actuando sobre genes e proteínas essenciais para o normal funcionamento dos ovócitos e dos espermatozóides. Só que esta abordagem, muito provavelmente, teria efeitos permanentes sobre a fertilidade , o que tornaria estes contraceptivos bastante menos aceitáveis.
Aliás, como é um medicamento tomado por pessoas saudáveis, menos tolerantes em relação aos efeitos secundários que indivíduos doentes, este mercado torna-se cada vez menos apelativo para as grandes empresas - em 1969, existiam 13 grandes farmacêuticas a fazer investigação sobre contraceptivos. Presentemente, apenas uma das maiores empresas o faz, sublinha a revista "The Economist" desta semana.
Isto apesar da falta de contraceptivos nos países mais pobres estar a tornar-se um problema cada vez maior: 350 milhões de casais não têm acesso a eles, por falta de dinheiro para os distribuir. Em 2015, essa falta de financiamento para distribuir os contraceptivos e fazer campanhas de planeamento familiar pode atingir os 100 milhões de dólares (110 milhões de euros), diz o Fundo para a População das Nações Unidas.
Ainda por cima, a situação tem tendência a piorar, diz Carl Djerassi, que nos últimos anos tem escrito vários livros de reflexão sobre a ciência e a sociedade: os países mais ricos estão cada vez mais velhos, e cada vez mais concentrados em procurar medicamentos para as doenças da velhice, e não em novos tratamentos para problemas das nações pobres dos pobres, como as doenças infecciosas, a sobrepopulação ou a saúde materno-infantil.