Patriotismo? Tenham vergonha
Por favor, alguém informe os nacionalistas progressistas e os campeões do patriotismo da figura ridícula que estão a fazer.
Já ouvem ao longe as trombetas? Neste momento, a luta contra as sanções não é apenas um combate político – é um desígnio patriótico ao nível do ultimato inglês de 1890. É a dignidade de Portugal que está em causa! É a obrigação de reagirmos à chantagem europeia! É a necessidade de defendermos a alma lusitana e o espírito de Viriato! Vocês lembram-se do tempo em que o nacionalismo era coisa salazarenta e o patriotismo uma bandeira poeirenta do CDS? Esqueçam. O patriotismo está super-fashion e há um novo nacionalismo 2.0. O PCP, o Bloco de Esquerda e o próprio PS estão embriagados de nacional-patriotismo, e não é por causa do Europeu de futebol: é porque os alemães – ou melhor: os boches – querem impor a todo o custo a ditadura da austeridade. Em 1890 cantava-se pelas ruas “contra os bretões, marchar, marchar”. Com o advento da República passou a cantar-se “contra os canhões, marchar, marchar”. Chegou a hora de uma nova e imprescindível actualização: “contra os teutões, marchar, marchar”.
O secretário-geral do PCP pede ao Governo “brio patriótico” para informar Wolfgang Schäuble que “no seu país manda ele, mas aqui mandam os portugueses”. O Bloco garante que se as sanções forem para a frente ele lança contra a Europa a sua mais recente canhoneira: o referendo-a-não-se-sabe-bem-o-quê. Já no final do ano passado, o Bloco discutia num dos seus fóruns a candente questão: “A esquerda deve ser patriótica?” Luís Fazenda mostrava o caminho: “Há um nacionalismo progressivo e um nacionalismo reaccionário. Nós somos do campo do nacionalismo progressista.” Viva, pois, o nacionalismo progressista, que o PS tem vindo a adoptar com entusiasmo crescente, cumprindo mais uma das suas promessas eleitorais: ser, nas palavras de António Costa, “o campeão do patriotismo na Europa”.
A coisa funciona assim: quanto mais a Europa se desconvence da sanidade mental dos planos económicos de Mário Centeno, mais o fervor patriótico toma conta do Partido Socialista. Por cada mapa Excel que se afunda há uma bandeira verde-rubra que se ergue. Pelas ruas, estão plantados cartazes onde os socialistas prometem “defender Portugal na Europa” e a destacada Ana Catarina Mendes elogia a “voz grossa” do Governo e do PS. Os agudos de Pedro Passos Coelho foram substituídos pelos baixos profundos de António Costa.
Por favor, alguém informe os nacionalistas progressistas e os campeões do patriotismo da figura ridícula que estão a fazer. Não por haver mal algum em defender os interesses de um país – acho óptimo –, mas porque o único interesse que a esquerda está a defender é a sua sobrevivência política. Isto não é um patriotismo corajoso, de faca nos dentes. Isto é apenas um patriotismo dependente, de chucha na boca.
Eis a dura verdade: esta esquerda não tem qualquer projecto político plausível para o país que tanto diz amar. Aquilo a que chamam patriotismo é o eterno prolongamento do Portugal de mão estendida e incapaz de produzir o suficiente para sustentar o seu nível de vida. Patriotismo é tentar quebrar esse círculo vicioso. Patriotismo é trabalhar pelas reformas indispensáveis, é fazer sacrifícios por um país melhor, é lutar pela nossa independência financeira. Patriotismo não é berrar alto, a ver se nos voltam a encher a velha gamela. Dizem por aí que o bom aluno era demasiado subserviente. Já o aluno cábula, esse, é um grande patriota. Com uma mentalidade destas, só temos aquilo que muito patrioticamente merecemos.