Nas salas de aula e no mercado, emerge uma verdade desconfortável: muitos estudantes de marketing demonstram uma preocupante falta de capacidade crítica. Em paralelo, a ascensão da inteligência artificial (IA) exacerba essa deficiência, o que contribui para uma geração de profissionais excessivamente dependentes de máquinas e incapazes de questionar ou inovar.
O foco excessivo em ferramentas digitais, métricas e técnicas operacionais transformam os estudantes em operadores de sistemas, e não em estrategistas. Ao invés de incentivar o questionamento e o raciocínio independente, muitos cursos de marketing funcionam como linhas de montagem intelectuais: produzem profissionais que sabem operar plataformas de anúncios, mas não conseguem articular ideias próprias ou entender os contextos culturais e sociais que influenciam os consumidores. O resultado é uma avalanche de campanhas genéricas e estéreis, sem propósito ou impacto real. O mais alarmante é que esses estudantes/profissionais muitas vezes não percebem, sequer, a própria mediocridade.
A IA entra nesse cenário como um facilitador perigoso. Ferramentas como geradores de texto e plataformas de automação tornam as tarefas mais rápidas e eficientes, mas também promovem uma alienação intelectual. Em vez de usarem a IA como um recurso complementar, muitos estudantes (e até profissionais experientes) tratam a IA como um substituto para a criatividade e a estratégia, delegando às máquinas responsabilidades que eles próprios deveriam assumir.
O problema não é a IA em si, mas o uso acrítico dela. Quando os algoritmos fazem todo o trabalho pesado — desde a criação de estratégias até à execução de campanhas — os futuros profissionais de marketing privam-se da aprendizagem essencial que surge ao resolver problemas manualmente. Pior ainda, essa dependência cega gera uma falsa sensação de competência, mascarando a incapacidade de compreender as nuances por trás das decisões tomadas pelas máquinas. No entanto, muitos estudantes aceitam as soluções prontas que a IA oferece sem questionar a sua relevância ou impacto, tornando-se, na prática, marionetas tecnológicas.
A educação de marketing está a contribuir para uma indústria que privilegia o lucro acima de tudo, perpetuando práticas questionáveis e ignorando as implicações sociais das suas acções. Como esperar que um estudante que nunca foi incentivado a pensar criticamente se preocupe com as consequências éticas das suas escolhas profissionais?
É preciso ser directo: sem um resgate da capacidade crítica, os estudantes de marketing estão condenados à irrelevância. O mercado, embora hoje ainda tolere mediocridade, não pode sustentar profissionais que se limitam a seguir tendências ou a apertar botões. A criatividade humana, o raciocínio estratégico e a habilidade de questionar são insubstituíveis — e são esses atributos que distinguem um bom profissional num mercado saturado.
As instituições de ensino têm um papel fundamental nesse resgate. Os cursos de marketing devem sair da zona de conforto técnica e introduzir disciplinas que estimulem o pensamento crítico, a reflexão ética e o entendimento cultural. Discussões sobre os limites e as responsabilidades do marketing na era digital não podem ser opcionais, devem ser centrais.
O marketing é, ou deveria ser, uma disciplina que une arte, ciência e estratégia. Reduzi-lo a uma colecção de técnicas mecânicas e campanhas sem propósito é um insulto ao potencial humano. Os estudantes também precisam assumir a sua parte de culpa. A apatia intelectual e a aceitação de respostas fáceis não são apenas falhas no sistema educacional — são também falhas individuais. Aqueles que não se esforçam para pensar criticamente ou para desafiar a própria zona de conforto já escolheram a mediocridade como destino.