“Não pode ser hora de esquecer” direitos humanos. O “fora de jogo” de Marcelo no Mundial2022

Director da Amnistia Internacional Portugal, Pedro A. Neto, e o dirigente da associações Frente Cívica, João Paulo Batalha, criticam a desvalorização do assunto por Marcelo.

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Marcelo Rebelo de Sousa está a ser criticado por desvalorizar violação dos direitos humanos no Qatar LUSA/TIAGO PETINGA

O director da Amnistia Internacional Portugal, Pedro A. Neto, contrariou as declarações do Presidente da República quando este reconheceu que há violação de direitos humanos no Qatar mas desvalorizou, dizendo que agora é preciso "esquecer isso”.

“Ele [Marcelo Rebelo de Sousa] é uma pessoa que costuma estar muito atenta aos direitos fundamentais e humanos e creio que não pode ser hora de esquecer isso”, disse Pedro A. Neto, em declarações à SIC Notícias.

Também João Paulo Batalha, dirigente da associação Frente Cívica, criticou Marcelo Rebelo de Sousa pela “forma casual, como se estivesse a falar de um fora de jogo”, com que desvalorizou a violação dos direitos humanos no Qatar, país que acolhe o Mundial2022, considerando mesmo “chocante, repugnante” a actuação do chefe de Estado.

“A forma casual como o Presidente da República encolhe os ombros [perante] violações reiteradas de direitos humanos é chocante, repugnante. Mais uma vez, Marcelo Rebelo de Sousa, numa área de flash interviews, faz um papel de palhaço triste a limpar - como já tinha feito na pedofilia [na Igreja Católica] - abusos de direitos humanos, violações sistemáticas da dignidade humana e encolhe os ombros”, disse João Paulo Batalha à Rádio Observador.

Para João Paulo Batalha, esta atitude de Marcelo é “indigna e absolutamente vergonhosa” e reforça o apelo feito pela Frente Cívica para que o Presidente, o primeiro-ministro e o presidente da Assembleia da República não vão ao Qatar. “O que esperamos das três principais figuras do Estado é um mínimo de pudor e contenção”, acrescentou.

"Sacudir responsabilidades"

À Lusa, o director da Amnistia Internacional em Portugal Pedro A. Neto apontou ainda o dedo à FIFA e a organização do Mundial2022 de futebol, afirmando que estão “a sacudir-se de responsabilidades”. “Tanto a FIFA como a organização do Mundial2022 estão a sacudir-se de responsabilidades. Até vimos que o presidente da FIFA disse que a organização não se mete em política. Quer dizer, os direitos humanos não são política, são direitos fundamentais”, explica à Lusa o director-executivo da Amnistia em Portugal, Pedro A. Neto.

Dadas as violações de direitos humanos na preparação e construção de infra-estruturas e estádios no Qatar, documentadas e denunciadas há anos por esta e outras organizações, a Amnistia lembra o pedido de compensação, por parte do organismo de cúpula do futebol mundial e do Estado do Qatar, aos trabalhadores e às suas famílias, por acidentes e mortes nestes trabalhos.

Pedro A. Neto lembra ainda “todos os processos de pouca transparência e pouca corrupção com que se escolhem os campeonatos do Mundo”, mas compreende que a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) não se pronuncie, “porque se candidata” à organização do Mundial2030, com Espanha e Ucrânia.

“Não quererá fazer frente à FIFA. Os órgãos de soberania portugueses que tomem as suas posições e comuniquem os valores que defendemos, que são o respeito pelos direitos humanos. No Qatar, não eram respeitados antes do Mundial, na preparação foram muito ofendidos, e tudo leva a crer que também durante o Mundial haverá problemas, e também depois”, lembra.

Além dos trabalhadores migrantes, o alerta vale também para os direitos das mulheres e das comunidades LGBTQIA+, num país em que a homossexualidade é crime e, recentemente, um embaixador do torneio a denunciou como “um distúrbio mental”. “Infelizmente, a FIFA até enviou um e-mail a todas as selecções para abdicarem de tomar posições sobre direitos humanos, ou usar a braçadeira arco-íris, pela perseguição das pessoas LGBTQIA+. O que apelo é, talvez, à desobediência civil de atletas e treinadores, não usando coisas proibidas, mas quando falarem à imprensa”, alertando para a questão, acrescenta.

Pedro A. Neto lembrou as duras críticas do médio internacional Bruno Fernandes, membro da selecção portuguesa que na sexta-feira viaja para o Qatar para disputar o torneio. “Que representem Portugal não só na qualidade de jogo, assim espero como fã deste desporto tão bonito, mas também dos nossos valores, e é o que se espera também dos órgãos de soberania”, explica.