Morte de celebridade de um reality show japonês volta a chamar a atenção para o cyberbullying

A lutadora Hana Kimura foi encontrada morta em casa a 23 de Maio. O caso de levou os abusos online a debate público no Japão.

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A lutadora começou a receber comentários abusivos depois de um desentendimento com outra participante da série Reuters/Nikkan Sports
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Horas antes da sua morte, Kimura pediu desculpa no Twitter Reuters/Nikkan Sports

A recente morte de Hana Kimura, uma lutadora japonesa de 22 anos, estrela do reality show Terrace House, revelou o aumento do cyberbullying no Japão e levou que as autoridades prometessem mais protecção para as vítimas. Kimura, membro do elenco do famoso programa que está no canal de streaming Netflix, foi encontrada morta em casa a 23 de Maio, depois de ter as suas redes sociais inundadas de comentários negativos.

Consciente do debate público causado pela morte da lutadora, o partido com maior peso no Japão vai dar início a audiências, já esta semana, para encontrar soluções legais que protejam as vítimas de cyberbullying. “As pessoas precisam de perceber onde está a fronteira entre a crítica construtiva e os abusos”, considera Junko Mihara, membro do Partido Liberal Democrata, e líder da equipa de assédio virtual do partido, à Reuters.

A morte de Kimura abalou a sociedade japonesa numa altura em que muitos japoneses passam mais tempo online, devido às medidas de confinamento. Celebridades, políticos e empresas já entraram no debate. Num estudo da Ipsos de 2018, o Japão teve a classificação mais alta, entre 28 países, na categoria de insuficiência de medidas de prevenção de cyberbullying mas teve das classificações mais baixas na consciencialização pública sobre abusos online. Dados do Governo mostram que o número de casos de bullying virtual nas escolas mais do que duplicaram entre 2014 e 2018.

No entanto, o recurso à justiça pode transformar-se num longo processo e a lei nunca foi alterada desde a sua criação, em 2001, antes ainda de haver Twitter ou Facebook. “Na Internet, o equilíbrio entre liberdade de expressão e dignidade é completamente distorcido, sem nenhuma protecção para assegurar a dignidade pessoal”, considera Daisuke Tsuda, autor de vários livros sobre os média online.

Kimura, de origem japonesa e indonésia, era membro do elenco da última temporada de Terrace House, um reality show produzido pela rede de televisão japonesa Fuji Television, que juntava seis jovens numa casa e deixava os espectadores assistir às suas interacções diárias. Ao contrário do Big Brother, não há um objectivo final ou um grande prémio, e a série ficou conhecida pelas histórias mais leves e menos dramáticas. Mas alguns críticos diziam que tinha um lado mais escuro, particularmente através dos comentadores que faziam comentários maldosos sobre os participantes.

Kimura, que foi apresentada como uma brincalhona, atraiu uma maior atenção negativa online depois de repreender uma das participantes por lhe ter destruído um dos seus fatos de wrestling. Kimura também foi atacada pela sua aparência, com muitas publicações a chamar-lhe feia e algumas até “gorila”, uma aparente referência à sua herança indonésia.

A 23 de Maio, a lutadora escreveu no Twitter que estava magoada com as publicações que diziam para ela “morrer” e “desaparecer”. “Eu queria ser amada. Desculpem por ser fraca”, escreveu horas antes da sua morte. As autoridades ainda não anunciaram formalmente a causa, mas investigadores da polícia terão encontrado uma carta de despedida na sua casa.

"Rápido e devastador"

O presidente da Fuji TV, Ryunosuke Endo lamenta não ter dado a Kimura o apoio “delicado e constante” que ela precisava. A cadeia televisiva apagou diversos tweets ligados à última temporada, incluindo um que promovia o incidente do fato de wrestling, e cancelou o resto da temporada. Não planeando fazer outra série. A Netflix alargou as “sinceras condolências” à família de Kimura num tweet de dia 23 de Maio, e recusou fazer outros comentários. A temporada continua disponível na plataforma japonesa do serviço de streaming.

Em conjunto com os legisladores, os fornecedores de serviços de Internet também sentiram o estado de espírito associado à morte de Kimura. A Yahoo no Japão disse que ia partilhar a sua tecnologia com outras redes sociais para detectarem publicações abusivas, e introduzir uma comissão de revisão que inclua especialistas jurídicos, ainda este mês.

O Twitter manifestou a vontade de “tomar medidas o mais rápido possível” contra o abuso online, enquanto o Instagram incentivou os utilizadores a dar uso às ferramentas de denúncia e aos contactos de serviços de emergência.

Smiley Kikuchi, um humorista que há muito lida com abuso online devido ao falso rumor que o ligava a um caso de homicídio, diz que a Internet é mais rápida do que a lei. “As pessoas lidam com o abuso com que eu lidei durante 20 anos, em apenas seis meses. Isso é o quão rápidos e devastadores são os danos”, conclui.