Os reis das esplanadas
Sermos envergonhados por dá-cá-aquela-palha é uma coisa. Ser envergonhado por uma palhota é outra.
Das experiências mais traumatizantes que se podem ter na esplanada de um restaurante a pior é assistir a um português a encantar clientes estrangeiros aos gritos, tal é a vaidade que tem em falar estrangeiro tão bem.
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Das experiências mais traumatizantes que se podem ter na esplanada de um restaurante a pior é assistir a um português a encantar clientes estrangeiros aos gritos, tal é a vaidade que tem em falar estrangeiro tão bem.
Esta semana fomos submetidos a duas horas de inglês atroz declamado para o benefício de todos os presentes, incluindo generosamente as mesas mais afastadas, como a nossa.
Os clientes britânicos eram Sikhs com antepassados nascidos na região Punjab da Índia. A combinação das boas maneiras e da valentia dos Sikhs com os bons modos e a cobardia dos gentlemen ingleses garantiram uma perfeitamente elegante galhardia.
“You are Indian”, gritava o tuga, com a subtileza de Afonso de Albuquerque. Engoliu uma lasca de robalo escalado e continuou: “For chance don’t you know that it was a Portuguese queen, Catherine of Bragança, that offered all your country – all India, incluindo Bombaím – to your King Charles? Do you take tea? You like tea? In that case please reknow (reconheça?) that it was our Raínha Dona Catarina that put you all drinking tea. But, here in Portugal, we drink café: coffee. It is truth! Coffee is much better than tea. Tea is only for the people with problems of digestion”.
Senti um súbito desejo de morrer, solidário com a morte por tédio e estupidez dos dois cavalheiros Sikh do Reino Unido.
Sermos envergonhados por dá-cá-aquela-palha é uma coisa. Ser envergonhado por uma palhota é outra. A vergonha continua a ser um bem precioso.