Grécia paga ao FMI, mas ainda tem de reembolsar este ano 26 mil milhões
Num Eurogrupo sem acordo, Atenas e os parceiros coincidem na leitura de que a situação de liquidez está mais difícil. Só em Junho, Julho e Agosto, há 11.500 milhões para amortizar.
Ninguém quer perder a face. Mas depois de mais de uma reunião do Eurogrupo, que terminou nesta segunda-feira sem acordo, o problema que se continua a colocar em Atenas, nas próximas semanas e meses, é o da falta de liquidez nos cofres do Estado, como reconheceu o próprio ministro das Finanças, Yanis Varoufakis, quando já era certo que o pagamento ao FMI seria feito dentro do prazo.
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Ninguém quer perder a face. Mas depois de mais de uma reunião do Eurogrupo, que terminou nesta segunda-feira sem acordo, o problema que se continua a colocar em Atenas, nas próximas semanas e meses, é o da falta de liquidez nos cofres do Estado, como reconheceu o próprio ministro das Finanças, Yanis Varoufakis, quando já era certo que o pagamento ao FMI seria feito dentro do prazo.
Entre empréstimos ao Fundo, obrigações do tesouro e títulos de curto prazo, os vencimentos de dívida previstos até ao final do ano atingem os 26.250 milhões de euros (um terço do valor do empréstimo da troika a Portugal). O calendário é apertado e deixa o Governo de Alexis Tsipras sob forte pressão. Não é só este mês que o Governo helénico enfrenta picos de amortização de dívida exigentes. Em Junho, Julho e Agosto, o montante da dívida que vence é significativo e as datas de pagamento são muito próximas umas das outras. Só nesses três meses, são cerca de 11.500 milhões de euros.
Para já, Atenas tem de assegurar, já na sexta-feira, o reembolso de mais 1400 milhões de euros em títulos de dívida de curto prazo. E impõem-se, nas semanas seguintes, novas amortizações: quatro reembolsos ao FMI a 5, 12, 16 e 19 de Junho (num total de 1500 milhões de euros) e mais dois vencimentos de dívida de curto prazo em dois dias que coincidem com o reembolso ao Fundo (mais 5200 milhões de euros).
Para a gestão de tesouraria, este é um constrangimento acrescido numa altura em que o executivo de Alexis Tsipras ainda não selou um entendimento com os parceiros da zona euro. O Eurogrupo de terminou sem fumo branco. O ministro grego das Finanças já tinha preparado o terreno para um desfecho vazio, ao dizer que esperava apenas que ali fosse lançada a “pedra basilar” desse entendimento futuro.
No comunicado divulgado depois da reunião, os ministros das Finanças da moeda única admitem que vai ser preciso “mais tempo e mais esforços”. O Eurogrupo faz questão de sublinhar — leia-se saudar — o facto de o Governo grego ter remodelado a equipa que negoceia com o “grupo de Bruxelas”, entregando a coordenação a Euclid Tsakalotos, o número dois do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Numa crítica implícita a Varoufakis, os parceiros vincam que a recomposição “tornou possível acelerar [os trabalhos] e contribuiu para uma discussão mais aprofundada”.
Tanto Yanis Varoufakis como o presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, concordaram num ponto: é urgente resolver a situação de liquidez da Grécia. Mas para dar luz verde à entrega de uma tranche de 7200 milhões de euros do empréstimo da troika, o Eurogrupo exige que as negociações com o “grupo de Bruxelas” sejam conclusivas.
Antes do encontro do Eurogrupo, os receios de uma entrada em incumprimento voltavam a dominar a atenção dos mercados. Ao Financial Times, Andrea Montanino, antigo membro do conselho de administração do Fundo Monetário Internacional, colocava o ónus de uma eventual situação de incumprimento sobre o próprio Fundo: “Se a Grécia falhar, as pessoas vão começar a questionar se as políticas do FMI estão mesmo a funcionar. É absolutamente do interesse do FMI que isso não aconteça”.
Jörg Decressin, vice-director do departamento do FMI para a Europa, dizia, porém, que o Fundo estava em contacto com vários países satélites da Grécia para acompanhar os “planos de contingência” e as medidas a tomar, caso uma situação limite precipitasse o pior dos cenários. Segundo o The Wall Street Journal, em causa estão alguns países próximos da Grécia, onde os bancos helénicos estão presentes —Macedónia, Roménia, Albânia, Sérvia e Bulgária. Ainda de acordo com o jornal norte-americano, o FMI tem mantido contactos com os supervisores bancários destes países, para garantir que as subsidiárias das instituições financeiras gregas têm activos suficientes no banco central, para responder a uma situação de falta de liquidez, se a casa-mãe na Grécia deixar de assegurar financiamento.
Controlo das reservas
Segundo as previsões da Comissão Europeia, a despesa corrente mensal da Grécia deverá rondar os 7400 milhões de euros. No entanto, cálculos feitos pela banca, admitindo que Atenas concentrava os encargos no processamento de salários e benefícios sociais e atrasava alguns pagamentos, o esforço passava para 4600 milhões de euros em Maio.
Para evitar o esvaziamento dos cofres públicos, Atenas já tinha ordenado a transferência das reservas de tesouraria de todo o sector público — administração local e empresas públicas incluídas — para a conta do Governo no banco central do país. A ideia passou por centralizar as reservas, permitindo que o eventual excesso de liquidez de alguns serviços e organismos pudesse ser usado para as despesas correntes.
Além dos compromissos internos, nomeadamente com o processamento de salários e apoios sociais, os próximos meses são exigentes a nível externo. Como noutras situações em que Atenas e os parceiros dramatizaram o discurso nas vésperas de um reembolso de dívida ou de entrega de uma tranche, o pior cenário ficou para trás. O incumprimento foi evitado, mas o problema volta a colocar-se de novo em cima da mesa. Até Dezembro estão programados mais de 25 vencimentos de dívida. Há reembolsos agendados para todos os meses, com excepção de Novembro, o único mês em que a pressão alivia.
A Grécia tem uma dívida de 304.300 milhões de euros, acrescida de 27.900 milhões em juros. A maior fatia do capital em dívida refere-se aos montantes concedidos ao abrigo do programa externo do FMI e da União Europeia, num valor de 218.500 milhões de euros (equivalente a 72% do total). A este montante somam-se 66.200 milhões de euros em títulos de dívida pública (21,7%), mais 14.800 milhões (4,8%) em bilhetes do tesouro de curto prazo e 4800 milhões de euros em dívida detida por empresas públicas (1,6%). com Miguel Castro Mendes, em Bruxelas