PCP quer ouvir secretária de Estado da Ciência sobre as avaliações às unidades de investigação
Críticas têm vindo de diversas instituições devido aos cortes de financiamento que vão ter depois da avaliação.
Os deputados comunistas declaram terem-lhes chegado, “da parte de toda a comunidade científica, profundas preocupações quanto ao processo de avaliação e quanto às consequências que daqui decorrem – a redução drástica do financiamento, quer por via do impedimento de passagem à fase seguinte de avaliação quer por via da classificação”.
“Apenas 168 unidades (52%) passaram à segunda fase de avaliação, a que se somam 83 unidades (26%) que obtiveram a classificação de ‘Bom’, que se traduzirá num financiamento muito reduzido em relação ao anterior e 71 unidades (22%) foram já excluídas de qualquer financiamento”, lê-se ainda no texto que pede a presença urgente da responsável governamental na Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura.
Em 2013, um total de 322 unidades candidataram-se a fundos públicos, para um período de cinco anos, partir do início de 2015. Divulgados em finais de Junho pela FCT, entidade pública que subsidia a investigação científica, os resultados debaixo de críticas referem-se à primeira fase da avaliação das unidades (laboratórios) de investigação, incluindo laboratórios associados.
As 71 unidades científicas não vão receber qualquer financiamento tiveram uma nota inferior a “Bom”. As restantes – 251 – têm um financiamento base garantido, entre 5.000 e 400.000 euros anuais. Mas só as 168 passaram que à segunda fase da avaliação, que termina em Dezembro, poderão ter um financiamento estratégico suplementar, sem tecto máximo fixado, se tiveram classificação superior a “Bom”, ou seja, “Excepcional”, “Excelente” ou “Muito Bom”.
Os politécnicos e o desenvolvimento das regiões
Também o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP) considerou esta quinta-feira, em comunicado, que os resultados da avaliação às unidades de investigação “colocam em causa o futuro dos centros”, que defende ser indispensáveis para o trabalho científico, o ensino superior e o “desenvolvimento das regiões”.
A nota do CCISP, que se reuniu esta quinta-feira no Algarve, surge depois de diversas instituições terem contestado a avaliação, apontando irregularidades. As instituições podem contestar os resultados da primeira fase da avaliação, na audiência prévia, que termina esta sexta-feira. Algumas unidades lesadas, que prometeram recorrer à audiência prévia, têm criticado o processo de avaliação.
Também a reitora da Universidade de Évora, Ana Maria Costa Freitas, apontou “bastantes discrepâncias na avaliação”, dando como exemplo “painéis com critérios nitidamente diferentes” e “resultados díspares e afirmações que, em alguns casos, são quase ofensivas para a ciência em Portugal”. Seis centros de investigação ligados a esta universidade (entre os dez que lá existem que foram avaliados) não passaram à segunda fase da avaliação, o que, para a reitora, significa “perda de financiamento plurianual”.
E o coordenador do Centro de Linguística da Universidade do Porto, João Veloso, admitiu, em declarações à Lusa, que esta unidade corre o risco de encerrar por falta de financiamento, ao perder, a partir de Janeiro, os 50.000 euros anuais que recebia. É o único centro exclusivo do tema no Norte.
“Acho que não passa pela cabeça de ninguém imaginar uma universidade num país de primeiro mundo sem um departamento de matemática ou de física ou de química, assim como não deveria passar pela cabeça de ninguém a existência de uma universidade sem um departamento de linguística, que é a ciência que estuda a propriedade específica da espécie humana, que estuda a linguagem, que é o objecto mais presente em todas as interacções sociais que existem e que, no caso do CLUP, tem tido um trabalho fundamental no estudo da língua portuguesa”, considerou João Veloso, que é igualmente o presidente da Associação Portuguesa de Linguística.
João Veloso considera a avaliação atribuída “muito injusta, muito drástica e sobretudo muitíssimo mal fundamentada”, salientando que houve dois linguistas num painel de 16 elementos para avaliação da área de Humanidades.
Centros de investigação da Universidade de Coimbra manifestaram, igualmente, o receio do seu fim, com Constância Providência, coordenadora de uma das entidades lesadas, o Centro de Física, a evocar “argumentos errados” na avaliação.
"Profunda preocupação" dos químicos
A Sociedade Portuguesa de Química (SPQ) foi outra das vozes a pronunciarem-se: “É com profunda preocupação que a SPQ observa o resultado da primeira fase do processo de avaliação efectuado pela FCT aos centros de investigação de química do país. Em particular, assinala o facto de vários centros de química, de Norte a Sul de Portugal, não terem passado à segunda fase do processo de avaliação, o que na prática condena à sua provável extinção. Se considerarmos o conjunto dos centros de investigação cuja área dominante é a química, estes representam 50% do total dos centros desta área científica em Portugal.”
Por isso, a SPQ deixa um apelo à FCT: que “tenha capacidade de inverter este rumo, reconhecendo que o processo de avaliação efectuado apresenta falhas significativas e graves que urge rectificar de imediato”.
A FCT, que remeteu para sexta-feira um esclarecimento sobre o assunto, em comunicado, indicou à Lusa que está em “diálogo constante” com as entidades envolvidas no processo de avaliação, “no sentido de ajudar a definir um programa estratégico que seja adequado para poderem melhorar a sua classificação no futuro”.
O processo de avaliação já tinha sido criticado, em Março, pelo Conselho de Laboratórios Associados, que agrupa 26 laboratórios em todo o páis: criticava-se o facto de ter sido a Fundação Europeia para a Ciência a responsável pela selecção dos avaliadores (por solicitação da FCT), só que é “uma organização sem experiência na matéria, em graves dificuldades e em vias de extinção”.
Em resposta, o presidente da FCT, Miguel Seabra, disse, numa carta dirigida aos laboratórios, que a organização europeia, de “inquestionável reputação” para garantir “a necessária isenção e transparência no processo de avaliação” das unidades de investigação, estava em reestruturação, com vista à sua “especialização na organização e no apoio a exercícios internacionais de avaliação científica”.