A omissão “fatal” do Conselho de Estado
Não há discussões fatais, se forem civilizadas. Medidas fatais sim. E arriscamo-nos a elas.
Foram precisas mais de seis horas de reunião do Conselho de Estado para que, no final, um comunicado apelasse ao seguinte: “Face à seriedade das exigências que o país enfrenta, o Conselho de Estado exorta todas as forças políticas e sociais, no quadro da diversidade e pluralidade democráticas, a que preservem entre si as pontes de diálogo construtivo e a que empenhem os seus melhores esforços na obtenção de entendimentos quanto aos objectivos nacionais permanentes, factor decisivo da confiança e da esperança dos portugueses.”
Era para ficar escrito “entendimentos interpartidários e de concertação social” mas Seguro não quis. Porque, como o comunicado aliás torna óbvio, nem mesmo no Conselho de Estado é fácil arranjar consensos (esteve para não haver comunicado final, não fosse Alegre pôr água na – desta vez branda – fervura). A exortação, construída com o cuidado dos falsos consensos, é uma pregação no deserto. As “pontes de diálogo”, no Portugal político de hoje, são o que se sabe – e lamenta. Dar a isto força de apelo é entrar no território da quase caricatura.
Até porque um dos temas ali debatidos, e esse sim com algum “consenso”, foi o da mutualização da dívida, dividindo-se porém os conselheiros quanto a prazos. Vítor Bento, agora de malas feitas para o BES, opõe-se a que seja agora; Passos diz que há-de ser a União Europeia a tomar tal iniciativa, devendo Portugal ficar quieto de momento; e Ramalho Eanes veio fazer o pleno dos ex-Presidentes favoráveis à renegociação da dívida (ao lado de Sampaio, presente; e de Soares, ausente por razões de saúde). Apesar do debate, o comunicado final não dedicou uma linha ao tema. Talvez para não assustar os credores. É que o Governo, como no mesmo dia sublinhou Poiares Maduro, acha “fatal” para o país discutir tal coisa. Por isso, foi “fatalmente” omissa. Talvez seja bom lembrar que não há discussões fatais, se forem civilizadas. Medidas fatais sim. E arriscamo-nos a elas.