A Espanha perdeu um jogo e a aura
A defesa do título de campeã mundial começou da pior maneira possível: humilhação às mãos da Holanda, na reedição da final de 2010.
A experiência estava toda do lado da Espanha: apresentou-se no Brasil com 16 repetentes de 2010, contra apenas sete holandeses. Mas o que se viu em Salvador foi a supremacia da juventude sobre a experiência. Uma equipa em processo de renovação destruiu outra cujo currículo não tem parado de crescer. O plano de jogo de Louis van Gaal resultou em pleno e mostrou que a conversa do técnico, que minimizou as hipóteses da selecção holandesa, era só para espanhol ver.
Se a Holanda é uma equipa ainda sem identidade definida – até o esquema táctico mudou com Louis van Gaal, assumindo-se a opção por três centrais – a Espanha vive a amargura do fim de um ciclo. Vários dos seus jogadores não viveram a melhor das temporadas ao serviço dos respectivos clubes e o desgaste dos anos começa a pesar. A crise de identidade estendeu-se até aos equipamentos que cada equipa vestiu: a roja de branco, a laranja mecânica de azul (!).
Mas não foi só um ajuste de contas entre Holanda e Espanha que se viu. Na Arena Fonte Nova, enquadrada no cenário idílico do Dique do Tororó, os brasileiros foram a maioria nas bancadas e fizeram questão de se manifestar. Mas, sem qualquer investimento emocional na partida, desde cedo se percebeu que o único objectivo que movia estes adeptos era tornar miserável a tarde de Diego Costa. Algo que, tendo em conta o desenrolar da partida, foi plenamente atingido.
O avançado (ainda) do Atlético de Madrid foi vaiado logo quando foi anunciado o seu nome no “onze” espanhol. Depois, cada toque de Diego Costa na bola correspondia a uma sonora manifestação das bancadas. Em termos sonoros, uma falta sobre ele quase equivalia a um golo. Foi a vingança por ter escolhido a Espanha: Diego Costa nasceu no estado de Sergipe, que faz fronteira com a Bahia, numa localidade chamada Lagarto e que fica a menos de 300 quilómetros de Salvador.
A Holanda apresentou-se com uma defesa reforçada, um meio-campo trabalhador e muita fé nos três reis magos do ataque: Robben, Sneijder e Van Persie. E quase foi premiada logo aos oito minutos, quando Robben deixou Sneijder isolado, mas este perdeu o duelo com Casillas. A trocar melhor a bola e a pressionar com intensidade, a Espanha foi empurrando os holandeses para trás e aos 27’ chegou ao golo. Mas não o fez sem controvérsia: o árbitro assinalou penálti num lance entre De Vrij e Diego Costa que é no mínimo controverso. Xabi Alonso é que não teve clemência e fez o 1-0.
David Silva, após excelente passe de Iniesta, quase fez o segundo da roja antes do intervalo. Mas, no minuto seguinte, Robin van Persie restabeleceu a igualdade no marcador: Blind cruzou sobre a linha de meio-campo e o avançado do Manchester United, à entrada da área, cabeceou para o 1-1.
Nada fazia adivinhar o que aí vinha. A segunda parte até começou com chuva, mas o verdadeiro temporal foi a Holanda em 45 minutos de sentido único. Mais um grande passe de Blind permitiu a Robben dominar e fuzilar a baliza de Casillas (53’). Robin van Persie acertou na trave (60’) De Vrij cabeceou para o 1-3 aos 64’, num lance em que há falta de Van Persie sobre Casillas. Os dois participaram no 1-4 (72’): com um mau domínio, o guarda-redes espanhol ofereceu o golo ao avançado holandês.
Completamente desorientada, perdida em campo, a Espanha só pedia ao relógio que os minutos passassem para o jogo terminar. Mas o marcador ainda chegou à mão-cheia: um lançamento longo descobriu Robben, que deixou Sergio Ramos para trás, sentou Casillas e apontou o 1-5. O guarda-redes ainda evitou que a humilhação fosse maior, travando os remates de Wijnaldum e Robben. Mas a honra estava perdida. A festa começou com sabor muito amargo para a Espanha, que vai ter de fazer muito melhor para justificar o estatuto de campeã europeia e mundial.