"Boas hipóteses" de se chegar em breve a um acordo sobre o nuclear iraniano
Participantes nas negociações de Genebra anunciam nova ronda para 20 de Novembro. Khamenei critica posição de força da França. Israel saúda fracasso.
“Não estivemos a desperdiçar o nosso tempo. Foi uma negociação formidavelmente difícil e é vital que aproveitemos o impulso criado. A hipótese de chegar a acordo continua em cima da mesa e pode ser alcançada”, disse William Hague, numa entrevista à BBC, no rescaldo dos três dias de negociações na cidade suíça.
A possibilidade de um acordo começou a desenhar-se na sexta-feira quando o secretário de Estado norte-americano, John Kerry, decidiu juntar-se aos negociadores reunidos em Genebra para a segunda ronda de negociações desde a chegada a eleição do novo Presidente iraniano, Hassan Rohani. O conteúdo das negociações foi mantido em segredo, mas a notícia de que os outros chefes da diplomacia do Grupo dos 5+1 (os membros permanentes do Conselho de Segurança mais a Alemanha) se deslocariam também a Genebra e as informações filtradas dos encontros indicavam que o Irão e as potências internacionais estavam prestes a entender-se sobre um conjunto de medidas recíprocas – o Irão aceitava desacelerar o seu programa nuclear e, em troca, receberia fundos que foram congelados pelo Ocidente.
Mas aquele que seria o primeiro acordo entre as duas partes numa década chegou a um impasse quando se começaram a discutir alguns detalhes. Em causa estava o futuro imediato do reactor de águas pesadas de Arak – que quando entrar em laboração, no próximo ano, produzirá plutónio –, o destino a dar aos stocks de urânio enriquecido a 20% (a um passo da concentração usada em bombas) e a exigência ocidental para que o Irão limite o número de centrifugadores nucleares em funcionamento.
O ministro dos Negócios Estrangeiros francês, Laurent Fabius, foi o primeiro a manifestar dúvidas sobre a hipótese de um consenso – ainda que fontes diplomáticas tenham assegurado que outros países colocaram também reticências – afirmando que Paris não entraria “num jogo de enganos”.
Já neste domingo, o ayatollah Ali Khamenei, Líder Supremo do Irão e último decisor em todas as questões de Estado, criticou a atitude francesa através de uma conta na rede social Twitter que se acredita ser gerida pelo seu gabinete. “Os responsáveis franceses têm sido abertamente hostis em relação à nação iraniana nestes últimos anos; essa é uma atitude imprudente e inepta”, lê-se numa das mensagens, seguida por uma outra em que se afirma “que um homem sensato, em particular um político sensato, nunca deve querer transformar uma entidade neutra num inimigo”.
Rohani – eleito com a promessa de quebrar o isolamento internacional a que o país foi votado e que joga nestas negociações todo o seu capital político – foi comedido nas críticas, mas disse que, por sua iniciativa, o Irão não cederá nas questões que considera essenciais. “Os direitos da nação iraniana e os seus interesses representam uma linha vermelha, tal como os direitos nucleares no quadro das regulações internacionais, o que incluiu o direito a enriquecer urânio em solo iraniano”, afirmou num discurso ao Majlis (Parlamento).
"Mais próximo do que nunca"
No final das negociações em Genebra, já na madrugada deste domingo, o ministro dos Negócios Estrangeiros iraniano, Mohammad Javad Zarif, disse “não estar desiludido” e, numa declaração conjunta com Catherine Ashton, chefe da diplomacia da União Europeia e mediadora das negociações, anunciou que a nova ronda vai realizar-se já a 20 de Outubro. O secretário de Estado norte-americano destacou também os “progressos realizados” nos últimos três dias e o seu homólogo alemão, Guido Westerwelle, disse acreditar que as partes “estão mais próximas de uma solução razoável do que alguma vez estiveram nos últimos anos”.
Quem se mostrou satisfeito com a ausência de um entendimento foi o primeiro-ministro israelita, que ao segundo dia das negociações dizia já que o Irão se preparava para obter o “acordo do século”. Neste domingo, Benjamin Netanyahu disse que “Israel fará tudo para convencer as grandes potências e os seus dirigentes a recusarem um mau acordo”. Alguns dos seus ministros foram mais longe: Naftali Bennett, titular da economia, disse que Israel fará campanha para que o Congresso americano bloqueie um eventual acordo, e o responsável da Defesa Danny Danon repetiu que “se tiver oportunidade, Israel vai agir” para impedir que o Irão construa uma bomba atómica: “Foi para isso que criámos a nossa Força Aérea”.
Israel já afirmou que só aceitará um acordo que obrigue o Irão a parar por completo o seu programa nuclear – uma opção que já ninguém considera realista face aos progressos feitos nos últimos anos por Teerão. Questionado se o texto em cima da mesa inclui garantias que satisfaçam Israel, o ministro dos Negócios Estrangeiros britânico disse que “isso não é possível, porque todos [os países] têm de fazer cedências”. “Mas que acordo agrada a toda a gente?”