Santana convoca procurador por causa das cassetes roubadas

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Souto Moura vai ser ouvido hoje de manhã pelo primeiro-ministro e pelo ministro da Justiça António Cotrim/Lusa

A interpretação dos membros do Governo que têm lidado com este caso é que a situação criada não deve ter como única consequência a demissão do director-geral da Polícia Judiciária, Adelino Salvado.

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A interpretação dos membros do Governo que têm lidado com este caso é que a situação criada não deve ter como única consequência a demissão do director-geral da Polícia Judiciária, Adelino Salvado.

O conteúdo das cassetes que circulam em meios judiciais, políticos e jornalísticos mostrarão graves falhas ou mesmo ilegalidades na forma como se processaram as múltiplas fugas de informação que originaram sistemáticas violações do segredo de justiça ao longo do mediatizado processo Casa Pia.

Ontem à tarde, a Procuradoria-Geral da República (PGR) emitiu um comunicado no qual aponta que o material das gravações “poderá revelar-se inócuo” como elemento probatório de crimes “que possam ter sido cometidos” nas conversas gravadas. Todavia, ressalva a PGR, o mesmo não impossibilita que “venham a investigar-se todos os comportamentos” com “relevância penal”.

Enquanto Durão Barroso ocupou o cargo de primeiro-ministro a única vez que o procurador- geral foi chamado a São Bento foi depois das primeiras notícias sobre os casos de pedofilia na Casa Pia, tendo sido pedido o maior empenho na investigação dos casos denunciados na imprensa. Após o envolvimento de figuras públicas não voltou a realizar-se qualquer reunião deste tipo, pelo menos a que fosse dada publicidade.

Adelino Salvado terá percebido que deixara de contar com a confiança política da tutela, isto é, do ministro da Justiça, José Pedro Aguiar Branco, e do próprio primeiro-ministro. A forma rápida e seca como a renúncia foi aceite e as demissões, apresentadas como manifestações de solidariedade, dos magistrados que, ao longo do seu mandato, o director-geral da PJ foi colocando em postos chave também reforçam a ideia da ruptura entre a equipa dirigente da polícia de investigação criminal e o novo Governo.

O ministro da Justiça anunciou, no Ministério de Justiça, ter aceite o pedido de demissão numa declaração de menos de um minuto, sem perguntas, e com as declarações de circustância habituais. Não explicou quais as razões que levaram o ministro da Justiça e o primeiro-ministro a aceitar o pedido ou se foi o Governo a exigir a saída de Adelino Salvado. Em vez disso, José Pedro Aguiar Branco comprometeu-se a assegurar “o pleno funcionamento das instituições judiciárias e o respeito integral pelas garantias constitucionais”, para além de reafirmar a “total confiança na Polícia Judiciária”.

No comunicado enviado à comunicação social, o ex-director nacional da Polícia Judiciária (PJ), Adelino Salvado, justifica o seu pedido de demissão com o “isolamento perante a tutela política”. A acusação de uma quebra de confiança por parte do Ministério da Justiça é apontada no penúltimo parágrafo da nota enviada à imprensa, ontem, a meio da tarde, e reiterada na conclusão do texto: “Por todo o exposto, mormente pela última razão”, pode ler-se, numa clara alusão à ausência de confiança por parte do ministro da Justiça, José Pedro Aguiar Branco.

No anúncio do pedido de cessação da sua comissão de serviço, Adelino Salvado diz ainda que a intenção de pôr o cargo de director nacional da PJ à disposição já havia sido manifestada à tutela a 19 de Julho. No seu comunicado, escrito num tom assaz incisivo, Adelino Salvado nunca nega expressamente que terá conversado com o jornalista do “Correio da Manhã”, mas salvaguarda que o conteúdo dessas conversas foi “truncado”. “[O suporte audio] seguramente foi engendrado por pessoa(s) habilitada(s) a truncar, manipular e subverter som digitalizado”, escreve. Salvado salienta ainda que “os violentos ataques” de que foi alvo desde a sua tomada de posse como director nacional da PJ resultam de “acções” realizadas de forma “manifestamente organizada” e oriundas de “quadrantes políticos”, “económicos” e “em franjas da mais diversas criminalidade”. A assunção de que foi vítima de ataques pessoais é ainda reafirmada nesta declaração: “É previsível que tais sofisticadas actuações (...) só cessam, ou atenuam, quando der por finda a actual comissão de serviço na Polícia Judiciária”.