Há uma conversa sobre saúde mental a acontecer todos os dias no YouTube

Desde o início do confinamento que o festival Mental tem promovido conversas online com várias nomes das artes e da saúde em Portugal. Sob o mote “Como te estás a sentir?”, estas conversas estão a promover uma abordagem “descomplicada e leve” sobre a saúde mental durante a pandemia.

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O conceito é simples: conversas sobre saúde mental (e uma pitada de cultura) com figuras de proa das artes e da saúde em Portugal. É disto que são feitas as M-Talks 4ALL, promovidas pelo Festival Mental desde Março. Uma resposta “ao confinamento e à pandemia” que surgiu “o mais rápido possível”, logo na primeira semana de estado de emergência – e continuarão pelo menos até ao final de Julho, garante Ana Pinto Coelho, organizadora e coordenadora do festival. Esta semana, o painel de convidadas é exclusivamente feminino e inclui nomes como a actriz Joana Solnado.

“Como te estás a sentir neste momento?”: é esta a pergunta-mote das M-Talks 4All, um conceito directamente importado das talks que já existem no Festival Mental, com as devidas adaptações em contexto de pandemia. Passaram a acontecer no YouTube, com os convidados a responderem a partir de suas casas. Mas não perdem o seu foco principal: a saúde mental, particularmente em contexto de pandemia, e a cultura. A pergunta final é quase sempre sobre isso: “O que tem estado a ler, a ver ou a ouvir?”. Esta segunda-feira, as conversas arrancaram com a vereadora da Cultura da Câmara Municipal de Lisboa, Catarina Vaz Pinto.

O conceito [das M-Talks] já existia, mas criámo-las noutro formato, porque as pessoas estão em casa e as salas de espectáculo estão fechadas”, afirma Ana Pinto Coelho, ao telefone com o P3. “A saúde mental ainda é um assunto muito tabu, pouco ou nada apoiado, e tentamos, como sociedade civil, reagir e fazer alguma coisa.” 

Desde Março, altura em que as conversas começaram, já marcaram presença cerca de 70 convidados. Da área da cultura, somam-se nomes como o actor Ivo Canelas, o cineasta João Canijo, o músico Paulo Furtado (mais conhecido como The Legendary Tigerman) e o comediante Hugo van der Ding. Da área da saúde mental contam-se também nomes de peso como os de Miguel Xavier, director do Programa Nacional para a Saúde Mental da Direcção-Geral da Saúde, e de Teresa Maia, psiquiatra e coordenadora regional de Saúde Mental de Lisboa e Vale do Tejo.

Um dos objectivos desta iniciativa é dar a conhecer os profissionais de saúde mental que trabalharam durante a pandemia, pessoas que “muita gente não conhece nem o nome nem a cara, mas que tiveram também um papel fundamental no terreno”. Resumindo, “dar visibilidade às pessoas que estão nos bastidores da área da saúde mental”, explica a organizadora destas talks.

Esta “long run”, como a descreve, deu frutos e o balanço que Ana Pinto Coelho faz destes três meses de actividade é positivo. A coordenadora conta que recebeu muitos e-mails de pessoas “a agradecer e a dizer que já estavam à espera das talks da próxima semana, a dizer que é bom alguém falar sobre isto de uma forma descomplicada e leve”. E, para sua surpresa, houve também quem se propusesse para ser entrevistado: “O processo reverteu-se. Havia muita gente a propor-se”, revela a organizadora. Os pedidos foram sendo acomodados, sempre que se justificavam.

Há festival em Setembro, mas “faltam apoios

Sobre a quarta edição do Festival Mental, que tem data marcada para Setembro e Outubro de 2020, é difícil garantir que se vai realizar como noutros anos: “Eu gostaria até de enriquecer a programação em relação ao ano passado e crescer, mas infelizmente os apoios que tivemos este ano foram significativamente menos do que no ano passado”, explica Ana Pinto Coelho.

Apesar disso, os temas para as talks estão já delineados e um deles é uma escolha directamente relacionada com os impactos da pandemia: stress pós-traumático. “O confinamento e todos os problemas socioeconómicos que estão a aparecer e que vão surgir ao longo dos próximos tempos vão certamente criar traumas às famílias”, resume a organizadora. Em paralelo, vai também falar-se da dependência de drogas e ansiedade – este último, um tema de que já falam “há muito tempo”, mas que agora vão abordar a sério”.

Todas as componentes artísticas do festival, da música à literatura, que já são marcas do certame, estão ainda sobre um véu de incertezas: “Não sabemos ainda se vão acontecer e não é por nossa falta de vontade, é por falta de apoios.” O grande objectivo, esse, continuará o mesmo: colocar a saúde mental no primeiro plano. Porque, apesar de ser inegável que o tema esteve em destaque durante a pandemia, não se pode “usar a saúde mental para algumas coisas e na prática não mudar nada”, sentencia Ana Pinto Coelho.

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