“O mundo pode explodir a qualquer momento. Não é algo que está no ar?”

“Se o perigo do mundo está no mundo é porque vem dos indivíduos, é porque está nas pessoas”, diz-nos o realizador de Tommaso, Abel Ferrara, 68 anos, hoje cineasta de Roma como ontem era de Nova Iorque. Hoje sóbrio, como ontem era toxicodependente. O cinema e a angústia continuam.

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Daniel Rocha

Abel Ferrara, 68 anos, agarrado à Água das Pedras não quer copos, prefere beber directamente da garrafa — é coisa bonita de se ver. Isto sem ironia. Porque Tommaso, que o cineasta vem apresentar em Lisboa, terça e quarta-feira na competição do Lisbon & Sintra Film Festival, no Centro Cultural Olga Cadaval e no Espaço Nimas, respectivamente, é coisa muito bonita de se ver. Uma espécie de home movie fantasiado a meias com o actor Willem Dafoe, que interpreta um realizador a braços com a angústia conjugal e partilha o ecrã com Cristina Chiriac e Anna Ferrari, que na vida real são a companheira e a filha de Abel. Tudo se passa na casa de Ferrara em Roma, perto da Piazza Vittorio... Num filme invadido pelas interferências das projecções mentais, em que Dafoe se crucifica na Stazione Termini de Roma como num excerto de A Última Tentação de Cristo, de Scorsese, podemos também ser assaltados pelas imagens paranóicas do próprio Ferrara em The Driller Killer (1979), quando se começou a fazer notado como cineasta junkie: é bonito de se ver que a sobriedade, que constrói há seis anos e que o faz não gostar de pôr os pés em Nova Iorque e em Nápoles, não beliscou a sua capacidade de captar nos planos uma “presença”, aquilo que dizemos ser “o mal”. Tommaso é uma espécie de regresso, em Roma, a uma Nova Iorque que morreu: onde ele descobriu o cinema italiano, onde o porno e a cinefilia podiam partilhar a mesma sala e os mesmos espectadores. E o casal emerge.

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