Binoche diz "Bravo!" e dá o Urso de Ouro a Nadav Lapid

Synonymes, terceira longa do cineasta israelita, e So Long, My Son, de Wang Xiaoshuai são os grandes vencedores de Berlim, numa noite de celebração e despedida a Dieter Kosslick.

Nadav Lapid realizador de Synonymes
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Nadav Lapid, realizador de Synonymes LUSA/FELIPE TRUEBA
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Tom Mercier, Nadav Lapid e Louise Chevillotte LUSA/ALEXANDER BECHER
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Yong Mei à direita e Wang Jingchun com os prémios por So long, My Son LUSA/FELIPE TRUEBA

Synonymes, o filme-manifesto do israelita Nadav Lapid, foi o filme que mais dividiu e mais deu que falar nestes últimos dias na Berlinale; é justíssimo que leve para casa o Urso de Ouro da 69.ª edição do festival alemão. Juliette Binoche, presidente do júri, fez questão de dizer “Bravo!” a Lapid enquanto lhe entregava o prémio máximo de um palmarés que acertou no que era preciso acertar – melhor realização à alemã Angela Schanelec por Ich war zuhause, aber… —, e que fez o melhor que pôde com uma competição fraca, sem perder a tradição berlinense de apostar nos filmes “de tema”.

Filme de tema é o Grande Prémio do Júri, Grâce à Dieu de François Ozon, sobre a pedofilia na Igreja Católica francesa, inspirado em factos reais (é um filme sóbrio, atípico, algo telefílmico do realizador); filme de tema é o prémio de argumento, entregue ao escorreito mas banal La Paranza dei Bambini, adaptação de um romance de Roberto Saviano; filme de tema é o prémio Alfred H. Bauer, o muito mal recebido Systemsprenger de Nora Fingscheidt, sobre uma criança adoptiva que é – literalmente – um terror.

E filme de tema, mas só en passant, é So Long, My Son, do chinês Wang Xiaoshuai, último titulo a ser exibido no concurso. É uma saga melodramática de três horas que acompanha trinta anos na vida de um casal chinês que perde o filho único num acidente; o tema, mais subtil que puxado, é a política do filho único do regime chinês, mas foram os (excelentíssimos) intérpretes do casal, Yong Mei e Wang Jingchun, a receber os prémios de interpretação feminina e masculina, repetindo o que acontecera em 2015 quando Charlotte Rampling e Tom Courtenay venceram por 45 Anos.

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Juliette Binoche e o director do festival Dieter Kosslick FABRIZIO BENSCH Reuters

Se So Long, My Son sai de Berlim com os prémios de representação, a retirada de competição de um outro filme chinês, One Second do veterano Zhang Yimou — alegadamente por problemas técnicos mas oficiosamente devido à ausência de autorização de exibição por parte das autoridades chinesas — não passou despercebida. Ao subir a palco, o júri, completado pela actriz Sandra Hüller, pela produtora Trudie Styler, pelo crítico Justin Chang, pelo programador Rajendra Roy e pelo realizador Sebastián Lelio, fez questão de lamentar a ausência de Zhang da Berlinale, onde ganhou o Urso de Ouro há 31 anos por Milho Vermelho. Na voz de Binoche, ouviu-se: “Esperamos que este filme possa ser visto em breve em todo o mundo. E tivemos saudades de Zhang em Berlim.”

O romancista Roberto Saviano ao subir a palco para aceitar o Urso de Prata para melhor argumento, escrito com Maurizio Bracci e com o realizador Claudio Giovannesi, dedicou o seu prémio às “ONG que salvam pessoas no Mediterrâneo e àqueles que tiram gente das ruas de Nápoles”. François Ozon, ao receber o Grande Prémio do Júri, admitiu não saber “se o cinema pode ajudar a resolver problemas, mas sei que pode ajudar a compreendê-los.”

E Nadav Lapid enfrentou o touro pelos cornos, tocando na sátira devastadora e afectuosa de Synonymes sobre a identidade nacional: “Sei que o meu filme pode ser visto como escandaloso em Israel e também em França. Mas acima de tudo é uma celebração do cinema e da vida.” A história semiautobiográfica de um jovem israelita que parte para França para refazer a sua identidade (o estreante Tom Mercier, cuja performance extraordinária mereceria só por si um prémio) questiona abertamente as noções de nacionalismo e patriotismo, num turbilhão de cinema simultaneamente livre e cerebral. É um prémio merecidíssimo, que, somado ao prémio de realização para Angela Schanelec pela maneira como desenha uma frágil teia de emoções em Ich war zuhause, aber… celebra o que de melhor se viu neste ano em Berlim. Só faltou premiar Répertoire des villes disparues de Denis Côté para os grandes filmes do festival em 2019 estarem no palmarés.

E a cerimónia, que abriu com um adeus a Bruno Ganz, falecido neste sábado, foi também uma festa de despedida a Dieter Kosslick, director da Berlinale ao longo de 18 anos. O director cessante foi alvo de homenagens da ministra da Cultura, Monika Grütters, que ofereceu simbolicamente o apadrinhamento de uma ursa no Zoo de Berlim, e do júri de Juliette Binoche, que lhe deu um enorme urso de peluche em tamanho quase real. Ao subir a palco, Kosslick fez questão de abraçar os seus sucessores, a partir de agora, na direcção do festival: Mariette Rissenbeek e Carlo Chatrian, que assumirão respectivamente as funções de directora executiva e de director artístico. A tempo do 70.º aniversário do festival, a correr de 20 de Fevereiro a 1 de Março do próximo ano.

Prémios:

Urso de OuroSynonymes de Nadav Lapid

Grande Prémio do JúriGrâce à Dieu de François Ozon

Melhor Realização – Angela Schanelec por Ich war zuhause, aber...

Melhor Actriz – Yong Mei por So Long, My Son de Wang Xiaoshuai

Melhor Actor – Wang Jingchun por So Long, My Son

Melhor Argumento – Maurizio Bracci, Claudio Giovannesi e Roberto Saviano por La Paranza dei Bambini de Claudio Giovannesi

Prémio Alfred H. BauerSystemsprenger de Nora Fingscheidt

Prémio Contribuição Artística – Rasmus Videbaek pela fotografia de Out Stealing Horses de Hans Petter Moland

Primeira ObraOray, de Mehmet Akif Büyükatalay

Melhor DocumentárioTalking About Trees de Suhaib Gasmelbari

Curtas-metragens

Urso de OuroUmbra, de Florian Fischer e Johannes Krell

Urso de PrataBlue Boy, de Manuel Abramovich

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