Chefe operacional da Protecção Civil alvo de queixa pela coordenação em incêndios

Rui Esteves tem sido criticado pela sua acção em vários incêndios. Secretário de Estado pediu relatório à Protecção Civil sobre o que aconteceu em Mação, mas autarca e deputado do PSD pressionam para uma investigação da Inspecção da Administração Interna.

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Frente de Mação do incêndio de Julho chegou a ter 15 km Mario Lopes Pereira

O cerco tem vindo a apertar-se para o comandante nacional da Protecção Civil (Conac), Rui Esteves, que tem sido alvo de críticas pela acção operacional ao longo da época de fogos. E se o incêndio de Pedrógão Grande ainda aguarda uma auditoria interna da Protecção Civil à actuação dos vários agentes e os resultados da investigação da comissão técnica independente, tendo a ministra da Administração Interna já admitido que houve "descoordenação" ao nível do comando, já os fogos de Mação são objecto de protestos do presidente da câmara local e do deputado do PSD Duarte Marques, que querem saber mais sobre o que se passou no concelho e pedem uma investigação da Inspecção-Geral da Administração Interna (IGAI). 

O incêndio que começou na Sertã em Julho e alastrou para Mação, fustigando 18 mil hectares deste segundo município (números da autarquia), foi o maior deste ano, queimando 29.752 hectares no total dos concelhos abrangidos, de acordo com os dados divulgados pelo Instituto de Conservação da Natureza. Além deste incêndio, Mação enfrentou outro fogo florestal em Agosto, que queimou mais 12.897 hectares. É sobre estes dois incêndios que o presidente da câmara, Vasco Estrela (PSD), e o deputado Duarte Marques querem investigações. No primeiro incêndio, os dois políticos têm dúvidas sobre a coordenação no teatro de operações, nomeadamente sobre o desvio de meios e equipas de Grupos de Intervenção Permanente (GIP) da GNR para outros concelhos; e no segundo têm dúvidas sobre o número de aeronaves e de bombeiros mobilizados para o combate às chamas. 

O deputado Duarte Marques aponta o dedo directamente a Rui Esteves e, num requerimento que envia ao Ministério da Administração Interna (MAI), sugere que a ministra Constança Urbano de Sousa "tome a iniciativa de pedir uma investigação à acção directa do Conac Rui Esteves, em pelo menos, estas duas ocorrências". Isto, porque, acredita o social-democrata, "em ambos os incêndios", "a ação directa do Conac teve influência na perda de controlo da situação".

Se não for o MAI a avançar por si para essa inspecção, será o deputado a fazer uma queixa à IGAI, provocando a investigação. "Vou aguardar pelas respostas da ministra e, depois de ter as respostas na mão, irei preparar uma queixa à IGAI, para que se apure o que se passou e se apurem as responsabilidades do responsável máximo pela coordenação dos meios, o comandante nacional", disse ao PÚBLICO.

Neste procurar de responsabilidades, entra também o presidente da Câmara de Mação, que dá uma semana ao MAI para lhe enviar o relatório da Autoridade Nacional da Protecção Civil (ANPC) sobre o incêndio de Julho, que lhe foi prometido pelo secretário de Estado da Administração Interna, Jorge Gomes, e ainda não chegou. Caso o relatório não lhe chegue às mãos e/ou não seja satisfatório, irá oficializar a queixa à IGAI no dia 13. "O incêndio foi há um mês e meio e o relatório ainda não me foi entregue. Nem a fita do tempo. Estou a dar o benefício da dúvida. Sem relatório a queixa segue, e mesmo com relatório, é muito provável que avance", diz Vasco Estrela ao PÚBLICO. "Queremos perceber em pormenor as decisões que foram tomadas e as justificações do comandante nacional", diz o autarca, para quem a falta de informação "ou é mais uma desconsideração do Conac ou este tem alguma coisa a esconder". 

O relatório sobre o que aconteceu, em Julho, em Mação ainda "não está concluído", respondeu ao PÚBLICO o MAI, que refere tratar-se de um relatório da ANPC "circunstanciado sobre as operações" (englobando a fita do tempo), que "será enviado ao presidente da Câmara de Mação".

"Apesar de o Conac ter sido alertado para o erro que estava a cometer, decidiu deslocalizar meios para outras frentes do incêndio. Precisamos saber se houve uma relação de causa/efeito para o que aconteceu. Pode não ter sido só azar. Por que razão estivemos cinco horas sem meios aéreos?", questiona Vasco Estrela sobre o incêndio de Julho que alega ter chegado a ter em Mação uma frente activa de 15 quilómetros que queimou 15 casas de primeira habitação. "Por que não foi aberta outra ocorrência, para que o comandante distrital de Santarém pudesse gerir os meios? Como é possível estarem a arder casas em Mação e a câmara não ter sido informada? Por que não houve qualquer meio mobilizado para Vale de Cardigos [onde arderam casas], sem que houvesse qualquer informação do posto de comando?" São muitas as perguntas que o autarca quer ver esclarecidas sobre o incêndio de Julho, a que se juntam outras tantas sobre o de Agosto.

O SMS que contradiz Rui Esteves

Desde o início do incêndio que o autarca entrou em colisão com a ANPC sobre o número de aeronaves em acção no combate a este fogo. A ANPC diz que foram "15 durante o dia", Vasco Estrela diz que só tem prova e só foi informado de sete. O Conac informou o vice-presidente da câmara por mensagens e essas comunicações acompanham o requerimento do PSD.

As mensagens referem a activação de sete meios aéreos: às 8h30 de dois helicópteros "HESA02 e H03", às 8h38 de mais dois "Echo01 e Echo02" e às 12h40 de três aviões anfíbios "A02/A07/A08". "Precisamente à mesma hora, a senhora ministra e o seu secretário de Estado (SGAAI) revelavam ao deputado Duarte Marques que estariam 13 meios aéreos. Pouco depois o SGAAI revelava que segundo a ANPC estariam 14. Pouco depois a ANPC informava a imprensa que estavam 15 meios aéreos em Mação", lê-se no requerimento que fala em "graves disparidades" na informação.

Em Agosto, o PÚBLICO questionou a ANPC sobre este caso e foi remetido para o briefing da adjunta de operações nacional, Patrícia Gaspar. Nesse briefing, Patrícia Gaspar garantia que àquela hora (19h) estavam 13 meios aéreos no local, mas que durante o dia chegaram a estar 15. Ontem, o PÚBLICO voltou a reiterar o pedido de informações, mas até à hora de fecho da edição, não foi possível obter respostas.

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