Barcelona: o mistério da rápida radicalização da célula terrorista de Ripoll

Polícia privilegia pista que aponta imã da cidade como mentor do grupo. Es Satty esteve no ano passado num dos centros do jihadismo na Bélgica.

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O Presidente de República, Marcelo Rebelo de Sousa, esteve ao lado dos reis de Espanha, na missa em memória das vítimas Sergio Barrenechea/EPA

Muitas peças continuam soltas na investigação aos atentados na Catalunha e uma das principais incógnitas prende-se com a forma como os membros desta célula terrorista – jovens aparentemente bem integrados na comunidade, vários deles irmãos – se radicalizaram. A resposta poderá estar em Abdelbaki Es Satty, imã na pequena localidade de Ripoll, apesar de a polícia garantir que não tinha antecedentes relacionados com terrorismo.

“Não sei o que fizeram à cabeça dos meus filhos. Garanto que são… eram bons rapazes, normais”, disse ao jornal La Vanguardia o pai de Mohamed e Omar Hychami, dois dos cinco jovens mortos na madrugada de sexta-feira em Cambrils quando tentavam lançar um novo ataque – atropelaram com um carro várias pessoas e um deles matou à facada uma mulher durante a fuga, mas acabou também por ser abatido.

Além destes, a célula seria composta por outros sete a oito homens, todos de nacionalidade marroquina: quatro estão detidos, três terão morrido na explosão da casa de Alcanar (Tarragona) onde preparavam explosivos para um atentado que não chegou a acontecer, e o último continuará em fuga – Younes Abouyaaqoub, o alegado condutor da carrinha que na tarde de quinta-feira atropelou dezenas de pessoas na Rambla de Barcelona, matando 14 delas. “Nunca suspeitámos que podiam fazer algo assim, levavam uma vida normal”, contou à televisão Antena 3 uma prima de Younes e de Houssaine Abouyaaqoub, o irmão mais novo do principal suspeito, que foi um dos cinco mortos em Cambrils.

Comunidade integrada

A estupefacção é partilhada por vários dos que os conheceram dentro e fora da pequena comunidade muçulmana que, garantem as autoridades locais, está integrada e “não vive num gueto”. “Ainda há três meses estive com Mohamed [Chemlal] numa festa e ambos bebemos e fumámos”, contou um amigo ao jornal El Mundo, referindo-se ao único sobrevivente da explosão em Alcanar, explicando que só “há cerca de dois meses” o comportamento do grupo terá começado a mudar.

As famílias apontam o dedo a Abdelbaky Es Satty, imã de 45 anos que há dois anos liderava as preces numa das duas mesquitas de Ripoll, um homem discreto que há cerca de dois meses abandonou a congregação anunciando que regressava a Marrocos. A polícia suspeita, no entanto, que passou a maior parte do tempo na casa de Alcanar, onde “há vários meses” a célula começou a planear os atentados.

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Manifestação de muçulmanos, cristãos e judeus contra o terrorismo em Barcelona Jon Nazca/REUTERS

“Ainda não estamos em condições de afirmar qual foi a origem da radicalização destas pessoas”, disse este domingo Josep Lluís Trapero, comandante dos Mossos d’Esquadra, a polícia catalã, sublinhando que apesar das suspeitas, nenhum indício foi encontrado nem na mesquita nem na casa de Es Satty, que se pensa ter morrido na explosão.

Revelou também que o imã “não tinha antecedentes relacionados com terrorismo”, apesar de ter sido noticiado que esteve detido até 2012 por tráfico de haxixe e imigração ilegal e que na prisão conheceu um dos membros da célula responsável pelos atentados de Atocha em 2004.

O El País revelou também que, já em 2016, Es Satty passou dois meses na cidade de Vilvoorde, na Bélgica, tentando encontrar trabalho como imã – a cidade flamenga foi uma das que mais jihadistas enviaram para a guerra na Síria. As autoridades suíças confirmaram também que pelo menos um dos suspeitos esteve no ano passado em Zurique, onde poderá ter tido contacto com outros grupos radicais. Viagens que as autoridades estão a passar a pente fino, por considerarem pouco provável que o grupo tenha planeado um ataque de grande dimensão sem qualquer apoio exterior, adianta o El País.

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