Rocco Siffredi: O diabo no corpo

No Doclisboa um inusitado documento sobre os bastidores do porno: a construção de uma personagem crística, Rocco Siffredi, que tem o diabo entre as pernas.

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Chegou a hora, para a espécie de Dirty Harry do porno que é Rocco Siffredi, de se abrir o à flagelação.

Como uma personagem de Eastwood, isto é, como um dinossauro de violência irreprimível, há um deleite em ser “crucificado” – podemos tirar as aspas, porque no seu porno de despedida, Rocco assume-se como figura crística, carrega a cruz e permite que elas lhe façam o que ele lhes andou a fazer durante três décadas (“I can be nasty”, disse ele).

Inusitado documento sobre os bastidores do porno: estão lá as imagens que podemos esperar, o genérico é o fetichizado pénis de Rocco, espreitamos o sexo no trabalho (mesmo que os gestos surjam banais, podemos ser surpreendidos pela sua violência), mas o “drama” é desviado para a construção de Rocco Tano. Que um dia, adolescente, se espantou com a fúria entre as pernas e, com a cumplicidade da mãe que lhe sorriu na primeira masturbação, decidiu que o sexo iria salvá-lo da pobreza.

Mergulhou-o na violência e dependência – ou terá legitimado essa violência. Há um desejo de normalização nos 52 anos de Rocco (a mulher, os filhos), mas a sensação de “qualquer coisa de pecaminoso” explode no corpo. Há por aqui uma teia de afectos e dependências – aquele primo, que tentou o porno com os mesmos “argumentos” de Rocco, mas não concretizando no momento da “acção!”, passou para trás da câmara... – a que Boogie Nights (Paul Thomas Anderson 1997) chamaria um figo.

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