Sem procura e confiança, “não há razão para investir”

“Se eu não vejo a procura a aparecer, não há razão para investir e acaba por criar-se um círculo vicioso”, afirmou o vice-presidente da CIP, João Almeida Lopes, num encontro sobre o futuro da indústria.

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Debate juntou João Almeida Lopes, da CIP, João Castello Branco, presidente da Semapa, e o eurodeputado do Grupo Popular Europeu, José Manuel Fernandes DR

A queda do investimento “tem a ver com a crise e a confiança”, afirmou o vice-presidente da CIP, João Almeida Lopes, esta sexta-feira, na conferência internacional que a confederação organizou para debater o futuro da indústria na Europa. “Se eu não vejo a procura a aparecer, não há razão para investir e acaba por criar-se um círculo vicioso”, afirmou Almeida Lopes, que falava num painel destinado a discutir o relançamento do investimento privado.

Lembrando que entre 2007 e 2014 o investimento caiu 10% na Europa, mas caiu 30% em Portugal, o responsável da CIP acrescentou ao rol de dificuldades portuguesas as barreiras burocráticas (como os licenciamentos), que “são um pesadelo” para quem quer investir, e as “preocupações” em torno da estabilidade fiscal e das finanças públicas. Mas também criticou a falta de estratégia para atrair investimento externo: Era preciso “que alguém se pusesse a olhar para as grandes empresas e lhes perguntasse ‘o que é que os senhores querem para vir para Portugal’? e isso não está a ser feito de forma sistemática”, notou o vice-presidente da CIP, dizendo que, apesar de tudo, “o país é vendável” e quem já cá está “não quer sair”.

Outro dos intervenientes no painel, o presidente da Semapa, João Castello Branco, juntou-se à crítica: “Uma economia que não tem condições para se endividar e que não tem capitais próprios deveria ter como prioridade total e absoluta a atracção de investimento privado”, sublinhou o gestor, para quem o Plano Juncker “pode olear este esforço”, mas não será suficiente. “O compromisso [da Semapa] continua a ser com Portugal”, mas “existe uma tendência para ponderar” sobre outras localizações, admitiu o gestor. A política energética, a política fiscal e a capacidade de financiamento da República são motivo de preocupação para o grupo, que já tem investimentos no Brasil, Estados Unidos e Moçambique.

“A palavra-chave é a confiança”, disse o eurodeputado do Grupo Popular Europeu, José Manuel Fernandes, assinalando o “paradoxo” que é a queda do investimento quando há liquidez e taxas de juro baixas. “A instabilidade interna e as reversões não ajudam; não se pode fazer uma reforma do IRC e depois recuar, isso não ajuda”, sublinhou José Manuel Fernandes, a propósito da situação portuguesa.

O eurodeputado, que é também o relator do Plano Juncker no Parlamento Europeu, lamentou ainda que em Portugal haja uma “concepção ideológica em relação ao investimento privado” que faz com que haja pouca proactividade no país e que o Governo não assuma “um papel de facilitador” no acesso das empresas aos instrumentos financeiros europeus. “Falta informação”, falta definir uma estratégia e “juntar esforços”, lamentou.

O eurodeputado popular não foi o único a referir a questão ideológica como entrave ao investimento privado: “Investimento público não haverá pelas restrições que existem, e depois temos um Governo cujo suporte à esquerda critica a esfera privada, que é a única que pode contribuir para o crescimento”, lamentou o vice-presidente da CIP.

As críticas à governação chegaram também pela voz do presidente da CIP. Na abertura da conferência, António Saraiva deixou um aviso ao ministro das Finanças: “Além das exportações, a variável chave do relançamento da economia é o investimento”, mas este não crescerá sem que se recupere a confiança dos investidores através de reformas laborais e fiscais que garantam “estabilidade” e sem que se reforce a capitalização das empresas.

Nas suas previsões parece este ano, o Governo aponta para um crescimento do investimento de 4,9% (superior ao do ano passado). Já os dados mais recentes do Banco de Portugal, de Junho, apontam para 0,1%.

“É prioritário e urgente a capitalização das empresas portuguesas”, disse Saraiva ao ministro das Finanças, Mário Centeno, a quem pediu “celeridade” na acção e a quem voltou a criticar uma “estratégia económica excessivamente concentrada no estímulo ao rendimento disponível das famílias” e no consumo.

Já no encerramento dos trabalhos, Saraiva apontou baterias contra a Alemanha. Notando que o problema do investimento é também “um problema de expectativas dos agentes quanto à evolução da procura”, o presidente da CIP lembrou que, se Portugal não tem condições para apostar em “políticas expansionistas do lado da procura”, há quem as tenha.

Países com finanças públicas sólidas e “que continuam a acumular crescentes excedentes externos” contribuem para o “problema de escassez da procura que bloqueia o relançamento do investimento na Europa”, afirmou o presidente da CIP.

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