Funcionárias de infantário em Palmela estão sem receber e avançam com greve

Instituição em Palmela tem conta bloqueada devido a dívida à Segurança Social e não consegue pagar às funcionárias. Os pais das crianças vão organizar um arraial para angariação de fundos para infra-estruturas.

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O infantário está numa zona rural, entre Palmela e Setúbal Rui Gaudêncio

Joana Mourato é mãe de uma menina que frequenta a creche da Associação de Solidariedade Social de Brejos do Assa - Rouxinol, uma Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) com infantário, creche e actividades de tempos livres (ATL) no concelho de Palmela. Em 2012, Joana vivia no Porto mas, tendo ficado desempregada, rumou a Sul, onde encontrou o Rouxinol. Não tendo condições para pagar o infantário, a mensalidade é comparticipada pela Segurança Social. A sete quilómetros de Palmela e de Setúbal, o ambiente rural é outro dos atractivos do infantário. “As crianças estão no parque infantil e conseguem ver as ovelhas a passar.” Contudo, nuvens pesadas persistem sobre a escola: Há ordenados em atraso devido a uma dívida à Segurança Social, uma situação que se arrasta há anos.

Vera Macedo deixou a sua filha no infantário e tem andado toda a manhã de um lado para o outro, no seu carro, a carregar rolos papel de cenário oferecidos pela Navigator. Juntamente com mais quatro mães, Vera criou o grupo Amigos do Rouxinol, e neste momento está a organizar um arraial para angariar fundos para a manutenção de estruturas da associação. “Não conseguimos pagar a dívida, mas queremos angariar dinheiro para certas estruturas, como um toldo ou o pavimento do parque”, diz.

Também Vera tem testemunhado a situação das funcionárias. “Neste momento, estão a trabalhar em regime de voluntariado”, diz. Esta mãe informa que apesar de não faltar nada no infantário, o plano de actividades tem sido alterado. “Para a semana da praia não há funcionários suficientes. Há outros psicologicamente afectados e que estão de baixa. Outro dia, uma educadora estava a limpar vidros. Fazem-no de boa vontade, mas não é suportável”, denuncia.

“É todos os meses uma ansiedade”, desabafa a educadora Sónia Barros. Há dois meses que não recebe. O mês está quase a terminar e também não se avista o ordenado. Esta é uma situação recorrente desde 2009. Desde esse ano que tem ordenados em atraso e já viu a conta da associação bloqueada seis vezes, tal como o PÚBLICO já noticiou. “Estão a pagar a dívida com os ordenados”, acrescenta. A educadora explica que a situação surgiu devido a uma dívida à Segurança Social, em que os descontos não foram entregues em papel e ninguém fiscalizou. Agora, esta ascenda a 500 mil euros. Sónia esclarece que esta é uma dívida ainda gerada pela antiga direcção. “O acual presidente dá-nos apoio mas está de mãos e pés atados”, afirma.

“A instituição não é sustentável”

O presidente da associação confirma: “Há dois meses que não conseguimos pagar. As outras contas [alimentação, água e luz ] são todas feitas em dinheiro.” António Raposo informa que a dívida está, neste momento, em 300 mil euros. “A instituição não é sustentável. Também se deve à conjuntura e à dificuldade das famílias com baixos rendimentos e por estar numa zona rural. ” António Raposo aponta também o afastamento de Setúbal e Palmela como uma duplo constrangimento. De acordo, com o presidente esta é uma situação que vem desde o final dos anos 90 e que a dívida tem sido abatida aos poucos. Mas ainda falta muito.

Ao PÚBLICO, o Instituto da Segurança Social confirma que a associação apresenta “uma situação contributiva não regularizada desde Janeiro de 2011”. E, por isso, foram determinadas penhoras.

“A dívida foi feita pela antiga direcção e por nós também. Não há receita suficiente para se fazer o pagamento imediato”, admite António Raposo, que está desde 2006 na direcção da associação. O responsável, que está demissionário, diz que tem mantido o diálogo com as funcionárias. Já foram feitas reuniões em que foi explicado que a Segurança Social criou uma equipa para potenciar determinadas valências do infantário. “Temos uma sala preenchida a metade e uma delas a meio gás. Temos de rentabilizar”, adianta. Actualmente, o Rouxinol tem 27 funcionárias e em média 130 crianças, divididas em três salas de creche, três salas de pré-escolar e uma com ATL. A lista de espera para entrada na creche é de 12 crianças.

As mães não se têm contentado com as respostas dadas pela direcção e decidiram intervir. “Primeiro, falámos com o presidente da junta de Palmela e com o vereador da Educação, Adilo Costa, na passada sexta-feira”, começa por explicar a mãe Vera Macedo. Na última segunda-feira, foram à Assembleia Municipal propondo uma angariação de fundos para as infra-estruturas da escola e o arraial. “O presidente da câmara disse que vão tentar ajudar-nos, mas há aqui um problema: trata-se de uma IPSS. Mas se a autarquia não tem oferta no ensino pré-escolar, tem de zelar pela IPSS”, considera.

Contactada pelo PÚBLICO, a autarquia esclarece que são necessárias nove salas para o pré-escolar no concelho. “No próximo ano lectivo 2016/2017 perspectiva-se a entrada em funcionamento de duas novas salas na freguesia de Pinhal Novo, que serão complementadas com a oferta das redes solidária e privada, o que dará resposta às necessidades identificadas.”

A câmara reconhece que muitas IPSS do concelho estão com constrangimentos financeiros e que, mesmo assim, têm mantido os seus serviços. No caso do Rouxinol, diz que “tem mantido contactos para aferir quais as alternativas que se podem considerar, designadamente em articulação com a tutela, através do Centro Regional de Segurança Social de Setúbal.” E acrescenta que tem encetado "todas as diligências que possam apoiar a instituição a encontrar mecanismos para a sua subsistência.”

Uma luta com greve e arraial

A educadora Sónia Barros está no Rouxinol desde 2005 e já pensou em sair, mas pretende ficar e tentar "salvar" o infantário. Já foram enviadas cartas à Segurança Social e ao Presidente da República há dois meses, mas até agora não obtiveram resposta. Por isso, vai ser lançado um aviso de greve de cinco dias e um protesto à porta da Segurança Social. “Eu gosto mesmo disto e estou a lutar para que o infantário não feche”, assegura Sónia.

Enquanto isso, os Amigos do Rouxinol continuam com a preparação do arraial. Para que seja possível a sua concretização, a 8 de Julho, têm pedido apoios a empresas e vão anunciando a colaboração com publicidade na página de Facebook. Desde o comércio local a empresas como a Staples ou a Delta, são vários os patrocinadores do evento. A Câmara irá apoiar logisticamente o evento.

Texto editado por Ana Fernandes

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