Rajoy é rejeitado à esquerda e à direita, mas o Governo terá de passar por ele

Oposições internas aos líderes do PSOE e do Cidadãos podem desbloquear formação do próximo Governo espanhol.

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Mariano Rajoy foi o grande vencedor das eleições gerais de domingo Marcelo del Pozo / Reuters

Com mandato reforçado e com os rivais enfraquecidos, o líder do PP, Mariano Rajoy, diz estar disponível para formar Governo de qualquer forma e evitar uma terceira ida às urnas em Espanha. Os líderes partidários mantêm as suas posições pré-eleitorais, mas também crescem as pressões internas.

As eleições gerais deixaram poucos cenários com alguma probabilidade de garantir uma maioria estável no Congresso dos Deputados para apoiar um executivo. E é aritmeticamente impossível ignorar o PP de Rajoy, que conseguiu juntar mais 700 mil votos aos que havia alcançado em Dezembro, passando de 123 deputados para 137.

Mas os principais responsáveis políticos mostram-se irredutíveis quanto à rejeição de um pacto com Rajoy ou com o seu partido. O líder do PSOE, Pedro Sánchez, mantém a estratégia de não apoiar nem se abster na votação para a investidura de um Governo dos conservadores. Já o fundador do Cidadãos, Alberto Rivera, afasta qualquer entendimento com um PP liderado por Rajoy.

Ao contrário do que fez após as eleições de 20 de Dezembro — quando se negou a formar Governo por não reunir apoios suficientes —, Rajoy mostra agora abertura para qualquer fórmula que lhe garanta o poder. “Não vamos abdicar da responsabilidade de governar e eu não vou renunciar a governar porque há oito milhões de espanhóis que nos apoiaram”, afirmou o chefe de Governo em funções, antes de seguir para para a cimeira do Conselho Europeu, em Bruxelas.

“Gostaria de governar com apoio suficiente, mas, se isso não for possível, governaremos com os apoios que nos foram dados pelos espanhóis e suponho que com alguns pactos pontuais”, acrescentou Rajoy. Uma grande coligação que abarque os socialistas e os liberais do Cidadãos continua a ser o grande objectivo do líder conservador, tal como já tinha sido na sequência das eleições gerais anteriores.

Agora, porém, Rajoy deixa a porta aberta à possibilidade de governar sem maioria, algo que seria inédito na democracia espanhola pós-franquista. Mas, para isso, será no mínimo necessária a abstenção dos socialistas — cenário que o líder do partido já afastou.

Oposições internas

Em resumo: ninguém quer Rajoy, mas as duas vitórias eleitorais que somou em meio ano tornam-no imprescindível. Alguém terá de ceder e a chave para acabar com o bloqueio pode estar nas convulsões internas nas hostes do PSOE e do Cidadãos.

Apesar de ter transformado uma derrota numa pequena vitória — por ter evitado a perda do estatuto de maior partido da esquerda espanhola —, Sánchez não tem um partido pacificado. A ideia de que o PSOE deve evitar aparecer como um partido responsável pela continuação da indefinição política em Espanha é contrariada pela linha defendida pela direcção de que é proibitivo viabilizar um Governo de Rajoy.

A presidente da Andaluzia, Susana Díaz, foi das primeiras a marcar a diferença em relação ao líder nacional do partido. “Deram-nos menos cinco lugares do que em Dezembro. Não há dúvida nenhuma, mandaram-nos para a oposição”, disse Díaz numa entrevista à rádio Cadena SER.

Pelo mesmo diapasão alinha o presidente da Extremadura, Guillermo Fernández-Vara, que recordou que o PSOE obteve “um dos piores resultados da sua história”. “Nada me apetece menos do que ajudar quem tanto dano causou a este país, mas acredito que pior seria não ter Governo”, afirmou o dirigente socialista.

Apesar de ser um partido mais pequeno e de contar com menos vozes discordantes do que no PSOE, também no Cidadãos há indícios de um debate interno sobre a estratégia a seguir. “O PP tirou mais de 50 deputados ao segundo partido, 66 ao terceiro e mais de cem a nós”, sublinhou o eurodeputado Javier Nart, em declarações ao El País. “O resultado é o que é e a política faz-se com realidades, não com desejos”, acrescentou o também membro da direcção.

A sessão de investidura, que pode chegar no final de Julho, após as consultas do rei junto dos partidos, será seguida de calculadora na mão e cada deputado conta, literalmente. Um dos arranjos possíveis pode fazer depender a formação do Governo da abstenção de um único parlamentar.

Este cenário seria possível caso o PP assegurasse o apoio do Cidadãos e de outras formações nacionalistas, como o Partido Nacionalista Basco e a Coligação Canária. Seriam alcançados 175 deputados, um a menos da maioria absoluta necessária para a investidura. A chave passaria a estar na mão de Pedro Quevedo, eleito pelo Nueva Canarias em coligação com os socialistas, cuja abstenção daria um novo Governo a Espanha. Para já, Quevedo não revela o que pretende fazer.

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