Jogo perdido

Não se sai daquela modorra “indie”, que é mais “indie” pelos temas e pelos lugares do que por qualquer gesto de rasgo ao nível dos propósitos.

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Não é que não haja virtudes neste A Febre do Mississippi, da recuperação do tema do jogo como facto e metáfora à ambientação, quase folk, no sul dos Estados Unidos, do Missouri à Louisiana, passando por escolhas certeiras no elenco (o modo batido da personagem de Ben Mendelsohn, ou a invulgar participação como actor do tão desaparecido James Toback). Mas cedo esta história de dois “gamblers” de sortes distintas (Mendelsohn e Ryan Reynolds), que se vai desenvolvendo como “road movie” e filme de “par” sem verdadeiramente ser uma coisa ou outra, deixa entender que à dupla de realizadores falta nervo e concisão: o filme dispersa-se e arrasta-se, perde-se em derivas (a história com as duas prostitutas), como se não tivesse um centro definido ou tivesse mas sentisse a necessidade de lhe ir enchendo as margens, inutilmente.

Demasiadas cenas, quase todas a bem dizer, resolvem-se em diálogos e em campos-contracampos banais, e há uma peculiar falta de integração do ambiente regional específico, que parece nunca viver com força própria, apesar de, por exemplo na escolha musical da banda sonora, haver sinais de que Boden e Fleck quiseram embeber a acção no seu regionalismo. Não se sai daquela modorra “indie”, que é mais “indie” pelos temas e pelos lugares do que por qualquer gesto de rasgo ao nível dos propósitos ou, utilizemos a expressão, da “mise en scène”. Fica mais uma vaga reflexão sobre os estranhos caminhos do “sucesso” e do “fracasso”, um estudo macambúzio sobre a disposição psicológica para uma coisa e para a outra, mas nada que não tenha já sido feito muito melhor, com mais argúcia, mais ironia, mais severidade, e mais cinema. 

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