Cavaco Silva elogia economia portuguesa e aposta em “agenda do mar”

No primeiro dia da visita à Noruega, o Presidente português propôs uma “parceria estratégica” na investigação sobre os oceanos, na biotecnologia e nas fontes de energia marítimas.

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Enric Vives-Rubio

Os fãs da série dinamarquesa Borgen notarão a semelhança. A sala onde decorre a conferência de imprensa tem um fundo azul, atrás dos púlpitos. A escala é pequena e a pompa discreta. As cadeiras estão alinhadas, para os jornalistas, em frente de um painel onde está escrito “staatsminister”. O equivalente a “primeira-ministra”, o papel desempenhado nesta realidade por Erna Solberg. As semelhanças acabam aqui. A governante norueguesa tem 54 anos, está casada e lidera o Partido Conservador, enquanto a personagem de ficção Birgitte Nyborg é mais nova, divorciada e movimenta-se no centro político.

Cavaco Silva deixou clara a sua agenda, nesta visita de quatro dias à Noruega, propondo uma “parceria estratégica” para beneficiar os dois países e “promover o crescimento económico e o emprego”.

Contudo, a relação económica entre os dois países parece ser, à data, desanimadora. Para o Presidente português, “É possível fazer muito mais, e muito melhor”, embora “as relações económicas tenham aumentado significativamente nos anos mais recentes”. Solberg retirou pressão: “A tarefa dos Governos é juntar as pessoas, criar o ambiente, não decidir os investimentos”.

A primeira visita oficial de Cavaco Silva à Noruega aconteceu há quase 35 anos. Era, então, ministro das Finanças e do Plano do Governo liderado por Sá Carneiro. Os dois países viviam, há já vários séculos, de uma relação comercial muito concreta: o bacalhau. O problema, em 1980, era a imposição, pelo Governo português, de limites à importação daquele peixe. Em Ålesund, Cavaco lembra-se de ter ouvido uma frase, que agora repete: “Os cidadãos não toleram nenhum Governo que não autorize a importação de bacalhau.”

Hoje, o bacalhau pode ser apenas uma linha, de passagem, nos discursos. Uma graça, quase. Foi assim no primeiro acto oficial desta visita, em Oslo, esta segunda-feira. No Conselho para a Investigação Científica da Noruega, um edifício novo, inaugurado há menos de um ano, o Presidente da República defendeu que “a Noruega e Portugal podem desempenhar um papel de liderança na Europa” no “domínio das ciências do mar”.

E exemplificou. Na energia, “incluindo a energia offshore”, pode e deve haver “cooperação” entre os dois países, uma vez que Portugal se prepara para “iniciar um processo de prospecção de combustíveis fósseis” em áreas costeiras. A Noruega, recorde-se, é um dos maiores exportadores de hidrocarbonetos e com as suas receitas alimenta o maior fundo soberano do Mundo.

Cavaco Silva deu como exemplos de cooperação “os parques eólicos flutuantes” e as “unidades de produção de macroalgas para biocombustíveis”. De facto, a investigação científica portuguesa e a biotecnologia marinha são os cartões de visita desta visita.

Por isso, o Presidente confidenciava aos jornalistas, durante a viagem, que os preparativos se iniciaram “há nove meses”: “Nunca viajei com uma delegação tão importante de cientistas e empresários. Esta é talvez uma das viagens mais importantes que faço.”

A marcá-la fica o memorando de entendimento assinado entre os responsáveis científicos dos dois países, Hárvid Hallén e Arménia Carrondo, da FCT, sobre “cooperação científica e tecnológica relativa aos oceanos”. 

“A Noruega tem amplos recursos piscívoras e nós temos uma grande variedade de recursos marinhos com uma biodiversidade inigualável na Europa”, garantiu Cavaco Silva. “Unindo esforços”, conclui o Presidente português, “Portugal e Noruega conseguirão alcançar muito mais do que se trabalharem separadamente”.

Já sem a solenidade dos discursos oficiais, o palco foi entregue aos cientistas dos dois países, que já têm uma experiência conjunta em mais de 900 projectos de investigação. 

Durante o dia, além do encontro com Solberg, e de um jantar em sua honra oferecido pela primeira-ministra, Cavaco Silva foi também recebido pelo Rei Harald V e inaugurou uma exposição do arquitecto português Siza Vieira.

Durante o brinde, ao jantar, Cavaco voltou a elogiar o desempenho da economia portuguesa, “que se apresenta hoje mais competitiva, sustentável e integrada”. “Portugal corrigiu os desequilíbrios macroeconómicos (…) e a economia iniciou uma trajectória de crescimento e de criação de emprego”, afirmou. 

Esta terça-feira, a comitiva presidencial viaja para Bergen, facto realçado pela primeira-ministra Erna Solberg: “É o meu círculo eleitoral…”

Situação no Mediterrâneo "é uma ameaça séria para a Europa”
No encontro que mantiveram na tarde de segunda-feira, em Oslo, Cavaco Silva e a primeira-ministra norueguesa Erna Solberg discutiram a relação da Europa com o Mediterrâneo. Na conferência de imprensa conjunta, na residência oficial da primeira-ministra, o Presidente português considerou que a situação "é uma ameaça”, enquanto Solberg preferiu qualificá-la como uma “tragédia”.

Cavaco Silva frisou que a “ameaça para a Europa” decorre da instabilidade da “situação na Líbia, no Iraque e na Síria” e realçou o empenho militar português nas forças de paz em zonas como o Kosovo, o Iraque, o Afeganistão, o Mali e a República Centro Africana.

Para o Presidente português, é necessário “impedir os imigrantes ilegais de embarcar nos portos líbios”, uma missão que deve conjugar os esforços da União Europeia e da NATO. A primeira-ministra da Noruega declarou que é preciso atacar “as causas de base”, nomeadamente o sentimento de “falta de futuro” em alguns países de África, a “instabilidade” e o “terrorismo”.

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