Economia é a nova arena da campanha eleitoral britânica

Uma centena de empresários juntou-se para criticar programa económico trabalhista e elogiar Governo conservador.

Ed Miliband apresentou proposta sobre contratos de "zero horas" numa fábrica em Huddersfield
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Ed Miliband apresentou proposta sobre contratos de "zero horas" numa fábrica em Huddersfield Phil Noble / Reuters
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Indicadores económicos dão a David Cameron e George Osborne motivos para sorrir Leon Neal / Reuters

Mais de cem empresários britânicos assinaram uma carta conjunta publicada no jornal Daily Telegraph em que criticam o programa económico do Partido Trabalhista e elogiam o trabalho do Governo conservador em funções.

O apoio da elite económica e financeira aos tories não é propriamente uma novidade, mas a forma como foi demonstrado – uma carta publicada em toda a primeira página de um jornal próximo da direita, apenas dois dias depois do início da campanha – evidencia a dureza que irá dominar a vida política britânica até às eleições de 7 de Maio. Nunca o desfecho de umas eleições no Reino Unido foi tão incerto – nenhum dos principais partidos deverá conseguir uma maioria parlamentar e as sondagens apontam para um cenário de coligações pouco comum no sistema político britânico.

Na carta, assinada por 103 dirigentes de grupos como a BP, a Bloomberg ou a Primark, os empresários elogiam o executivo de coligação liderado por David Cameron, que consideram “ter sido bom para os negócios e ter seguido políticas que apoiaram o investimento e a criação de emprego”. “Achamos que uma mudança de rumo irá ameaçar o emprego e obstruir o investimento”, concluem.

O ministro do Tesouro, George Osborne, sublinhou que a mensagem dos empresários “não podia ser mais clara” e definiu a carta como uma intervenção “sem precedentes em qualquer das eleições gerais recentes”. Porém, em 2010 um grupo de personalidades do mundo empresarial publicou uma carta no mesmo jornal a apoiar os tories que se oponham à promessa trabalhista de aumentar as contribuições para a segurança social, lembra a BBC.

Para o Partido Trabalhista, a carta “não é nada de novo”. “Ninguém irá ficar surpreendido por alguns empresários estarem a defender impostos baixos para as grandes empresas”, disse o "ministro-sombra” da Economia, Chuka Umunna, que acusou os tories de terem “encomendado” a publicação da carta.

A campanha parece jogar-se no campo económico, contrariando as expectativas de alguns analistas que apontavam para a imigração (por via do sucesso do Partido da Independência do Reino Unido, UKIP na sigla inglesa) e a continuidade do Reino Unido na União Europeia, fruto da promessa de um referendo em 2017 feita por Cameron, como os dois grandes assuntos que iriam dominar as eleições. A carta dos empresários, que a assinaram a título pessoal, aparece dois dias depois da apresentação do programa económico dos trabalhistas, que se comprometem a reverter a promessa dos conservadores de reduzir em 1% o imposto sobre as empresas.

As últimas estatísticas mostram uma economia britânica em pleno processo de recuperação, dando a Cameron e a Osborne motivos para sorrir. A economia cresceu cerca de 2,8% em 2014, acima dos 2,6% esperados, revelou o Gabinete Nacional de Estatísticas, fazendo do Reino Unido a economia com o crescimento mais acelerado entre os países mais industrializados. “Esperava-se que a Grã-Bretanha crescesse mais rapidamente do que os outros países do G7 [grupo das sete maiores economias do mundo]; agora, parece que a Grã-Bretanha vai a acelerar na frente”, escreve a Economist.

A resposta dos trabalhistas tem sido apostar no eurocepticismo crescente dos conservadores – que vêem sectores do seu eleitorado, e até do partido, cada vez mais atraídos pelo programa do UKIP. Na segunda-feira, o partido publicou um anúncio de página inteira no Financial Times no qual apresentava citações de empresários acerca da importância da União Europeia para os seus negócios. As personalidades citadas tentaram afastar-se do anúncio dos trabalhistas e alguns criticaram a utilização de palavras suas para fins políticos.

A estratégia passa agora pela aproximação às classes trabalhadoras, também elas cada vez mais seduzidas pelo populismo do UKIP e, na Escócia, pelas posições do Partido Nacional Escocês. Nesta quarta-feira, numa visita a uma fábrica em Huddersfield (Norte), Ed Miliband prometeu que uma das suas primeiras medidas será a obrigação de que os trabalhadores com contratos de “zero horas” – semelhantes aos recibos verdes – tenham direito a um contrato de trabalho ao fim de 12 semanas.

Mais tarde, o Labour deu continuidade à troca de correio entre os dois partidos – uma carta assinada por cem pessoas, entre "arrumadores de prateleiras, bombeiros e trabalhadores agrícolas reformados", publicada no Daily Mirror, como revelou o editor Jason Beattie.

Mas o contra-ataque trabalhista passa também pela acusação de que a recuperação económica defendida pelos conservadores só foi sentida "pela City [designação dada ao centro financeiro] londrina" e de que Cameron está desfasado das preocupações dos britânicos comuns.

Talvez para tentar combater esta percepção, o primeiro-ministro aceitou conceder uma entrevista à revista de entretenimento Heat, num tom bastante mais leve do que o habitual. Durante a conversa, Cameron acabou por protagonizar um dos momentos mais bizarros da campanha, quando afirmou ser "primo em 13.º grau" da celebridade Kim Kardashian.

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