Passos “convencido” de que pagar era “opção”, críticos de que teve “tratamento privilegiado”

Primeiro-ministro disponibilizou-se para esclarecimentos adicionais. Partidos à esquerda e sindicatos reagiram com fortes acusações.

O primeiro-ministro recorreu esta segunda-feira a uma nova linha de justificação para o seu incumprimento, entre 1999 e 2004, nas contribuições para a Segurança Social que, em vez de aplacar, provocou ainda mais polémica. À margem da visita ao Salão Internacional do Sector Alimentar e Bebidas), Passos Coelho declarou que, na altura em que acumulou a dívida em questão – que pagou depois de questionado pelo PÚBLICO sobre o assunto –, estava convencido de que o desconto para a Segurança Social era opcional.

“Eu não tinha consciência que essa obrigação era devida durante esse período, evidentemente que poderia ter tido conhecimento disso por outra via e poderia até ter sido notificado pela Segurança Social na altura dessa situação, mas não fui. Não existe, portanto, da minha parte nenhuma intenção de não cumprir com essas obrigações. Estava convencido que elas eram, nessa época, de opção e que, portanto, eu não tinha esses anos de carreira contributiva.”

Passos Coelho aproveitou ainda a presença dos jornalistas para explicar porque é que, sabendo da dívida desde 2012, não a havia regularizado até agora. “Para acabar de vez com qualquer dúvida” sobre a sua situação contributiva, acrescentou que, quando afirmou que só tencionava pagar a dívida à Segurança Social quando deixasse de ser primeiro-ministro, pretendia com isso significar que pretendia saldá-la numa altura em que já não houvesse margem para suspeitas de que estaria a “usufruir de algum benefício particular”.

Foi isso mesmo que levou o ministro da Defesa, José Pedro Aguiar-Branco, a apresentar a intervenção de Passos Coelho como “um exemplo” de clarificação. Para o ministro da Defesa, a disponibilidade do seu chefe de Governo para tudo explicar foi um “exemplo” da “linguagem de verdade” que se exige a um político.

Houve, na realidade, quem ficasse satisfeito com as justificações de Passos. Segundo o porta-voz do PSD, Marco António Costa, os sociais-democratas sentiram-se “confortáveis e solidários” com o primeiro-ministro.

Mas ouviram-se também críticas, e a expressão de dúvidas. O bastonário da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, Domingues Azevedo, classificou as declarações de Passos como “um desastre” político, observando que em 2004 o sistema da Segurança Social já estava “oleado”, a funcionar muito bem, e “toda a gente sabia da obrigação” de descontar.

A CGTP foi ao ponto de falar em “mentira grosseira”. Lembrando os “procedimentos de cobrança coerciva” que visaram contribuintes com dívidas de valor “bem menos significativo”, a central sindical concluiu estar perante um caso de “tratamento privilegiado”.

Catarina Martins, do Bloco de Esquerda, chegou a chamar “caloteiro” ao chefe do Governo. “O primeiro-ministro ganhava 7000 euros por mês e fugiu a uma contribuição de cem euros. Foi caloteiro para com a Segurança Social. É o mesmo primeiro-ministro que tem perseguido os falsos recibos verdes e chamado piegas a quem, recebendo 500 euros, não é capaz de pagar obrigações muito mais altas.”

Para o PS, o esclarecimento de Passos “só não foi patético, por ser grave”. Através da deputada Sónia Fertuzinhos, o PS exigiu esta segunda-feira mais explicações sobre “o contexto” em que o primeiro-ministro “não pagou à Segurança Social”.

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