Morreu o arquitecto austríaco Hans Hollein, protagonista do pós-modernismo

Prémio Pritzker em 1985 e director da Bienal de Arquitectura de Veneza em 1996. É uma referência do pós-modernismo.

Hollein, fotografado em 2002 na inauguração do parque temático dedicado aos vulcões, Vulcania, que ele próprio desenhou
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Hollein, fotografado em 2002 na inauguração do parque temático dedicado aos vulcões, Vulcania, que ele próprio desenhou JEAN-PHILIPPE KSIAZEK/afp
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Joalharia Schullin (1974) DR
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Loja de Velas Retti (1965) DR
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Loja de Velas Retti DR
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Museu do Vidro e da Cerâmica, em Teerão (1978) DR
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Agência de Viagens da Áustria, Viena (1978) DR
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Museu Abteiberg Moenchengladbach, Moenchengladbach, Alemanha (1982) DR

O arquitecto austríaco Hans Hollein, vencedor do Prémio Pritzker em 1985, o mais conceituado galardão da arquitectura, morreu esta quinta-feira aos 80 anos em sua casa, em Viena, vítima de doença prolongada, noticiou a Lusa.

Além de obras no seu país de origem, Hans Hollein tem trabalhos espalhados em vários países, tal como Alemanha, Espanha, França, Estados Unidos, onde desenhou a Galeria Richard Feigen de Nova Iorque, e no Irão, onde projectou o Museu de Cristal de Teerão. Foi director da Bienal de Arquitectura de Veneza em 1996.

Para além do Pritzker, Hans Hollein foi agraciado com vários prémios, entre eles o Grande Prémio Estatal da Áustria e a Ordem Nacional da Legião de Honra de França, sendo considerado o arquitecto mais conceituado da Áustria e um nome relevante da segunda metade do século XX.

Em 1985, o júri do Pritzker destacou-o como "um mestre da sua profissão — um que com um gosto eclético vai buscar tanto às tradições do Novo Mundo tão prontamente como às do Velho": "No desenho de museus, escolas, lojas e habitação pública mistura formas arrojadas e cores com um refinamento de requinte nos pormenores e sempre sem medo de juntar os mais ricos mármores antigos e os mais recentes plásticos."

De entre as várias obras exemplificadoras dessa marca pessoal, Jorge Figueira, crítico de arquitectura, diz que “a mais marcante” é a Loja de Velas Retti, de Viena, de 1965: “Capta um momento onde arquitectura pode fantasiar com materiais ricos e pobres; perde a lógica de um estrito funcionalismo e ganha uma componente ficcional. A isso se chamará anos mais tarde pós-modernismo. É marcante ainda hoje o high tech livre da fachada, um carácter abertamente cenográfico.”

Figueira destaca ainda “o mármore fracturado da Joalharia Schullin” como “uma típica ruína pós-moderna”:  “O carácter lúdico e fantasioso na utilização das formas e dos materiais marcou um tempo, hoje algo distante; ou se calhar demasiado presente na arquitectura empresarial que constrói as novas cidades.”

Ainda na altura do Pritzker, o júri saudava também Hollein como artista plástico e como "um professor soberbo, que insta os jovens com o seu exemplo de assumir grandes riscos, mas, ao mesmo tempo, garantir que é não o desenhador, mas a coisa desenhada a permanecer". "Incansavelmente", dizia esse júri, "ele continua a praticar o que proclamou em nome dos seus colegas arquitectos há um quarto de século, no princípio da sua distinguida carreira: 'Devolvemos ao homem a alegria de construir'."

Eram outros tempos. Por então entrava-se na década de 1960. Depois da Academia de Artes Plásticas de Vienna, em 1956, Hollein rumara aos Estados Unidos com uma bolsa de estudo para continuar a sua formação no Instituto de Tecnologia de Illinois e na Universidade da Califórnia. Nesse período, conheceu e estudou com alguns dos nomes que mais admirava: Mies van der Rohe, Frank Lloyd Wright e Richard Neutra. A frase “devolvemos ao homem a alegria de construir” surgia na parte escrita de sua defesa do grau de mestre em arquitectura. Intitulada “Espaço plástico”, defendeu-a em 1960. Nela questionou, por exemplo, conceitos de décadas anteriores como a arquitectura ser “um abrigo”: “Um velho lugar-comum”, escreveu Hollein. “Claro que podemos usar a arquitectura como abrigo. Também usamos uma árvore ou uma caverna como abrigo”, mas, Hollein defendia antes a arquitectura como sendo “inútil”, elevando-a ao estatuto de obra de arte.

Outro lugar-comum: a ideia de que construímos para seres humanos – “Grande descoberta, obrigada. Claro que construímos para seres humanos, não construímos para bichos. A arquitectura é a criação de espaço para seres humanos por seres humanos.” E era então que Hollein defendia um dos princípios centrais da sua tese: “Não há diferença entre interior e exterior. Há apenas espaço. O espaço não tem direcção. Desenvolve-se livremente, em todas as direcções.”    

De regresso à Europa, em 1964 Hollein inaugura o seu próprio atelier, em Viena. A sua primeira encomenda, no ano seguinte, foi, precisamente, a Loja de Velas Retti destacada por Jorge Figueira, que a revista Architectural Forum descreveu à época como sendo “ainda mais pequena do que a maioria das primeiras encomendas: uma loja e showroom com 3,6 metros de largura para um fabricante de velas”, localizado, porém, “numa rua da moda”.  

A obra deu-lhe atenção internacional e um prémio: o Reynolds Memorial Award, pela primeira vez em dez anos entregue a uma obra de valor inferior ao atribuído pelo galardão: 25 mil dólares (pouco mais de 18 mil euros). E pouco depois já Hollein ganhava novos créditos internacionais – pela sua primeira encomenda em Nova Iorque, a galeria de arte Richard Feigen. O número de Fevereiro de 1970 da Progressive Architecture incluía um artigo sobre essa obra intitulado "Fabergé arquitectónico" explicando que Hollein combinava "o sentido de espaço de um arquitecto com a habilidade de um joalheiro para produzir um ambiente requintado para a arte”.

Hollein, dizia o artigo, era "um dos poucos arquitectos contemporâneos com a destreza, a perspicácia e o apoio financeiro para recriar o luxo íntimo dos espaços privados de Versalhes”. A Retti Shop era já dada como uma “obra-prima”.

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