Tunísia mergulhada na incerteza política

Fracassaram negociações entre o Ennahda e a oposição secular para escolher novo primeiro-ministro. Presidente prolonga por oito meses o estado de emergência.

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Rached Ghannouch, líder dos islamistas do Ennahda FETHI BELAID/AFP

Não há um fim à vista para a crise política que há meses paralisa a Tunísia. As negociações para escolher um novo primeiro-ministro terminarem sem que os islamistas e oposição chegassem a acordo e, perante a crescente instabilidade e violência, o Presidente decidiu prolongar por mais oito meses o estado de emergência no país.

O fracasso das negociações – em que estavam concentradas as esperanças para a resolução do impasse – foi anunciado segunda-feira à noite, dois dias depois do prazo estipulado para um acordo, e os mediadores não escondiam o seu desagrado. “Se os partidos não chegarem a um consenso, vamos assumir a nossa responsabilidade e apresentar nomes que consideramos capazes”, avisou Houcine Abassi, secretário-geral da UGTT, a grande central sindical tunisina que, juntamente com os patrões, a Liga dos Direitos Humanos e a Ordem dos Advogados, organizou os contactos entre a coligação liderada pelos islamistas do Ennahda e a Frente de Salvação Nacional, que agrega os principais partidos e movimentos seculares.  

A imprensa desta terça-feira atacou com dureza “o domínio dos interesses partidários sobre o interesse nacional” (jornal Assabah) e os “cálculos mesquinhos” que “põem em risco o futuro do país”.

Mas de pouco valeram os avisos e as críticas. O Ennahda acusou a oposição de boicotar o único candidato que considerava aceitável: Ahmed Mestiri, antigo ministro e depois opositor de Habib Bourguiba, o pai da independência tunisina. Mas a Frente de Salvação diz que, aos 88 anos, Mestiri é já demasiado velho e frágil para liderar um executivo que terá a difícil missão de conduzir o país até às eleições, e acusou os islamistas de vetarem todas as alternativas que sugeriu.

O processo de transição política na Tunísia está em suspenso desde o assassínio, a 25 de Julho, do deputado Mohamed Brahmi, o segundo dirigente da oposição morto desde o início do ano. As duas mortes foram atribuídas a grupos jihadistas que, segundo a oposição, agem com crescente impunidade no país face à impotência (ou mesmo conivência) do Ennahda, que acusam de querer islamizar o país. Após meses de protestos, os islamistas aceitaram dar lugar a um governo tecnocrata ao qual caberia negociar a aprovação de uma lei eleitoral e de uma nova Constituição – instrumentos essenciais ao sucesso da transição democrática no país que inaugurou a Primavera Árabe.

O fracasso das negociações é agravado pelo recente surto de violência jihadista. Em Outubro, nove polícias foram mortos em acções contra grupos armados e, pela primeira vez desde a revolução de 2011, duas estâncias turísticas foram alvo de atentados, ainda que sem provocar vítimas. Domingo, o Presidente, Moncef Marzouki, anunciou que o estado de emergência no país vai vigorar pelo menos até Junho do próximo ano. O prolongamento por oito meses é visto como um sinal da gravidade com que as autoridades encaram a violência – desde a revolução a medida de excepção foi sempre prorrogada por períodos de três meses.
 
 

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