Campanha mundial convida portugueses a envolverem-se no corte de emissões de CO2

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Líderes da campanha querem todo o país a reduzir dez por cento Foto: Nuno Ferreira Santos

Um papel afixado na parede da cozinha, com uma espécie de checklist, é o barómetro da casa. Nele estão inscritos os valores exactos que o contador de electricidade tem de mostrar. Noutra linha, marcas assinalam o número de voos de avião feitos no ano passado e, em baixo, os de 2010. O objectivo da comparação é um só: verificar se, passados 12 meses, neste e noutros indicadores houve uma diminuição de dez por cento.

Este é o mote da campanha 10:10, lançada inicialmente no Reino Unido e que chegou a Portugal descontraidamente pela mão de cinco amigos - três médicos, uma arquitecta e um engenheiro informático - sem qualquer ligação ao meio ambientalista. Quem adere à iniciativa - cidadãos, empresas, outras entidades - promete fazer tudo para reduzir em dez por cento, num ano, a sua "pegada carbónica", isto é, as emissões de CO2 associadas ao seu comportamento ou actividade.

João Barreto, de 31 anos, soube da campanha em Fevereiro passado e resolveu tentar cumprir a checklist sugerida pela iniciativa britânica. A ele juntaram-se Ivo Pires, de 31 anos, Cristina Santos, de 25, Rosário Cano, de 27, e Joana Ribeiro, de 30. Criaram um blogue simples, com a modesta ambição de cooptar mais alguns amigos.

Não fizeram publicidade, nem alarido. E assim mesmo, em pouco tempo tinham já 60 inscrições. A adesão continuou a subir, deixando os cinco amigos de certa forma inquietos com a ideia de estarem a piratear a campanha britânica. "Chegou a tal di- mensão que resolvemos falar com os ingleses. Desafiaram-nos a ser os coordenadores da campanha em Portugal", conta Ivo Pires.

A inspiração britânica

Até agora, aderiram à campanha cerca de 700 pessoas, duas dezenas de empresas, dez escolas. Ainda é pouco, se comparado com outros movimentos cívicos espontâneos na área do ambiente, como o Limpar Portugal, que em Março passado mobilizou 100 mil pessoas e centenas de instituições para eliminar depósitos ilegais de lixo em todo o país.

O sucesso em Portugal, até agora, também é muito menor do que no Reino Unido, onde a campanha nasceu. "Em duas semanas, tínhamos já 22 mil pessoas", conta Daniel Vockins, coordenador do 10:10 britânico. Hoje já há cerca de 100 mil participantes individuais, mais seis mil colectivos, incluindo o próprio Governo britânico.

O principal atributo da campanha está na sua simplicidade. Deixar de fazer algo com elevada pegada carbónica uma em cada dez vezes é uma forma fácil de cruzar a fronteira do imobilismo. Nalguns casos, medidas simples até permitem superar a meta - como deixar o carro em casa uma vez por semana ou evitar um voo de avião por ano.

Mesmo na electricidade, um pouco de atençao basta. "A box da televisão por cabo, se não for nunca desligada, pode representar dez por cento do consumo de electricidade de uma ca- sa", alerta Rita Antunes, coordenadora do projecto Ecofamílias, da associação Quercus, que está a ajudar mil habitações a reduzirem a sua factura eléctrica.

O compromisso do 10:10 é individual e, para os seus organizadores, o registo centralizado do sucesso de cada um não é uma prioridade. "O 10:10 é muito mais a cenoura do que o pau", confirma Daniel Vockins. Ainda assim, com base numa amostra, calcula-se que só as empresas aderentes no Reino Unido terão já evitado a emissão de 500 mil toneladas de dióxido de carbono.

Em Portugal, a campanha está a ganhar ritmo. No festival de danças populares Andanças, no princípio de Agosto, em São Pedro do Sul, cerca de 200 pessoas a subscreveram, mais a câmara municipal e a junta de freguesia local. Outras entidades colectivas estão a aderir com facilidade, incluindo clubes de futebol, como o Benfica. "Quando os contactámos, disseram logo que queriam", afirma João Barreto.

A ajuda da Internet

Os organizadores esperam um impulso maior a partir do dia 10 de Ou- tubro, quando está prevista uma mobilização mundial, com iniciativas nos 128 países onde a campanha já está em curso. Em Portugal, haverá um evento no Parque Eduardo VII, em Lisboa. Em suas casas, os cinco amigos que lançaram a iniciativa por cá estão a dar o seu melhor. Não partiram do zero. "Já fazíamos reciclagem, comprávamos lâmpadas economizadoras", diz Cristina Santos. "O que eu não tinha era uma abordagem sistematizada sobre isso", explica Ivo Pires. "Nunca tinha olhado para a conta da electricidade e do gás", completa João Barreto.

Agora, andam mais de transportes, vigiam o consumo dos aparelhos electrónicos, cortam nas viagens de avião. Recentemente, João Barreto teve de ir ao estrangeiro em trabalho, mas só fez um percurso via aérea. "Marquei férias na mesma altura e voltei de comboio", diz.

O efeito viral da Internet promete alargar a campanha no país. "Se parássemos de trabalhar, isto continuaria. Ganhou pernas próprias", afirma Cristina Santos. A ambição inicial era mais modesta. Agora não. "É ter Portugal inteiro a reduzir dez por cento", diz Rosário Cano. Assim seja.

Checklist anti-CO2

1. Viagens - Corte nas viagens de avião, prefira o comboio.

2. Electricidade - Use lâmpadas de baixo consumo. Não deixe equipamentos em stand-by.

3. Climatização - Reduza a temperatura do sistema de aquecimento; aumente a do ar condicionado.

4. Carro - Deixe o carro em casa mais vezes. Conduza devagar.

5. Alimentação - Coma menos carne. Compre produtos locais.

6. Consumo - Consuma menos. Prefira produtos mais duráveis. Compre ou venda em 2.ª mão.

7. Lixo - Evite a produção do lixo, compre menos embalagens. Recicle tudo.

8. Água - Tome duches mais curtos. Instale redutores de caudal nas torneiras. Lave louça e roupa só com a máquina cheia.

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