Como reduzir o défice externo em Portugal?

Marc Melitz (Universidade de Princeton) foi em 2009 considerado pela revista The Economist como um dos mais promissores economistas da sua geração.

Esta distinção deve-se ao facto de Melitz ter trazido para o centro da pesquisa económica a influência da produtividade das empresas no comércio internacional. Nessa linha de pensamento, publicámos recentemente um artigo em que demonstrámos que a maior produtividade das empresas exportadoras em relação às não exportadoras resulta do maior investimento em I&D (investigação e desenvolvimento) das primeiras. A ligação entre competitividade e exportações é, por isso, central para o debate em torno do défice externo português. De facto, a melhor maneira de resolver de forma sustentável este problema é através de uma melhoria da competitividade das exportações nacionais. Isto, no entanto, só será possível se as empresas portuguesas apostarem mais em I&D.

Apesar de, nos últimos anos, Portugal ter assistido a progressos significativos nesta área (de 2004 a 2007, o investimento em I&D aumentou de 0,77 por cento para 1,51 por cento do PIB), tal não é ainda suficiente. Na verdade, o investimento em I&D em Portugal ainda se encontra abaixo do da OCDE, que é de 2,28 por cento do PIB. Para além disso, enquanto em Portugal a maior parte do investimento em I&D provém de subsídios estatais (59,8 por cento do total), na OCDE acontece o contrário (28,1 por cento do total). Isto é uma desvantagem, uma vez que a evidência empírica mostra que os subsídios à I&D não são eficazes no aumento da produtividade das empresas. Primeiro, os subsídios tendem a substituir - em vez de complementar - os fundos próprios das empresas. Segundo, dada a incerteza associada à continuidade no futuro dos subsídios, estes não são utilizados pelas empresas como parte de uma estratégia de longo prazo de aumento da competitividade.

Revela-se como tal imperativo conhecer a realidade das empresas portuguesas em termos de I&D, principalmente porque pouco se sabe nesta matéria. Infelizmente, Portugal perdeu recentemente uma oportunidade neste sentido ao abster-se de participar num estudo organizado por dois think-tanks europeus (Brugel e CEPR) sobre a produtividade e comportamento exportador das empresas europeias.

No entanto, basta observar que o sector com um maior crescimento nas exportações em Portugal tem sido o farmacêutico, onde a I&D é central. Contudo, continuam a existir muitas resistências por parte dos agentes económicos nacionais a uma reorientação para sectores intensivos em I&D. Por um lado, os empresários portugueses não têm uma cultura de I&D, uma vez que, no passado, se habituaram a ajudas à competitividade, como subsídios, salários baixos e desvalorizações competitivas. Por outro lado, a economia portuguesa sofre de falhas de mercado graves, como o clientelismo político e a evasão fiscal, que distorcem a concorrência e relegam a competitividade para um plano secundário.

Na realidade, estas falhas de mercado têm um efeito semelhante ao do peso excessivo do Estado na economia ao provocarem um crowd-out do investimento mais produtivo. Cabe, pois, ao Estado eliminar estas falhas de mercado, de forma a demover os obstáculos ao investimento em I&D. Só deste modo será possível aumentar as exportações e assim diminuir o défice externo português.

Armando Pires*

* investigador e professor na Norwegian School of Economics and Business Administration (NHH), em BergenVer mais em http://e.conomia.info
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